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12 anos e dívida 4 vezes maior: o tamanho das dificuldades do Corinthians
Vamos imaginar que, num período de 7 anos, um determinado clube de futebol tenha conquistado sua primeira Copa Libertadores, um Mundial de Clubes, três campeonatos brasileiros. Este time construíu uma das mais bem-sucedidas estratégias de marketing no futebol. Este time, aliás, ele é o único que, de fato, conseguiu com que patrocinadores tenham pago os salários de um astro. Agora, 12 anos depois do início dessa história, e 6 após o último título, este clube enfrenta uma situação financeira que transforma a gestão diária num eterno apagar de incêndios, que compromete a capacidade competitiva. Sim, estou falando da dívida do Corinthians.
Evolução da dívida do Corinthians
Vamos ao quadro de evolução desde 2012. Lembrando que em 2011 o clube foi campeão brasileiro e em 2012 foi da Libertadores e Mundial.
Antes, porém, já havia apresentado um grande plano de marketing na volta da Série B, com a chegada de Ronaldo e uma série de novos patrocinadores, que turbinaram as receitas do clube.
Em 2012 teve início, também, o novo contrato de direitos de transmissão com a Globo. Por ele, o clube recebe o maior valor junto com o Flamengo, após a implosão do Clube dos 13 capitaneada pelos dirigentes do clube paulista.
Ou seja, cenário perfeito para seguir voando. Inclusive porque Flamengo e Palmeiras entravam em período de reestruturação, e o São Paulo vivia preso ao passado, tornando-se cada vez mais arcaico.
O quadro abaixo mostra bem a evolução da dívida do Corinthians:
Dívida que se multiplica
No período entre 2012 e 2023 a dívida foi multiplicada por 4, enquanto as receitas cresceram 2,8 vezes em termos nominais e 1,4 vezes em termos reais (corrigidas pela inflação). E o comportamento precisa ser analisado com cautela, porque há fases.
Observe que entre 2012 e 2015, a dívida do Corinthians tem um comportamento de alta, mas moderado.
Na sequência, entre 2016 e 2018 não chega a ter grandes saltos, que ocorrem a partir de 2019 – ou seja, pré-pandemia – explodir no pós-pandemia e depois andar de lado até 2023.
Dívida X receita
Algo que sempre digo é que o número isolado da dívida diz pouco. Afinal, quem ganha R$ 10 mil e deve R$ 1 mil está melhor do que quem ganha R$ 1 mil e deve R$ 500, pois no primeiro caso a dívida representa 10% da receita mensal e no segundo ela representa 50%.
Então, em se tratando da dívida do Corinthians, vamos comparar os números com as receitas e com a geração de caixa, o famoso EBITDA, que é a diferença entre receitas e custos/despesas, e indica a capacidade de pagamento dessa dívida.
Note que há melhora no índice que compara as dívidas com as receitas. Isso mostra um cenário que não é de todo mal, afinal, mais receita geram mais capacidade de organizar a vida e reduzir as dívidas.
Entretanto, quando comparamos com o EBITDA, observe que ele roda sempre acima de 6 vezes, com exceção de 2023.
Mas isso tem como explicação a entrada de uma receita extraordinária de R$ 50 milhões referente ao contrato de venda de placas com a Brax. Sem ela, a relação vai acima de 7 vezes.
O que acontece com a dívida do Corinthians?
O que isso indica?
Que as receitas crescem mas estão sendo gastas, e que sobra menos dinheiro para cumprir com pagamento de despesas financeiras, investimentos e pagamento das dívidas.
Dois indicadores dessa realidade: posição de dívida com impostos parcelados no curto prazo e pagamento de despesas financeiras, como vemos logo abaixo:
Entre 2013 e 2023 o clube gastou 13,9% das receitas com pagamentos de despesas financeiras e impostos renegociados, e nos últimos 4 anos a média é de 15,8%.
E isso, considerando que os impostos parcelados pagos são aqueles que constam no curto prazo do ano anterior.
Aliás, note que à medida em que a dívida com parcelamentos cresce – saiu de R$ 211 milhões em 2019 para R$ 511 milhões em 2023 –, cresce também a parcela de curto prazo. Esta saiu de R$ 9,6 milhões para R$ 67,3 milhões.
Não dá para saber se tudo é realmente pago.
Isso porque os balanços somam diversas movimentações, mas este é o número que, em tese, deveria ser pago no ano.
Gestão de caixa
O que isso tudo significa?
Antes de mais nada, há notícias ruins, mas também há boas notícias.
Começando pelas ruins, a realidade do clube é de enorme dificuldade na gestão de caixa, fruto da opção por tentar ser competitivo a partir da estratégia de se endividar.
Ao mesmo tempo em que Palmeiras e Flamengo faziam a lição de casa, o Corinthians optou pelo caminho oposto, especialmente quando percebeu que os rivais tinham andado algumas casas no tabuleiro, e ele permanecia no mesmo lugar.
Agora, para solucionar este problema é necessário um processo duro de renegociação dos passivos, busca por parceiros financeiros que auxiliem na redução das dívidas, eventualmente uma recuperação judicial, e necessariamente uma gestão profissional e focada em corte de custos e reorganização do clube.
E, francamente, sem a ladainha de que “agora as receitas dependem de performance e é preciso investir, gastar, dar all in, etc e tal”. Menos, bem menos. Esse discurso não gerou resultados além de uma final de Copa do Brasil, e levou a dívida para patamares perto do insustentável.
E olha que aqui nem incluímos a dívida com a Arena, que drena perto de R$ 100 milhões anuais do caixa do clube só com despesas financeiras, o que aumenta ainda mais o grau de dificuldade de gestão.
A boa notícia, que exploraremos mais em detalhe no próximo Relatório Convocados, é que as receitas podem chegar a perto de R$ 1 bilhão, e com organização, controle de custos, eficiência de gastos, associados a uma reestruturação de passivos, há possibilidade de recuperar o clube.
Recuperação do caixa do Corinthians
Os dados acima assustam?
Sim, e devem mesmo assustar.
Mas se começar o trabalho rapidamente, abandonar a visão e prática amadoras, e ter consciência de que a recuperação vai levar um tempo, mas é possível alcançá-la, então o susto teve efeito positivo.
Se não, será apenas mais um episódio de uma série de terror sem fim.
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