Previ altera critérios para seleção de conselheiros e enfrenta críticas de favorecimento

A Previ, maior fundo de pensão do Brasil, modificou seus critérios para a escolha de conselheiros

Empresas citadas na reportagem:

Para a próxima temporada de assembleias de companhias abertas, em abril, a Previ, o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, conduz um processo seletivo interno de candidatos a conselheiros que devem ser indicados para as eleições das empresas participadas.

Desde o ano passado, os critérios de seleção desses candidatos vêm mudando. As alterações acenderam um alerta no mercado de que possíveis flexibilizações na qualificação dos postulantes aos colegiados possam favorecer indicações políticas, o que a Previ nega.

“De todos os candidatos que foram selecionados e indicados aos conselhos pela Previ, não tivemos nenhuma indicação política nem do governo”, disse o diretor de participações da entidade, Márcio Chiumento.

O processo seletivo de 2025 ainda não terminou, por isso os dados sobre número de inscritos e nomes dos candidatos selecionados não são públicos.

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    Previ é o maior fundo de pensão do país

    A Previ, que é o maior fundo de pensão do Brasil, com R$ 274 bilhões sob gestão, tem 33 empresas participadas — entre elas, gigantes como Vale, JBS, Gerdau e Vibra Energia.

    Na safra de assembleias deste ano, a entidade vai fazer 63 indicações, entre titulares e suplentes, a maior parte para concorrer a cadeiras em conselhos fiscais, mas também para colegiados de administração. Atualmente, a Previ tem 82 conselheiros indicados.

    Os critérios para o processo público de seleção do fundo começam na área técnica e passam por diferentes instâncias, entre elas, a diretoria-executiva e um comitê de assessoramento, até chegar ao conselho deliberativo da fundação, que faz a aprovação final. Esses parâmetros são publicados anualmente em um edital de seleção, aberto para qualquer pessoa que queira concorrer.

    O edital tem algumas etapas: a primeira é a análise curricular, que é classificatória. Daí em diante, a área técnica da Previ inicia outras etapas, que incluem análise qualitativa dos perfis, “matching” entre candidato e vaga e submissão da proposta de indicações aos colegiados competentes.

    Após a indicação da Previ, os candidatos passam pelo crivo dos comitês e colegiados das empresas participadas, conforme critérios de seus estatutos.

    ‘Processo tem evoluído’

    O ex-presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) Henrique Luz observa que o processo de seleção de conselheiros no Brasil tem evoluído para um modelo mais profissionalizado, deixando de lado a escolha baseada em proximidade com acionistas controladores. “Hoje em dia, mais ou menos 25% dos assentos dos conselhos do Brasil são preenchidos por headhunters, número que há 10 anos era de 2% ou 3%”, afirma.

    Segundo o especialista, a tendência é formar conselhos com base em competências específicas, como auditoria, riscos e compliance. No entanto, diz ele, os desafios persistem, como o impacto do voto múltiplo, “que pode levar à inclusão de candidatos desalinhados com os critérios técnicos previamente definidos”. O voto múltiplo em assembleias favorece indicações de acionistas minoritários, uma vez que desfaz a indicação por chapa feita pela empresa e permite que os acionistas concentrem votos em determinados candidatos.

    Luz acrescenta que a diversidade nos conselhos também tem sido ampliada, especialmente com a inclusão de mulheres, mas deve ser equilibrada para garantir uma verdadeira pluralidade.

    Seleção na Previ tem mudado

    De acordo com o diretor de participações da Previ, o processo de seleção de candidatos do fundo existe há mais de 20 anos e chegou a contar com assessoria de uma empresa especializada. Ele acrescenta que os editais são atualizados regularmente para acompanhar tendências do mercado.

    Desde 2023, os editais passaram a contemplar grupos sub-representados, considerando critérios como gênero, raça, pessoas com deficiência (PCD) e da comunidade LGBTQIA+. Na última seleção, 56% dos indicados da Previ faziam parte desse universo.

    “Todo ano você tem uma mudança, algumas pontuais, outras mais estruturantes, com base no que a gente vê acontecendo no mercado e na nossa própria experiência. Queremos deixar a nossa base de candidatos da forma mais diversa possível, e a diversidade não se restringe apenas à questão de gênero ou de raça, é uma diversidade de conhecimento”, disse Chiumento.

    Algumas mudanças, contudo, não foram bem recebidas. No edital de 2024, por exemplo, foi eliminado o critério de maior pontuação para formação acadêmica em áreas preferenciais, como direito, administração, economia e engenharia. Além disso, naquele ano, o edital atribuía 30 pontos na parte de experiência profissional para “membros da diretoria executiva da Previ com mandato vigente e caráter efetivo”, a maior pontuação da tabela.

    Requisitos mínimos

    A principal mudança veio no edital de 2025, quando a Previ aboliu o sistema de pontuação e adotou um sistema de requisitos mínimos em três grupos: formação acadêmica, educação continuada e experiência profissional.

    Com isso, passaram a ser obrigatórios apenas um curso de graduação completo em qualquer área, uma comprovação profissional em áreas específicas e uma certificação em áreas como governança corporativa emitidas por determinadas instituições. Neste caso, as capacitações antes pontuavam no processo, mas não eram obrigatórias.

    Outra atualização no edital de 2025 foi a inclusão de docência na comprovação profissional, para candidatos com ao menos cinco anos de atuação em uma instituição de ensino superior reconhecida pelo Ministério de Educação (MEC). Não há área preferencial e o profissional não precisa acumular outras experiências.

    ‘Falta transparência’

    Crítico do novo formato, o ex-diretor da Previ Nélio Lima avalia que o processo seletivo ficou sem objetividade e sem transparência: “Antes, você tinha uma pontuação que era maior ou menor em função das atividades profissionais exercidas ao longo tempo e conforme a própria formação. Quanto mais experiência e formação acadêmica, mais pontos. Hoje a coisa ficou muito subjetiva, sem nenhum critério transparente e objetivo”, afirma.

    A Previ argumenta que a retirada da pontuação deixou o processo “mais eficiente” para as comprovações dos candidatos e para a área que conduz a seleção. A entidade também afirma que a pontuação “nunca foi critério final” para a escolha do candidato a ser indicado, mas um “critério para o candidato estar ou não apto”, já que há outras etapas no processo.

    Na avaliação de um interlocutor que prefere não se identificar, o novo modelo de seleção afrouxa os critérios e favorece a entrada de diretores da Previ nos conselhos das empresas participadas. “Todo o processo de indicação de conselheiros na Previ de longa data foi mudado. A política atual dispensa os diretores da ativa de fazer o processo e prioriza os diretores aos conselhos das maiores companhias”, afirma.

    Da Vale ao Iguatemi

    Atualmente, os seis diretores da Previ ocupam ao menos 12 assentos em companhias nas quais o fundo tem participação, distribuídos entre Vale, Gerdau, Iguatemi, Lojas Renner, Neoenergia, Vibra, Tupy, Grupo Litel e Aeroporto de Guarulhos. As indicações referentes ao conselho de administração da Vale — como a do presidente da Previ, João Fukunaga — não constam na lista pública do fundo, porque, de acordo com a entidade, não são feitas diretamente pela Previ e seguem uma regra de governança da companhia.

    O fundo afirma que os diretores já passam por uma “avaliação rígida” para tomar posse em seus cargos na entidade. “Historicamente, se provou necessário e importante ter integrantes do corpo diretivo da Previ nos conselhos de empresas estratégicas, em função da representatividade direta e do alinhamento destes profissionais com a agenda e práticas preconizadas pela Previ. Ao participar dos conselhos das empresas, os diretores cumprem o dever fiduciário da entidade”, diz em nota.

    Em 2024, as indicações de quatro nomes com histórico em comum de atuação sindicalista — Wagner Nascimento, Márcio de Souza, Marcel Barros e Ernesto Izumi — para assentos em conselhos de empresas participadas da Previ também reacenderam críticas de “favorecimento” a um perfil específico, semelhante ao do presidente da entidade, João Fukunaga.

    A nomeação de Fukunaga passou por questionamentos em 2023 e chegou a ser impedida duas vezes na Justiça. O afastamento temporário dele se deu porque se considerou que Fukunaga não preenchia os requisitos para o cargo: ele é historiador de formação e foi presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e auditor sindical da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf). Em ambas as situações, porém, houve o entendimento de que Fukunaga acumulava as experiências exigidas para ocupar a posição.

    Questionada, a Previ diz que três dos conselheiros citados foram indicados para empresas participadas antes do processo de 2024: Wagner Nascimento, em 2021; Márcio de Souza, em 2019; e Marcel Barros, em 2012. “Portanto, seria impossível para qualquer um deles se beneficiar de uma hipotética alteração de regra realizada em 2024”.

    O fundo afirmou ainda que os quatro conselheiros “participam ou já participaram ativamente da governança da Previ”: Wagner Nascimento é diretor de seguridade da Previ desde 2020; Márcio de Souza é diretor de administração da Previ desde 2018; Marcel Barros foi diretor de seguridade de 2012 até 2020; e Ernesto Izumi foi membro do conselho deliberativo de 2020 até 2024”.

    Marcio Chiumento, diretor de participações, reforçou ao Valor que não houve uma mudança no edital para facilitar a entrada de profissionais de associações, sindicatos, suas federações e confederações: “Essa possibilidade sempre existiu, até porque como nós temos a paridade, são representantes eleitos pelos associados. Houve ali uma mudança de redação para deixar mais claro o que já era considerado ao longo dos anos”.

    15/03/2025 12:29:47

    *Com informações do Valor Econômico