Huck, Arcuri, Raízen e Mercado Livre: as estratégias da BYD para conquistar o Brasil

Em entrevista à Inteligência Financeira, Alexandre Baldy, o principal executivo no Brasil da montadora chinesa de carros elétricos BYD, fala sobre os planos de expansão da empresa, que incluem investimentos agressivos em mídia e plataformas digitais

Na quarta-feira (28), por volta das 11 horas, a BYD, montadora chinesa de carros elétricos, abriu uma live no YouTube – também transmitida pelo Facebook e Instagram – para anunciar oficialmente o lançamento de seu compacto elétrico, Dolphin Mini. O modelo de preço mais acessível é a aposta da BYD para crescer no mercado brasileiro. “Chegou a hora da invasão chinesa”, disse à Inteligência Financeira Alexandre Baldy, principal representante da BYD no Brasil, na segunda-feira (26).

Antes de a live começar, havia 6.172 pedidos de reserva, de consumidores que desembolsaram R$ 10 mil para garantir a compra, antes mesmo de saber o preço final do veículo, que foi anunciado ali, ao vivo, no YouTube. O compacto elétrico da BYD tem preço final de R$ 115.800, acima da expectativa inicial que era de preço inferior a R$ 100 mil.

“O lançamento foi bastante diferente. É a primeira vez (no Brasil) que uma montadora anuncia um carro, sem comunicar o preço de saída. Estamos inaugurando um novo segmento, oferecendo um carro 100% elétrico, com preço mais acessível, sem dispor de itens de série e segurança”, diz Baldy.

A Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE), que monitora o avanço do mercado de eletrificados no Brasil, inclui os veículos híbridos (movidos a combustível, não eletricidade) entre suas estatísticas, de forma que, segundo a ABVE, o mercado de elétricos no Brasil é composto por três categorias: híbridos, híbridos plug-in (utilizam combustível, mas têm motor elétrico para potencializar a performance) e elétricos a bateria. A BYD faz parte desta terceira categoria, a dos eletrificados abastecidos por bateria.

As vendas de veículos leves eletrificados praticamente dobraram no ano passado, com crescimento de 91% sobre 2022, segundo número divulgado no mês passado pela ABVE. Foram 93.927 emplacamentos ante 49.245 em 2022.

Os dados para 2023 mostram uma mudança no mercado de carros eletrificados em direção a veículos híbridos plug-in e elétricos a bateria. Estas duas categorias representaram juntas 56% das vendas de veículos elétricos leves, totalizando 52.359 unidades.

A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) estima que em 2024 a venda de carros elétricos e híbridos deve crescer 61%. Tomando a projeção da Anfavea para o ano, de 2,45 milhões de emplacamentos de automóveis e comerciais leves (7% de aumento), os eletrificados teriam 5,8% de market share – tendo saído de 2023 com 3,8%.

A tabela, com dados da ABEV para as vendas de carros elétricos em 2023, considera as três categorias, e mostra o terreno disputado em que a BYD quer acelerar.

A BYD considera que é a principal marca de carros 100% elétricos no Brasil, dado que o ranking de vendas da ABEV considera veículos híbridos. Por isso, a Toyota ocupa a posição de número 1.

PosiçãoMarcaUnidades vendidas (2023)
1Toyota21.042
2BYD17.943
3Chery11.835
4GWM11.473
5Volvo8.179
6BMW4.431
7Land Rover3.712
8Kia2.382
9Porsche2.044
10Audi1.380
Fonte: ABVE com dados das fabricantes.

Mídia, influenciadores e plataformas digitais

Para abrir a live, a BYD contratou o apresentador Luciano Huck, que no dia anterior postou em seu Instagram, onde é seguido por 21,8 milhões de pessoas, uma chamada para o lançamento. “É amanhã!!! Eu vou estar lá!! Assista a live de lançamento do BYD Dolphin Mini.”

O papel de Huck, além de conduzir a live de lançamento do Dolphin Mini, era emprestar a sua autoridade, como influenciador digital, para o novo lançamento da BYD. Huck ressaltou que aceitou o convite da montadora chinesa após testar, e se surpreender positivamente, com o Dolphin Mini.

O marketing da BYD também aposta na mudança de comportamento do consumidor, mais interessado com as questões climáticas e em reduzir o custo de vida.

Para demonstrar os benefícios financeiros do lançamento da BYD, Huck chamou ao palco Nathalia Arcuri, uma das influenciadoras de finanças mais conhecidas do Brasil, segundo a Anbima. A fundadora do MePoupe estimou, numa conta rápida, ali mesmo no palco, que as economias seriam superiores a R$ 6 mil/ano, entre combustível, manutenção e isenção de IPVA para veículos elétricos.

Por fim, Huck convidou Frederico Saliba, CEO da Raízen Power, e Thiago Hipolito, diretor executivo da 99. O primeiro explicou a parceria da empresa de energia com a BYD para expandir a infraestrutura de carregadores no Brasil – um ponto de objeção de quem resiste aos elétricos.

Segundo Baldy, a expectativa é ter em pouco tempo 600 carregadores espalhados por 8 cidades, por meio da parceria com a Raízen. A empresa de energia é a principal aliada da BYD na expansão da estrutura de carregamento dos carros eletrificados.

Ao diretor executivo da 99 coube discorrer sobre as vantagens que serão oferecidas aos motoristas do aplicativo que toparem rodar com o Dolphin Mini.

“O motorista terá isenção de taxas cobradas pela 99, o que possibilitará a ele ficar com 100% das receitas das corridas”, disse Hipolito.

Essa é uma outra frente que a BYD aposta, ao oferecer ao consumidor de aplicativo a experiência de andar num BYD, na expectativa de torná-lo um cliente da marca.

Luciano Huck, na live de lançamento do Dolphin Mini, compacto elétrico da BYD. Foto: Divulgação/BYD
Luciano Huck, na live de lançamento do Dolphin Mini, compacto elétrico da BYD. Foto: Divulgação/BYD

Financiamento via Mercado Livre

A BYD ainda fechou parceria com o Mercado Livre para venda financiada do Dolphin Mini, inclusive com a criação de uma página específica na internet.

O movimento acontece no momento em que o portal de comércio eletrônico tem buscado fortalecer seu braço financeiro, Mercado Pago, e fidelizar clientes com operações de longo prazo.

Nos últimos meses, a companhia tem ofertado aos clientes empréstimos de até R$ 80 mil por pessoa para financiar até 80% do valor do automóvel.

Invasão Chinesa

Baldy está otimista com a perspectiva de crescimento da BYD no Brasil.

“As décadas de 1970 e 1980 ficaram conhecidas (na indústria automotiva) com a era da invasão japonesa. A Toyota conquistou o mundo. Nos anos 1990, vieram os coreanos e a Hyundai virou global. Chegou a hora da invasão chinesa”, diz.

Ele sabe que para a BYD liderar essa corrida terá de superar grandes obstáculos. Por exemplo, a presença de rede de assistência técnica próxima aos consumidores e a criação de uma mercado secundário, de revenda.

“Na China, onde os carros da BYD são utilizados há anos, temos bom histórico de mercado secundário e preço de revenda. Sabemos que o brasileiro vê o carro como um patrimônio. Logo, o valor de revenda é um fato relevante”, diz.

Segundo ele, a BYD está inaugurando uma rede de concessionárias e de distribuidores, por meio de parcerias com grupos renomados e conhecidos em cada região do Brasil.

“Escolhemos a dedo grupos de concessionários que têm capacidade de vender, fazer o pós-venda e, quando for o momento, a revenda com qualidade.”

A bateria dos veículos elétricos é outro ponto de questionamento frequente do consumidor.

De acordo com a BYD, suas baterias automotivas têm aproximadamente 5.000 ciclos (de vida útil).

“Considerando que cada ciclo completo dá ao carro autonomia de 400 quilômetros, estamos falando de um veículo elétrico que pode rodar até 2 milhões de quilômetros”, diz Baldy.

Expansão do negócios

Nesse momento, a BYD investe em novas plantas industriais na China, Tailândia, Hungria e Brasil.

“Queremos que a fábrica da Bahia se torne um ‘hub regional’, como disse a Stella Li, a CEO da BYD para as Américas”, diz Baldy.

Numa outra frente, a BYD considera adquirir uma mineradora de lítio, principal matéria prima para as baterias de seus carros. A empresa alvo seria a Sigma Lithium, maior mineradora de lítio do Brasil.

“A BYD tem um modelo verticalizado (quando a empresa produz seus próprios insumos). Investir em lítio aqui na região, e especialmente no Brasil, é relevante. Há tratativas, sim. Existem negociações em andamento.”