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O que é a autonomia do Banco Central e por que ela volta a ser discutida atualmente?
O Brasil estabeleceu em 2021 a autonomia do Banco Central. Embora essa definição seja reducionista, ajuda a explicar que o BC conseguiu se afastar das decisões do executivo federal. Mais especificamente, das decisões do presidente da República.
O tema volta à discussão porque há no Congresso uma proposta de lei que visa ampliar esse descolamento entre BC e executivo.
Nesse sentido, entenda o que é autonomia do Banco Central em suas diferentes dimensões, quais mudanças ainda estão em discussão e as avaliações sobre o que já está consolidado.
O que é a autonomia do Banco Central?
A autonomia do Banco Central é, na verdade, composta por cinco dimensões: técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira.
Nesse sentido, a autonomia técnica existe desde o início do funcionamento da instituição, nos anos 1960, e garante que as incumbências do BC, definidas por lei, sejam colocadas em prática.
Entre elas, o patamar da taxa básica de juros e a guarda das reservas internacionais.
Autonomia operacional foi a grande mudança até aqui
Já a autonomia operacional, que é a que foi alterada em 2021, por meio da Lei Complementar 179, que ficou conhecida como ‘Lei da Autonomia do Banco Central’, definiu mais claramente que o Banco Central tem como principal objetivo perseguir e atingir uma meta de inflação.
“O grande objetivo passou a ser o cumprimento da meta de inflação definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Enquanto isso, a suavização do ciclo financeiro e a estabilidade financeira foram colocadas como funções inferiores à concretização do regime de metas”, avalia Simone Deos, professora do Instituto de Economia da Unicamp.
Além disso, a lei de 2021 consagra a autonomia operacional ao definir o descasamento entre os mandatos de presidente e diretores do BC em relação ao do presidente da República.
A primeira experiência relacionada a essa mudança foi com a posse de Lula, em 2023.
Assim, mesmo com as diferenças entre o governo Lula e Roberto Campos Neto, o presidente do BC segue em seu mandato que termina no final de 2024.
“A transição de um governo para outro foi mais estável, com menos volatilidade no mercado do que nas eleições anteriores, mesmo com tanta polarização”, destaca Evandro Buccini, sócio-diretor da Rio Bravo. “Isso porque o presidente (da República) não pode demitir por qualquer motivo (o presidente do BC), como faz com um ministro”, complementa.
Autonomia do Banco Central em outras dimensões
Já as outras dimensões – administrativa, orçamentaria e financeira – continuaram atreladas ao governo federal depois das mudanças de 2021.
Contudo, a PEC 65/2023, em trâmite no Congresso, visa mudar o regime jurídico aplicável ao Banco Central e dar autonomia à instituição também nessas áreas.
Dessa forma, a PEC pretende transformar o Banco Central de uma autarquia sob tutela do CMN em uma empresa pública autônoma.
O texto da PEC está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado.
Decisões pautadas na técnica
Uma das interpretações diz que a autonomia do Banco Central protege a autoridade monetária para que consiga cumprir sua missão da estabilidade de preços.
Assim, sem pressão da política institucional.
“A autonomia do Banco Central ajuda que decisões sejam pautadas na técnica e dados econômicos, e não na pressão do executivo. Assim, ajuda a desvincular as decisões do ciclo eleitoral”, diz Maria Luisa Nepomuceno, analista de renda fixa da Nord Research.
Dessa maneira, Buccini da Rio Bravo diz que o Banco Central, ao garantir ao menos a autonomia operacional, se aproxima das melhores práticas do mundo.
Porém, ainda há um caminho longo a percorrer.
“O Brasil ainda não está perfeito nessa métrica (do tamanho da autonomia), mesmo com a lei do governo anterior. Ainda está aquém da média global”, avalia.
Autonomia total
A PEC 65 em discussão coloca que o Banco Central não se submeta mais às normas da legislação que vigora para ordenar a despesa pública.
Ou seja, em caso de autonomia total, o BC não faria mais parte do orçamento público nem se submeteria aos ditames do Tesouro Nacional e do governo federal.
Assim, a alegação de quem defende a PEC é que o vínculo do BC com o estado brasileiro pode impedir decisões mais técnicas.
Neste caso, o controle sobre o Banco Central não seria mais feito pelo CMN e os ministério.
O Congresso Nacional seria o responsável direto, auxiliado pelo TCU (Tribunal de Contas da União).
Além disso, é previsto controle interno do BC.
BC mais próximo do setor privado
A independência em relação ao governo pode abrir espaço para um aumento da interferência de interesses privados. A ponderação é de Simone, da Unicamp.
“A instituição não fica flutuando. Ela é influenciada por forças políticas, que estão sempre em conflito em relação à direção que deve ser tomada”, alerta a professora.
“Invariavelmente, a instituição estará mais sujeita às pressões do setor privado se ganhar autonomia em relação à tutela do governo”, complementa.
A influência do setor privado poderia significar decisões sobre juros, entre outras, enviesadas, diz a professora.
Isso por conta do aumento da influência de setores específicos e em detrimento da sociedade como um todo.
“A política monetária, como o nome diz, é política. E afastá-la da política econômica e da política mais ampla é uma contradição em termos, para dizer o mínimo”, arremata.
Revisão da autonomia operacional?
Se de um lado existe a possibilidade de aumento da autonomia, por outro, não há muita expectativa de um recuo no que foi garantido em 2021.
Ainda assim, os especialistas ressaltam que a conjuntura política e econômica pode eventualmente mudar a situação.
Porém, o cenário não indica isso.
Para Maria Luisa, da Nord, acabar com a lei ou alterá-la visando reduzir a autonomia do BC tem um custo político alto, o que torna qualquer mudança ainda mais improvável.
“Além disso, o resultado objetivo seria a elevação dos juros futuros”, complementa.
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