Cálculo aponta ‘gordura inexistente’ para tramitação do projeto que amplia isenção do Imposto de Renda

A ideia de que a equipe econômica incluiu uma “gordura” para ser queimada na tramitação da proposta de compensação à isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil por mês não se verifica, nos cálculos da Warren Renascença.
Usando dados do Imposto de Renda de Pessoa Física de 2023, a corretora estimou que a renúncia com a isenção chega a R$ 34 bilhões, sendo R$ 27,2 bilhões para a ampliação da faixa de isenção para R$ 5 mil, R$ 5,9 bilhões para descontos a quem ganha até R$ 7 mil e outros R$ 867 milhões em “transbordamentos” para outras faixas de renda.
Já o imposto mínimo traria uma receita de R$ 29,9 bilhões, mas R$ 8 bilhões seriam devolvidos em restituição. Somando outros R$ 7,6 bilhões em dividendos para o exterior, chega-se a uma soma de R$ 29,7 bilhões, ou R$ 4,3 bilhões a menos do que o montante a ser compensado.
“Com isso, reforça-se a necessidade de não haver desidratação da compensação no Congresso. Em nossas estimativas, a ‘gordura’ para alívio das medidas compensatórias é inexistente. Dada a incerteza envolvida nesses cálculos, nota-se que a ordem de grandeza das estimativas do Executivo parece plausível, mas sem compensação integral dos custos”, afirma a Warren, em nota assinada pelos economistas Felipe Salto, Josué Pellegrini e Gabriel Garrote.
Segundo projeções divulgadas pela Receita Federal na última terça-feira, o imposto mínimo de 2,5% a 10% para quem tem renda acima de R$ 600 mil por ano (R$ 50 mil por mês) irá arrecadar R$ 34,14 bilhões em 2026 e R$ 39,18 bilhões em 2027. São números superiores à previsão de renúncia com a isenção, de R$ 25,84 bilhões e 27,72 bilhões, respectivamente.
Essa sobra foi entendida por alguns como uma “gordura” para ser queimada durante a tramitação do projeto pelo Congresso, que já adiantou pretender promover alterações no texto.
Taxação de dividendos pode ser alterada
As contas apresentadas pelo governo para compensar a ampliação da isenção do Imposto de Renda à pessoa física não parecem apresentar “muita gordura”, o que eleva os riscos dos resultados após a tramitação do projeto no Congresso, diz Gabriel Leal de Barros, economista-chefe da ARX Investimentos.
Se, por um lado, a opção do governo de ampliar a isenção aumentando os descontos minimiza o impacto fiscal da medida, por outro, vai contra o livro-texto e a prática internacional, que indicaria uma atualização completa da tabela de IR, aponta o economista.
“Se usasse a sistemática tradicional, de corrigir as faixas do IR, a perda fiscal ficaria mais próxima de R$ 50 bilhões do que dos cerca de R$ 25 bilhões. A forma de fazer faz diferença. Conseguem minimizar a perda fiscal, mas não é uma reforma do imposto de renda tradicional”, afirma.
Ainda que não tenha acesso aos dados tão detalhados da Receita Federal, Leal de Barros afirma que a conta do governo para a perda de arrecadação com a medida parece “razoável”.
A conta para a compensação, porém, tem um grau de confiança bem menor, segundo Leal de Barros. “Na parte dos dividendos, a dificuldade é ainda maior, porque a abertura da Receita por nível de renda é muito pequena para fazer simulação. O grau de confiança para essa conta da receita com tributação até 10%, na minha opinião, é menor”, afirma.
Além disso, Leal de Barros diz existir uma “chance não desprezível” de ao menos a tributação sobre dividendos ser alterada durante a tramitação no Congresso, reduzindo a compensação fiscal. “E já não tem muita gordura”, afirma.
Haddad: Reforma do IR vai exigir mais debate com a sociedade
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse que a maioria dos projetos da área econômica no Congresso Nacional tem entendimento pacífico, mas reconheceu que a reforma nas regras do Imposto de Renda (IR), enviada esta semana, “vai exigir mais debate com a sociedade”.
Isso porque, repetiu o ministro, a Fazenda está sugerindo mexer “numa ferida histórica, que é os super-ricos não pagarem imposto”. “Essa distorção que queremos corrigir”, falou Haddad na chegada da sede do diretório nacional do Partido dos Trabalhadores, em Brasília.
Ele também repetiu que a proposta, que estabelece um imposto mínimo para quem ganha a partir de R$ 600 mil ao ano para isentar de pagamento de IR quem ganha até R$ 5 mil ao mês, é “bastante razoável”. “Estamos pedindo o mínimo de imposto. Estamos negociando com quem ganha mais de R$ 50 mil/mês e não paga [o mínimo]”, falou Haddad.
O ministro da Fazenda disse que espera se reunir com os presidentes da Câmara, Hugo Motta, e do Senado, Davi Alcolumbre, para definir o relator dessa matéria, para negociar eventuais mudanças no texto.
Com informações do Valor Econômico