Futebol feminino ‘on fire’: aumento de interesse precisa vir com maior transparência

Apelidos como Brabas do Corinthians e Guerreiras Grenás da Ferroviária ajudam a aproximar fãs

Na quarta-feira (12), tivemos duas partidas transmitidas nas TVs em São Paulo: Corinthians e Ferroviária duelavam por uma vaga na final da Supercopa feminina de futebol, enquanto Botafogo e Corinthians disputavam uma partida do campeonato paulista. Enquanto as mulheres jogaram à tarde, os homens disputaram o jogo no tradicional horário das 21h. O futebol feminino foi transmitido pela Globo e o masculino, pela Record. O feminino alcançou 12 pontos de audiência, enquanto o masculino chegou aos 9 pontos.

Não vou entrar no mérito do valor de cada horário. Nem precisa ser especialista para saber que o horário nobre é o das 21h, e que as meninas disputaram uma partida num horário alternativo, teoricamente de menor valor de mercado, ao mesmo tempo que bem mais concorrido.

Também não vamos explorar a diferença de penetração das TVs que transmitiram as partidas, pois haveria várias possibilidades de análise, da audiência basal da Globo – TVs que ficam ligada independente do que estão transmitindo – ao desconhecimento de que a Recordo transmite o Paulistão, fracionado de maneira completamente maluca em tantos veículos que dificultam o acesso a quem quer acompanhar a partida.

A força do futebol feminino

Esqueça isso, e foque no que é importante: o futebol feminino está ganhando tração.

Clubes como Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Santos e Ferroviária dão mostras de que a modalidade pode ser aumentar o interesse do público no decorrer do tempo.

Estamos construindo um novo negócio, e os fãs estão aparecendo.

Foi-se a época em que o futebol feminino era lembrado apenas nas copas do mundo e jogos olímpicos, período em que todos lembravam que a Marta existia, mas ignoravam que não era apenas ela.

Hoje temos as Brabas do Corinthians, as Guerreiras Grenás da Ferroviária, os clubes e a mídia entenderão que esses apelidos podem ser legais para ajudar a desenvolver o produto a aproximar fãs, diferenciado a modalidade do masculino.

Corinthians e Ferroviária já haviam colocado mais de 42 mil pessoas na Neoquímica Arena na final do Brasileiro de 2023.

O Internacional levou mais de 36 mil pessoas na final do campeonato do ano anterior. Falamos muito dos clubes paulistas, mas Internacional, Goiás, Fortaleza são exemplos de clubes que têm dedicado atenção á expansão da modalidade e crescimento de interesse.

Futebol feminino na Europa

Na Europa também vemos aumento de interesse, com melhoria na estrutura das competições, calendário parecido com o masculino, o que ajuda a criar um “de/para” de importância das competições.

No Brasil, ainda carecemos de uma estruturação do calendário que permita essa percepção.

Ao mesmo tempo, seguimos carentes no Brasil e no mundo de mais informações que permitam ao mercado entender onde estamos e ajudar a a projetar para onde vamos em termos financeiros.

Não temos números individualizados e destacados das equipes femininas. De tal forma que, quando vemos que a equipe feminina do Palmeiras terá um patrocínio máster de camisa de R$ 18 milhões com uma casa de apostas, substituindo uma empresa farmacêutica, não temos a dimensão se isso é muito ou pouco.

Mas é louvável que a modalidade esteja atraindo parceiros específicos, de diversos segmentos da economia. Percepção de valor.

Nesse sentido, é interessante observar que o Manchester United divulga, desde 2020, as demonstrações financeiras da sua equipe feminina, que fica alocada numa empresa específica, a Manchester United Women’s FC Ltd.

Vamos observar a evolução dos números:

Receita do futebol feminino

Conforme a modalidade foi evoluindo na Inglaterra, com o crescimento da Premier League feminina, as receitas acompanharam, fazendo com que a empresa multiplicasse por 5 o faturamento entre 2019 e 2023. Mesmo se incluirmos o efeito inflacionário, que no período foi de 23,3%, o crescimento seria de 4,5 vezes.

Consequentemente, os custos com remuneração cresceram 3,6 vezes, considerando o efeito inflacionário. Ao mesmo tempo em que a maturidade das competições forçou o aumento de outros custos. Mais viagens, melhores estruturas, é parte do crescimento.

Na parte das receitas, é interessante observar que a maior fonte são as receitas comerciais, ou seja, os patrocínios. Veja abaixo:

As receitas comerciais representavam 88% do total, com o matchday (bilheteria e gastos nos jogos) era de apenas 7%, e direitos de transmissões limitados. Mas, um ano depois (junho/23), as comerciais seguiram crescendo, mas as demais receitas tiveram saltos importantes, praticamente triplicando seus valores.

Isso é fruto do maior interesse de público, seja no estádio, seja na TV. Ou seja, criação de valor na veia.

No Brasil é muito diferente?

Não sabemos ao todo. No que diz respeito ao interesse de público, estamos crescendo, como vimos mais acima. Há marcas que se interessam pela modalidade, mas ainda enorme intersecção com o masculino. E a parte de remuneração é uma total incógnita.

Como sempre digo, para poder analisar, entender e propor melhorias, é fundamental termos informações.

A partir de demonstrações como as que vimos do Manchester United, conseguimos medir a evolução, e isso implica em mais interesse de investidores, em avaliação da sustentabilidade da modalidade.

Com tantas evoluções e aumento de interesse dos clubes, aguardo a chegada dessa transparência, colocando-me à disposição para ajudar nesse processo. Precisamos parar de jogar pedras, e começar a proteger as vidraças.