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Samuel Pessôa: Haddad vai bem, mas preocupação é Lula desistir de projeto de governo em busca de popularidade
O ministro da economia Fernando Haddad vive um caso de amor com a Faria Lima.
Um exemplo disso são os elogios ao petista endereçados por Samuel Pessôa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), e responsável pelos cenários macroeconômicos da Julius Baer Brasil, uma das mais tradicionais gestora de fortunas do país, que atende clientes com um cheque de no mínimo R$ 25 milhões.
“(Fernando) Haddad está indo bem. O ministro teve méritos de desenhar a agenda (econômica), que é consistente internamente. E demonstrar competência de negociar a tramitação dessa agenda no Congresso”, afirmou Samuel Pessôa, que é físico, com doutorado em economia.
No entanto, o receio de Samuel Pessôa é com o chefe do ministro da Fazenda. Ele teme que o presidente Lula dê uma guinada populista, pressionado por uma queda de sua popularidade. “(Preocupa) o presidente desistir (da politica de Haddad)”, diz.
Em entrevista exclusiva para a Inteligência Financeira, ele faz um balanço sobre o crescimento da economia no ano passado. E projeta os desafios para 2024 e os próximos dois anos.
A entrevista foi gravada em vídeo e será publicada na próxima quarta-feira, 13, no canal da Inteligência Financeira no Youtube, basta clicar aqui.
Confira a seguir os principais trechos da conversa.
Qual sua avaliação sobre o desempenho da economia no ano passado?
Samuel Pessôa: Ela me surpreendeu bem. Eu sou colunista da Folha de S. Paulo há 11 anos. E a última coluna que eu escrevo no ano, todo ano, chama “Olhando pra frente e olhando pra trás”. Construo um cenário para o ano que se abre e faço a avaliação do cenário que eu havia construído para o ano que passou. Em dezembro de 22, tem lá o que eu achava que iria acontecer em 23. Imaginava que o crescimento ia ser entre 1% e 1,5%. O resto, eu enxerguei legal: inflação, Selic, câmbio não teve grandes surpresas. Mas no crescimento houve uma surpresa. Não foi 1,5%, foi 2,9%.
O que surpreendeu no crescimento?
A gente já sabia que o crescimento da agropecuária ia ser bom, mas ele veio bem mais do que a gente imaginava. Eu imaginava a agropecuária crescendo 8%, 9%. Cresceu 15%. Teve uma surpresa na agropecuária de uns 6%. Isso adiciona no PIB 0,4%. Essa surpresa na agropecuária tem seus transbordamentos para os outros setores. Posso dizer que 0,6%, 0,7% foi a surpresa na agropecuária. O resto ficou dividido em dois outros fatores.
Um deles é uma capacidade de crescimento da economia, que é um pouco maior do que a gente imaginava. A gente trabalhava com o PIB potencial de 1,5%. Hoje, esse negócio parece estar mais próximo de 2%. E a gente teve uma política fiscal muito expansionista o ano passado, que ajudou a um crescimento. Mas, o fato dessa política fiscal expansionista gerar um crescimento adicional, e não ter gerado pressões inflacionárias significativas, é sinal do segundo ponto que eu havia dito. Que a capacidade de economia de crescimento em condições normais de operação da economia brasileira aumentou um pouco.
O consumo das famílias apareceu no segundo semestre e ajudou a sustentar o PIB. Esse resultado do consumo, por ser um governo do PT, já estava em suas contas?
Estava. Era um crescimento liderado pela agropecuária e consumo. Todo mundo sabia que a gente estava num período de uma certa incerteza. E, portanto, o investimento não vai bem. A taxa de investimento cai no Brasil desde o primeiro trimestre de 2022. E, no meu entender, essa queda do investimento é uma dificuldade que as pessoas têm de olhar para frente.
Como é isso?
A gente tem um problema fiscal que não está resolvido. E um país que tem um Tesouro que não paga suas contas, é muito difícil você ter horizonte de planejamento. Eu acho que a gente vai ficar meio capengando no investimento até o próximo mandato. Eu não vejo uma solução mais definitiva do problema fiscal nos próximos dois anos. Apesar do ministro Fernando Haddad ter ido bem. Ele está encaminhando soluções que, com o passar dos anos, vão se acumular e provavelmente consigamos construir uma situação fiscal mais estável.
Dos grandes gatilhos do PIB, um você já falou, o agronegócio. Outro é a indústria extrativa, puxada pelo petróleo, que avançou 8,7%. Quais as perspectivas para esses setores em 2024?
A agricultura tem uma variabilidade grande. O crescimento muito alto do ano passado foi porque nós tivemos condições meteorológicas perfeitas – não é que foram boas, (foram) perfeitas. E o ano passado sucedeu um ano de uma La Niña muito dura. Uma quebra de safra grande no Rio Grande do Sul, no Paraná e no sul do Mato Grosso do Sul. Então, você tem um ano perfeito, que sucede o ano com muitos problemas. A variação é grande, é natural. Se a gente crescer zero esse ano na agropecuária, na verdade, é um resultado fantástico, porque a gente consolida uma safra de 320 milhões de toneladas. A agropecuária deve ser zero, -2%, -3%, alguma coisa assim. E a extrativa mineral, eu acho que vai não crescer os 8%, mas deve crescer uns 3%, 4%.
Sem essa força das commodities, de onde virão os motores da economia em 2024?
Eu acho que ainda (vai ser) o consumo. Não vejo grande recuperação no investimento. Talvez ele pare de cair, a gente tenha uma estabilização da taxa de investimento. Mas eu acho que vai continuar sendo o consumo das famílias. A gente pega a renda na PNAD, ela esta vindo forte. Não só a renda, mas a massa salarial. A economia brasileira tem gerado emprego, tem gerado renda e isso gera um arrasto de demanda pra esse ano.
Eu acho que (a força da economia em 2024 vai ser) o consumo. A economia brasileira tem gerado emprego e isso gera um arrasto de demanda para esse ano.”
Samuel Pessôa, sócio diretor do Julius Baer e pesquisador do FGV IBRE
De quanto deve ser o crescimento da economia neste ano?
Eu acho que esse ano a gente vai ter um crescimento que deve ser trimestre a trimestre, de 0,5%. Aí você fala, ‘Samuel, vai dar 2%?’ Não, não vai. Se a economia cresceu X em tal ano, a conta que a gente faz não é pegar o quarto trimestre de um ano contra o quarto do ano anterior. A gente pega a média dos quatro trimestres daquele ano e compara com a média dos quatro trimestres do ano anterior. Então, nessa conta, se a economia brasileira crescer 0,5%, 0,5%, 0,5% e 0,5%, a média desses quatro trimestres de 2024, contra a média dos quatro trimestre de 2023, vai dar 1,6%. (Esse) é o número que eu tenho.
O que precisaria acontecer para a economia repetir o desempenho do ano passado, acima de 2%?
Primeiro, crescer 2% não está ruim. A população trabalhadora hoje cresce a 0,7%, 0,6%. Crescer 2% significa que a produtividade do trabalho vai crescer 1,3%. Quando a gente diz que a taxa de crescimento potencial da economia brasileira é de 2%, eu estou dizendo que eu acredito que a gente consegue elevar a produtividade do trabalho ao ritmo de 1,3% ao ano. Se perguntar qual foi o crescimento da produtividade do trabalho entre 1980 e hoje, nesses 40 anos, foi 0,5%. Então, achar que nos próximos anos a gente vai conseguir operar com a produtividade do trabalho crescendo a 1,3%, é uma melhora significativa com relação às últimas quatro décadas.
Mas para 3%…
Para 3% eu tenho que melhorar ainda mais. Tem que fazer com que a produtividade do trabalho cresça acima de 2%. Nos oito anos do governo Lula (2003 a 2011), a gente conseguiu isso, a produtividade do trabalho cresceu a 2% e pouco. Mas a gente fez de uma forma não sustentável. Terminamos numa grande crise.
Eu acho que a gente tem dois problemas e acho que a gente está bem ou mal encaminhando os dois problemas. Não sei se com a velocidade requerida. O primeiro. Tem que fazer reformas para aumentar a eficiência microeconômica de funcionamento da economia brasileira. E a gente fez uma ótima reforma, que foi a emenda constitucional da reforma dos impostos indiretos no ano passado.
Esse ano, o Congresso brasileiro tem um trabalho muito grande, que é aprovar as três legislações complementares que vão implantar aquela reforma constitucional. Vai ter uma transição até 2032 e a partir de 33 vai ter um regime tributário totalmente novo. A produtividade vai melhorar muito. A gente vai ter um sistema tributário normal. O Brasil tem um sistema tributário hoje, que não é um sistema tributário, é uma bagunça tributária. Que gera muito litígio, gera muito má alocação de investimento, gera guerra fiscal.
A gente também tem que atacar o problema educacional. As crianças vão pra escola, elas não aprendem. E gente que não foi para a escola direito é um trabalhador pouco produtivo. Essa é a agenda de aumentar a produtividade.
Agora, além disso, a gente tem que criar incentivos para que aumente o investimento. O investimento no Brasil é muito baixo, O aumento da produtividade, aumenta o investimento. Mas a gente tem um problema dramático, que é a segunda questão que está atrapalhando o crescimento brasileiro, que é um problema fiscal estrutural. Na situação normal de operação da economia, o setor público tem gastos primários maiores do que as suas receitas e isso não estabiliza a dívida pública. Precisa criar uma situação fiscal estável, solvente, que é conseguir ter um superávit primário suficiente para estabilizar a dívida pública.
Você tem uma perspectiva otimista com relação à situação fiscal, não é?
Construtiva, digamos assim.
Explica isso, por favor.
O ministro (Fernando Haddad), no ano passado, foi muito bem. Além de ter aprovado a reforma dos impostos indiretos, ele aprovou o arcabouço fiscal e aí conseguiu aprovar um monte de medidas que sinaliza um aumento de arrecadação.
(O arcabouço fiscal) foi bem desenhado. Ele tem uma série de respostas automáticas ao não cumprimento de meta que vão na direção de correção. Se eu deixar ele operando durante um tempo, a situação fiscal vai melhorando lentamente. No entanto, ele é insuficiente. Porque o ponto de partida é um déficit primário muito elevado. E isso é fruto da escolha que o presidente Lula fez de inverter a ordem natural do ciclo político da despesa. E começar o governo gastando muito.
Em geral, as pessoas dizem, está lá em Maquiavel (O Príncipe, de Nicolau Maquiavel): você começa fazendo as maldades, gasta capital político para arrumar a casa e colhe lá na frente.
O presidente Lula, por uma série de motivos, resolveu inverter essa lógica. E isso faz com que a situação fiscal de partida da operação do marco do novo arcabouço fiscal seja insuficiente. Por isso que ele tem uma agenda de aumentar a carga tributária e tem uma segunda de aumento de carga tributária, que é a reforma do Imposto de Renda, que ele deve mandar para o Congresso no final desse ano.
(A reforma do Imposto de Renda) deve tramitar no ano que vem, porque o grosso do esforço do Congresso esse ano vai ser na tramitação das três legislações complementares que operacionalizarão a emenda constitucional da reforma dos impostos indiretos.
Mas a partir do ano que vem, o Congresso vai discutir a reforma da renda, que é tributar provavelmente a distribuição de dividendos, reduzir os impostos da alíquota de contribuição social sobre o lucro líquido e imposto de renda da pessoa jurídica. Provavelmente (também) aumentar um pouco a carga tributária sobre as empresas que operam no regime do Simples e do Lucro Presumido. E restringir ou adequar melhor o instituto do juro sobre o capital próprio (JCP).
(A reforma do Imposto de Renda) deve tramitar no ano que vem, porque o esforço do Congresso esse ano vai ser na tramitação das três legislações complementares que operacionalizarão a emenda constitucional da reforma dos impostos indiretos.”
Samuel Pessôa, sócio diretor do Julius Baer e pesquisador do FGV IBRE
Essas medidas seriam suficientes, em sua opinião, para resolver a questão fiscal?
Eu acho que o aumento de carga tributária que vem das medidas que ele aprovou ano passado, somado mais um a 1,5% que ele pode arrecadar mais com os impostos de renda, tributando melhor as altas rendas, aumentando a progressividade dos impostos e renda… A gente tem que lembrar: aumentar a progressividade dos imposto de renda significa tributar um pouco mais (as empresas do) Simples e lucro presumido, porque as empresas que operam no lucro real já têm uma carga elevada. E as oportunidades de planejamento tributário que elas tinham no ano passado, o ministro já aprovou uma boa agenda que tampa essas oportunidades ao longo do tempo.
Tem talvez uma redução dos créditos acumulados em função daquela decisão que o Supremo Tribunal tomou há uns anos atrás, que o governo perdeu, (chamada de) Tese do Século. Então, o pacote, é o fim dos créditos da Tese do Século.
Aumento da arrecadação em função do fechamento de oportunidade de planejamento tributário. Algum aumento de impostos, tributando mais Simples e Pejotinha. E disciplinando um pouco melhor (o benefício do) juros sobre o capital próprio. Acho que ele consegue os 2% do PIB. E isso, com a operacionalização do arcabouço fiscal por mais uns três, quatro anos, você pode construir nesse horizonte um superávit primário que estabiliza a dívida pública.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse recentemente que o governo tem condições de entregar um déficit fiscal menor do que a atual projeção do mercado, de 0,7% e 0,8% do PIB. Você concorda com isso?
Meu número é 0,8%. Mas tem possibilidade de ser menos. Por exemplo, existe uma possibilidade de uma transação tributária entre a Petrobras e o Tesouro, em função de um (volume de recursos) a receber que o Tesouro alega que tem.
Eu não sei se isso vai ser utilizado ou não, porque às vezes a gente houve números de até R$ 30 bilhões. Se aparece R$ 30 bilhões de uma transação tributária da Petrobras com o Tesouro, o 0,8% já vira 0,5%. Tem uma incerteza imensa. Eu faço um monte de hipóteses a respeito do impacto tributário dessas medidas que foram aprovadas no ano passado. E a gente é meio conservador, faz hipóteses um pouco mais pessimistas. Tem, sim, uma possibilidade de ser menos do que 0,8%.
Você projeta uma inflação neste ano em 3,5%, mais ou menos em linha com o mercado. Você vê alguma pressão inflacionária no horizonte?
Eu vejo, sim. Esse número (da inflação) é bom, mas no final do ano a gente vai ver que a abertura dele não vai ser muito legal. É um número que vai vir de uma inflação de alimentos muito baixa. Ela até está meio alta, mas isso é sazonal. A gente sabe que a safra vai ser boa. Teve até uma quebra. Teve o El Niño. Parecia que ia ter uma quebra que ia bater uns 30 milhões de toneladas. Mas choveu na hora certa, os agricultores replantaram e, aparentemente, a quebra no Brasil vai ser de 10 a 15 milhões de toneladas. Eu trabalho com uma inflação de alimentos, algum número entre 3% e 4%.
E tem um outro pilar da inflação mais baixa que são os bens industriais.
Tem uma pressão inflacionária que vem da China, fruto do excedente exportável que a indústria deles produz. É só olhar a Faria Lima aqui a quantidade de carro elétrico que a gente vê. Imagina se há cinco anos atrás você iria imaginar que ia ver nas ruas de São Paulo tanto carro elétrico agora. A gente trabalha com uma inflação de bens industriais entre 1%, 1,5%.
Voltando à sua pergunta original, o número (da inflação em 2024) é 3,5%, mas com alimentos baixos, bens industriais baixos e serviços subindo. Eu estou supondo que a economia vai crescer 2%. Assim, o mercado de trabalho vai continuar apertado. Mercado de trabalho apertado, os salários vão começar a crescer. A gente já olha os dados da PNAD, a gente vê que tem uma pressão de salários e, portanto, serviços, que é o setor intensivo em trabalho, vai começar a subir. Não é nada explosivo, é tudo incremental. Mas a dinâmica não é muito favorável.
Isso explica esse fenômeno atual de mercado de trabalho aquecido, mas com a inflação comportada?
É isso. Você tem uma composição de alguns itens que favorecem: bem-estar, tanto alimentos quanto industriais também. E os serviços caíram muito. Então, vai iniciar um processo de aceleração a partir de uma base que está bem baixa.
Também se fala sobre o home office. O quando do home office tem de impacto nessa realidade?
Eu não sei. Eu não pesquisei isso. O argumento para mim faz todo sentido, eu vejo no meu dia a dia, nas minhas relações casuais, mas eu nunca vi um estudo mais sistemático. Mas isso deve ser verdade, porque a gente olha para o aluguel corporativo e está mal. Está sobrando metro quadrado para alugar de comercial, de salas comerciais, que é um sinal de que o home office ainda está bem e a gente sabe que o home office reduz o custo. E as pessoas aceitam trabalhar ganhando um pouco menos.
Com base em todo esse cenário, como vê a condução da política monetária?
Eu imagino que a taxa Selic vai cair. Termina o ciclo com 9%.
Mas como eu estou dizendo para você, é uma inflação que termina esse ano próximo da meta, baixa, com uma composição ruim. E tudo o que eu vejo na atividade econômica sugere que a economia deve continuar crescendo (no nível) potencial dela.
Então, com o mercado de trabalho, me parece, está muito apertado, se eu olhar para 2025, eu vejo uma dinâmica de serviços continuando a pressionar a inflação, com alguma moderação, com alguma estabilização de bens industriais e alimentos.
Dá para dizer que a tendência da inflação, depois de cair para 3,5% nesse ano, vai ser começar uma lenta trajetória de subida. Então, se eu tivesse que fazer um prognóstico, eu diria que depois de crescer, cair para 9%, o próximo ciclo de Selic, não sei quando ele será, vai ser um ciclo de elevação. A gente está com Selic a 9% para os próximos dois anos.
Recentemente, o presidente do Bradesco, Marcelo Noronha, afirmou que é razoável esperar que a taxa de juros do Brasil recue para 7% e 8% num horizonte de cinco anos. Como vê isso?
Cinco anos, eu não consigo enxergar. Mas eu consigo construir um cenário em que isso aconteça, sim. Acho que tem todas as condições.
Qual seria o cenário?
A gente consegue resolver o problema fiscal, que me parece alguma coisa que vai ficar mais claro em dois, três anos. Com isso, cria um superávit primário suficientemente grande para reduzir levemente a trajetória da dívida.
Para fazer isso, a gente tem que aprovar uma PEC mudando os mínimos constitucionais para Saúde e Educação. Os mínimos constitucionais para saúde e educação estão vinculados à receita.
E a gente aprendeu que vincular gasto público em receita é muito ruim, porque a receita é muito volátil. A receita sobe, o gasto aumenta. Aí, quando a receita cai, o que eu faço, corto o gasto?
Se a gente já tem uma regra que é boa, que estabelece um crescimento para o gasto primário, vamos vincular os mínimos constitucionais de Saúde e Educação no gasto e não na receita. Essa é uma PEC que precisa ser feita.
A gente tem que mudar a regra do salário mínimo. Ela vincula o aumento do salário mínimo ao crescimento. Pode ser vinculado ao crescimento, mas tem que ser o crescimento do PIB per capita, não do PIB absoluto. Qual a ideia da regra do salário mínimo? É criar um mecanismo automático em que a gente compartilhe com as pessoas que recebem menores salários os ganhos de produtividade que ocorrem na economia.
Mas isso amarraria o crescimento do salário mínimo.
Mas não dá para crescer eternamente, além da produtividade. No longo prazo, o salário mínimo tem que crescer junto com a produtividade.
Se eu quiser que permanentemente o salário mínimo cresça mais rapidamente do que a produtividade, um hora o Estado quebra. Essa amarração tem que existir. Ela vai vir por bem ou por mal. Porque se a gente não fizer, uma hora o estado quebra.
Seu eu resolvo o fiscal, tem um espaço para o câmbio ir para R$ 4, tranquilamente. O câmbio está desvalorizado com relação a isso.
A gente está com superávit na balança comercial e estrutural de R$ 70 bilhões, R$ 80 bilhões, R$ 90 bilhões, R$ 100 bilhões por ano.
É uma novidade que veio para ficar. Essa novidade não foi para o preço (do câmbio). Se a gente resolver o problema fiscal dessas duas mudanças que eu mencionei aqui, a gente ganha um horizonte de planejamento e a gente constrói uma solvência perene do país. Isso vai fazer com que o câmbio volte. Aí, com estabilidade fiscal, o câmbio lá em baixo, a Selic vai á 7%, perfeitamente.
Qual a sua avaliação sobre a política econômica do Haddad? Consegue comparar com governos anteriores do Lula?
Eu acho que o Haddad está indo bem. Ele construiu uma agenda, que é uma agenda de ajuste fiscal pela esquerda, que prioriza aumento de carga tributária em vez de redução de gastos. Absolutamente legítimo isso.
Acho que o ministro teve méritos de desenhar a agenda, que é consistente internamente. Convencer o presidente da importância da agenda. E demonstrar competência de negociar a tramitação dessa agenda no Congresso.
É também um desenho de política econômica diferente do que prevaleceu no período Guido Mantega, quando a gente teve uma deterioração fiscal permanente. E um intervencionismo permanente. A gente não vê por parte do ministro Fernando Haddad esse desejo por essa agenda intervencionista.
Em que o Haddad te preocupa?
(Preocupa) o presidente desistir. O que me preocupa é o presidente olhar os dados de popularidade dele e achar que é melhor ele fazer um populismo maior.
A gente vem de uma semana em que a popularidade do presidente caiu.
Mas mesmo com essa perda na última semana, se a gente comparar a trajetória de popularidade do Lula com a do Borek (Gabriel Boric), no Chile, ou com o Petro (Gustavo Petro) na Colômbia, ele está com uma queda muito menor.
Ele conseguiu sustentar a popularidade dele no início. E vamos torcer que o Lula não fique tão seduzido em ficar olhando a popularidade todo dia e imprima uma noção de mais médio prazo na condução da política econômica dele.
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