Análise: Carta de Lula visa a minimizar críticas por “cheque em branco”

Documento do PT gera estresse no mercado e evidencia disputa interna; já Bolsonaro usa Guedes em "quiz’ sobre o mínimo, diz Fábio Zambeli, do JOTA

Lula sugere aumentar dívida pública com foco no social (Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação)
Lula sugere aumentar dívida pública com foco no social (Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação)

Com a campanha de Jair Bolsonaro imersa numa pesada agenda negativa há uma semana, desde que veio à tona um suposto plano econômico para desindexar o salário mínimo e as aposentadorias, Luiz Inácio Lula da Silva decidiu se arriscar às vésperas do debate final na TV Globo.

O ex-presidente, líder nas pesquisas, produziu um factoide político para se contrapor à narrativa de questionamento ao sistema eleitoral, comandada pelo adversário. A três dias do segundo turno, o petista distribuiu nova versão da “carta ao povo brasileiro”, tentando mimetizar o ambiente da vitoriosa campanha de 2002.

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Depois de resistir às pressões para antecipar e detalhar seu programa econômico, Lula assinou um documento que foi mal recebido pelo mercado, especialmente por enfatizar expressões tidas como desenvolvimentistas, como o uso dos bancos públicos para promover o crescimento, a “reindustrialização” e a construção de uma nova legislação trabalhista.

O principal, para o sistema financeiro, foi a ausência de elementos que indiquem as regras fiscais que o petista pretende adotar, caso eleito, para substituir o teto de gastos.

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Internamente, o QG lulista entende que conseguiu pautar o noticiário e criar um colchão de boa vontade com a classe média, que vinha demandando propostas mais claras para temas como a economia digital e o meio ambiente.

O texto, contudo, precipita um embate que deve se cristalizar caso Lula conquiste o terceiro mandato: o que envolve alas do PT, novos aliados e os técnicos que se aproximaram do projeto lulista muito mais para se opor a Bolsonaro do que pelas convicções ideológicas.

A redação da carta, embora totalmente avalizada por Lula, foi uma obra do coordenador do programa de governo, Aloizio Mercadante, que já está envolvido numa outra batalha interna —pela chefia da equipe que cuidaria de um eventual processo de transição.

Outros setores da campanha, preocupados em fazer cumprir o mantra de “menos PT no governo”, defendem que Mercadante seja deslocado para tarefas de menor visibilidade e advogam o nome de Geraldo Alckmin para conduzir os trabalhos, em caso de triunfo nas urnas.

“TV Guedes”

Na campanha de Bolsonaro, a estratégia adotada na reta final foi a de escalar o ministro Paulo Guedes (Economia) para gravar vídeos em que ele responde a dúvidas de eleitores sobre salário mínimo, aposentadoria e reajuste salarial para servidores, entre outros assuntos de sua seara.

O material, denominado “Guedes Responde”, foi distribuído nesta quinta-feira. É um contraponto à propaganda do PT que tenta carimbar o chefe da equipe econômica de Bolsonaro como “inimigo dos pobres”.

O presidente tem manifestado a seus assessores profunda contrariedade com o que chama de “campanha suja” do PT para apresentá-lo como responsável pela perda de direitos dos trabalhadores.

Bolsonaro ficou especialmente indignado com uma peça publicitária petista que insinua que um eventual segundo mandato representará o fim de conquistas da categoria, como o décimo terceiro salário e até o terço adicional de férias.

(Por Fábio Zambeli, analista-chefe do JOTA em São Paulo)
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