Análise: As pistas que Lula dá sobre como ficaria a economia se tiver terceiro mandato
O ex-presidente intensificou sua agenda de encontros com empresários e o mercado financeiro, diz Fabio Graner, do JOTA
Favorito nas pesquisas eleitorais para vencer o pleito de outubro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) intensificou na última semana sua agenda de interlocução com representantes do setor empresarial, inclusive do mercado financeiro. Essa agenda ainda não acabou e algumas fontes dizem que deve se intensificar, embora outros apontem que isso deve ocorrer dentro de um movimento natural de interlocução com diversos setores com a chegada da campanha.
Nas conversas recentes, segundo relatos ouvidos pelo JOTA, há um esforço de Lula para deixar claro o compromisso com a responsabilidade fiscal, ao mesmo tempo que se reforça a mensagem da diretriz do programa de governo de que o teto de gastos será revogado. Lula inclusive se mostra de certa forma ofendido com as desconfianças no campo da política fiscal.
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Mesmo assim, conforme alguns interlocutores apontam, o discurso tende a ficar mais amigável ao setor privado. A menção a um “novo regime fiscal” no documento com as diretrizes da aliança em torno do petista já foi uma sinalização que mira o mercado financeiro. A ideia é indicar que não se pretende fazer uma farra fiscal em eventual terceiro mandato, a despeito do eventual fim do teto. Aliás, curiosamente (e improvável que tenha sido por acaso), “novo regime fiscal” foi o nome oficial dado à Emenda Constitucional 95 pelo governo Michel Temer.
Além do exemplo do próprio governo do ex-presidente, petistas afirmam que a fama de irresponsabilidade fiscal é indevida. Mesmo sob Dilma, que teve alguns exageros principalmente em desonerações, mas também em gastos, interlocutores de Lula apontam que a correção de rumo em 2015 foi prejudicada pelas pautas bombas de Eduardo Cunha e do movimento pelo “golpe”.
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Fontes do entorno presidencial citam ainda que diversos governos regionais do PT também têm histórico de responsabilidade com as contas públicas e entregaram as contas melhores do que receberam, como seriam os casos de Fernando Haddad e Marta Suplicy na cidade de São Paulo. E isso, asseveram, precisaria ser levado em conta pelos analistas. Além disso, reforçam, o teto tem sido sistematicamente violado sob Bolsonaro e mesmo sob Temer.
Contudo, para além dos discursos, conversas de bastidores e do que está nas diretrizes, de fato ainda está difícil saber qual o rumo fiscal de um eventual terceiro mandato do petista.
Não há elementos claros para dizer – muito menos ser taxativo em prever – que Lula vai imprimir uma trajetória de crescimento das despesas tão intensa como ocorridas entre 2009 e 2010, em seu governo, ou 2012 e 2014, sob Dilma.
Por outro lado, certamente não parece haver qualquer flerte com a ortodoxia fiscal do período de 2003-2004 (em 2005 os gastos, já sob Palocci, começam a subir em proporção do PIB).
Entre esses dois modelos, há o período de 2006 a 2008, último ano antes dos impactos da crise do Lehmann Brothers (a pior desde a grande depressão de 1929). A despesa saiu de 16,4% do PIB em 2005, último ano cheio da “Era Palocci”, para 16,6% do PIB em 2008. Em termos de volume de pagamentos, sem considerar a relação com o PIB, o gasto subiu 27,6% acima da inflação nesse período. Ou seja, parte do aumento da despesa foi bancada com o ritmo mais forte de crescimento da economia – cujas causas não cabe discutir aqui nesse espaço hoje.
Somando discursos, bastidores, o recente documento com as diretrizes e o histórico do ex-presidente, a resultante parece apontar na direção de algo mais próximo desse modelo intermediário, no qual gastou-se mais, mas sem uma expansão exagerada em proporção do PIB e ainda com queda da dívida pública.
Mas é preciso ponderar que o contexto é muito diferente – tanto sob os aspectos econômicos, como fiscais e sociais – e dificulta demais qualquer certeza de que algo similar será praticado ou se é mesmo viável.
O que parece ser mais evidente é que gastos sociais e de investimentos devem mesmo crescer em termos reais, caso o ex-presidente triunfe em outubro. Isso significa necessariamente aumento do tamanho do Estado ao longo de seu governo? Há petistas que não só apostam nisso, como querem que ocorra, apontando que essa foi a grande falha do teto de gastos em um país com tantas carências.
Há, porém, quem no entorno da campanha aponte que é possível ampliar a proteção social e o investimento público sem necessariamente fazer o Estado crescer em proporção do PIB.
Engenharias financeiras para uso de garantias alavancando PPPs, conforme já noticiado pelo JOTA, poderiam multiplicar o investimento em infraestrutura de todo o setor público exigindo menos do orçamento federal e produzindo efeitos multiplicadores similares ou até melhores. Mas também conta-se com um desempenho melhor da economia, para o qual não há qualquer certeza.
Lula tem dito que quer discutir mais claramente política fiscal e econômica só depois de abertas as urnas e caso vença. É sua estratégia, apesar de seus auxiliares já terem ao menos três modelos na mesa: voltar à regra de resultado primário; ou ter algum limite de despesas liberando investimentos e gastos sociais; ou um regime fiscal anticíclico que mire uma trajetória de longo prazo para dívida. Por ora, resta seguir escrutinando o passado e buscando pistas nos discursos e documentos referendados pelo ex-presidente.