Entenda o impacto que limitar ICMS sobre combustíveis pode provocar na economia

Há incógnitas sobre a efetividade da medida para reduzir preço ao consumidor

Custo bilionário: Governo estima que benefício temporário para caminhoneiro custaria R$ 4 bilhões. Ampliação do vale-gás teria impacto de R$ 2 bilhões Guito Moreto/Agência O GLOBO
Custo bilionário: Governo estima que benefício temporário para caminhoneiro custaria R$ 4 bilhões. Ampliação do vale-gás teria impacto de R$ 2 bilhões Guito Moreto/Agência O GLOBO

A redução das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre os preços dos combustíveis, anunciada pela maioria dos Estados brasileiros, é considerada como uma medida positiva para a economia, especialmente por abrir espaço para menos sonegação fiscal, já que uma alíquota menor desestimula atividades ligadas à evasão de impostos.

A análise é de especialistas ouvidos pelo Valor sobre o tema. Porém, os técnicos avaliam que a iniciativa é paliativa e há incógnitas sobre a efetividade. Isso porque ainda não acabou a guerra entre Ucrânia e Rússia. Esse último país é grande produtor de petróleo e um dos principais fornecedores mundiais dessa commodity, cuja cotação tem operado em patamar elevado, lembram os especialistas, devido a dúvidas sobre oferta no mercado global, visto que a Rússia opera hoje com restrições comerciais devido ao conflito – o que pode suscitar volatilidades nos preços de derivados de petróleo, em nível global.

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Para o economista Mauro Osório, diretor da Assessoria Fiscal da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), a menor alíquota do imposto é paliativa e retira recursos da saúde e da educação. Além disso, a decisão demonstra que a solução para os preços dos combustíveis não é definitiva, como deveria, da mesma forma que aconteceu no passado recente, com a necessidade de importação de respiradores para atender à maior demanda do equipamento na pandemia de covid-19.

Da mesma forma, o país está dependente da compra de fertilizantes no exterior por não ter uma produção internalizada, o que se repete novamente no segmento dos combustíveis, especialmente no de óleo diesel, que requer importação para completar a produção nacional a fim de atender à demanda.

“A redução do ICMS indica que o país precisa de uma solução estrutural, como a internalização da cadeia produtiva”, afirmou Osório. No Rio, a estimativa do governador fluminense é de que a menor alíquota de ICMS deve corresponder a uma queda de preço, nas bombas, de R$ 1,18 por litro. Em São Paulo, o imposto menor possibilitaria uma redução de até R$ 0,48 no litro da gasolina.

Por sua vez, o ex-diretor-geral da Agência Nacional de Petróleo (ANP) e atual presidente da Enauta (ex-Queiroz Galvão Exploração e Produção) Décio Oddone disse acreditar que a redução das alíquotas de ICMS vá se refletir, sim, em queda de preço dos combustíveis na bomba, ao consumidor. Ele reconheceu, porém, que parte dessa redução pode se perder ao longo da cadeia de suprimento, uma vez que pode haver alguns agentes, entre postos e distribuidoras, aproveitando as variações de preços para recompor margens de lucro.

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“Como os preços são livres, isso é possível, mas a solução, para reduzir esse risco, é a concorrência [quem oferece o produto mais barato tende a vender mais]”, observou.

Oddone vê como positiva a redução das alíquotas de ICMS pelos estados: “Acho positivo o estabelecimento de um ICMS fixo por litro em alíquota menor porque simplifica a cobrança e tira [parte da] volatilidade do preço”. Outro aspecto importante, ao se uniformizarem as alíquotas do imposto entre os Estados, é que se desestimula a sonegação, destacou. “Quando tem alíquotas diferentes entre os Estados, há estímulos à sonegação”.

Essa é a mesma avaliação do Instituto Combustível Legal (ICL). Para a entidade, é importante a busca de soluções estruturais que impliquem na redução da sonegação de impostos e inadimplência, ações que ultrapassam em perdas da ordem de R$ 14 bilhões por ano.

Considerando uma queda média de 10% nos preços dos combustíveis no país, o instituto espera que ocorra falta de interesse na irregularidade tributária com combustíveis, migrando para outras áreas onde há mais oportunidades de ganhar dinheiro ilegal, de acordo com o diretor-executivo do ICL, Carlo Faccio.

“A simplificação tributária é uma das linhas que ajudam a reduzir a sonegação tributária. Quanto maior é o tributo, maior é o interesse para buscar alternativas para não se recolher esse tributo”, afirmou Faccio. Ele reconhece que parte da atividade criminosa pode migrar para a adulteração dos combustíveis, já que essa atividade implica na adição de produtos muito mais baratos.

A decisão de reduzir as alíquotas de imposto sobre combustíveis foi delineada em um cenário onde o governo e Petrobras continuam embate em relação à política de preços da companhia. Como a petroleira tem efetuado reajustes de preços, nas refinarias, com base em prover paridade com o praticado no mercado internacional – conforme prevê sua política sobre o assunto -, o preço nos postos tem subido de forma expressiva, esse ano. A redução de imposto incidente sobre preço dos combustíveis foi uma das soluções propostas por governo federal e por Estados que anunciaram redução de alíquota de ICMS sobre o produto, para tentar reduzir o preço do item nas bombas, nos postos de gasolina.

Sobre esse tema, o governador do Rio de Janeiro Claudio Castro (PL), nesse sentido, afirmou que se a Petrobras voltar a aumentar preços de derivados de combustivel, o governo do Estado vai taxar a petroleira. Caso isso ocorra, explicou o deputado estadual Luiz Paulo Correa da Rocha (PSD), essa taxação extra viria do Repetro, regime especial para a indústria do petróleo que estabelece, no Rio, uma alíquota de 3% para operações de importação de plataformas e de “subsea” (estrutura subaquática para trazer o petróleo dos poços às plataformas). Além disso, segundo o deputado, o governador pode revogar o decreto, retornando às alíquotas antigas.

No Brasil, a lei complementar que permite a redução da alíquota entrou em vigor recentemente como forma de tentar baixar os preços. A nova lei dá tratamento de produto essencial para combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte público, limitando as alíquotas entre 17% e 18%. Com a ação, os governos estaduais, bem como o governo federal, esperam redução significativa dos preços dos combustíveis nas bombas. São Paulo reduziu a alíquota de ICMS de 25% para 18%, com perda de R$ 4 bilhões na arrecadação. Santa Catarina também taxava os combustíveis em 25%, passando agora a contar com alíquota de 17%, mesmo valor adotado pelo Espírito Santo.

Outros estados já anunciaram reduções, como Goiás e Minas Gerais. No domingo, o governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), disse que o Estado vai cumprir as regras da lei complementar, depois de ter criticado a proposta, considerando-a “ineficaz” e que não deve impactar de forma positiva para os consumidores, ao mesmo tempo que os estados perderão recursos para investimentos em áreas como saúde e educação, entre outras.

Para o ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, a resposta de queda da carga tributária à alta dos preços dos combustíveis foi correta. Em postagem em seu perfil no LinkedIn, no domingo à noite, o ministro disse que menos tributos reduzem o “peso morto” dos impostos e aumentam a eficiência econômica. “O preço dos combustíveis cai, o preço da energia cai e o consumidor fica com mais dinheiro no bolso”, afirmou Sachsida.

A previsão é de perda de arrecadação pelo governo capixaba é de R$ 1,14 bilhão. No Rio de Janeiro, um dos estados que já aderiram à alíquota de 18% para a gasolina, a queda deve representar uma perda de arrecadação de R$ 3,9 bilhões este ano, segundo estima o governador Cláudio Castro.

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