Como gestores de fundos multimercados esperam ganhar dinheiro em 2023

Grandes nomes do mercado brasileiro veem juros perto do limite e economia estagnada

Se em 2022 os gestores de fundos multimercados ganharam com algumas tendências claras, como a alta de inflação e dos juros globalmente, 2023 tende a ser um ano mais complicado para se montar as teses que podem prosperar, segundo André Jakurski, sócio-fundador da JGP. Em evento do Safra Invest, ele comentou que no ano passado a gestão capturou melhores retornos com as posições internacionais do que em Brasil. “Acho que na frente tem uma recessão e vamos adotar estratégias nessa direção. Alguns ruídos no mercado internacional vêm afetando não só os emergentes, mas também os países da Ásia”, comentou. “Temos na cabeça uma série de indicadores que podem gerar uma desecelaração importante.”

Na Ibiuna, o ex-Banco Central Rodrigo Azevedo disse ter ganhado muito dinheiro, primeiro com a queda dos juros no meio da pandemia, e depois com o aperto quase que sincronizado de juros no ano passado. No mapa de 27 países que acompanha, ele considera que as taxas já estão perto do topo, que a assimetria mais clara agora é para baixo. “A inflação está ainda subindo um pouco, mas em 6, 12 meses à frente devemos ter posição aplicada [apostando em queda] nas taxas no Brasil e no mundo.” É justamente nos momentos de inflexão que se ganha mais dinheiro, afirmou.

Rogério Xavier, da SPX, disse ter impressão parecida, que os juros estão perto do topo, seja pelas indicações da inflação e da atividade econômica, seja pelos riscos associados à estabilidade financeira. “Está começando a pipocar uma crise bancária em alguns países centrais desenvolvidos. Isso vai gerar uma reflexão por parte dos bancos centrais e, possivelmente, vamos ver uma pausa nos juros, principalmente nos Estados Unidos, e talvez um ritmo menor de puxadas indicadas pelo Banco Central Europeu (BCE).” Ou seja, se o estresse no sistema financeiro se espalhar, os bancos centrais vão deixar de lado a inflação e privilegiar a estabilidade.

Em relação ao crescimento no Brasil, Jakurski disse ter uma visão mais pessimista, mas sempre dá para “ser criativo para ganhar dinheiro” com um viés ou outro, mas ele não vê pujança na economia. Com baixas taxas de investimento e poupança, o país está fadado a ter uma expansão medíocre. A atividade pode crescer 1,5%, 2%, empurrada pelo setor agrícola, o endividamento externo é manejável, a dívida global é alta, na casa dos 70% do PIB, mas não assusta de imediato. “O Brasil é ok, mas não é ok, tem um potencial de crescimento baixo.”

Embora na parte fiscal muita coisa possa ser feita, como a redução dos subsídios que representam mais de 3,5% do PIB, ele acha que a mudança não vá se concretizar. “Há o Simples, o lucro presumido, uma série de benesses que são distribuídas e que sofrerão uma pressão forte corporativa que impede que a economia tenha um ‘level playind field’ [um ambiente concorrencial igual para todos]”, disse Jakurski. “Os planos de [Fernando] Haddad [ministro da Economia] são ambiciosos, mas não vão se realizar.”

Um incremento de arrecadação para algo da ordem de 19% do PIB, conforme o governo almeja, só foi obtido em 2009 e 2010. Isso significa que o reforço da receita orçamentária vem pelo aumento de impostos, em cima de um custo Brasil que já é muito alto. “Não vai se alcançar as metas fiscais apregoadas. Se tirou o teto [de gastos] vai colocar no lugar algo mais leniente, vai ser um queijo suíço cheio de buracos para gastar dinheiro”, continuou Jakurski.

Azevedo, da Ibiuna, acrescentou que o governo brasileiro não parece fazer esforço para conter gastos e está contando com receitas, suportado pela ideia de que se “a economia bombar, não precisa cortar”. A reforma tributária idealizada, se aprovada pelo Congresso neste ano, vai começar a ser implementada, de forma gradual, a partir de 2025. Significa que durante quatro ou cinco anos, o país deve conviver com dois sistemas. “Mesmo que tudo dê certo, o ganho potencial é lá na frente, não estou usando isso como fator de decisão de investimento no Brasil.”

Na agenda da produtividade, seria importante a reforma tributária avançar, disse Xavier, da SPX, algo que poderia gerar um ambiente melhor por parte dos investimentos e não ficar competindo com o juro real da Nota do Tesouro Nacional série B (NTN-B). “Por que vou montar uma planta gigantesca se consigo aplicar por 30 anos com juro real a 6%, é uma vida dura para o tomador de risco.”

Azevedo chamou a atenção ainda para o tamanho da oportunidade que o Brasil está perdendo, com três dos maiores gestores do Brasil pouco investidos no país. “A reforma tributária não vai ser a bala de prata e se a estratégia de crescimento for em cima dela, vai ter que ser ajustada.”

Com a proximidade da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), no momento há grande preocupação com mandatos em conflito, o de inflação e o de mitigar impactos de desemprego e uma suposta crise de crédito, disse Azevedo. “O comitê de estabilidade financeira mostrou não ter preocupações de natureza sistêmica, o Banco Central brasileiro parece focado principalmente no objetivo inflacionário. Acho apropriado, porque este vai ser o terceiro ano em que o BC vai sequer entregar o topo da meta.”