Trump de novo? O que esperar?

E mais: popularidade de Biden pode ser afetada pela elevação da inflação

Era algo que já parecia bastante provável. Agora está confirmado: Donald Trump será o candidato do partido Republicano nas eleições presidenciais de novembro nos Estados Unidos.

Na disputa contra Biden, as pesquisas vêm apontando há algum tempo o favoritismo de Trump, mesmo antes de sua confirmação. E uma reação de Biden nas pesquisas não parece provável considerando a baixa taxa de aprovação de seu governo, afetada pela inflação elevada (embora em queda) e apesar do bom momento da atividade econômica americana.

É útil, portanto, discutir o que esperar em caso de uma vitória de Trump, o cenário mais provável a essa altura. Para isso, vale lembrar que ele tem o protecionismo como sua característica fundamental, algo que certamente terá implicações para suas escolhas de políticas econômicas. 

Política fiscal

Comecemos pela política fiscal. Donald Trump tem em comum com Biden o fato de não demonstrar muita aversão a aumentos da dívida americana. A diferença maior entre eles parece ser que Trump prefere menos impostos, enquanto Biden privilegia aumentos de gastos.

Isso significa que Trump, se eleito, não seguirá propostas recentes dos democratas de aumentar impostos e ampliar a base tributária. Na contramão disso, ele deve buscar a extensão dos cortes de impostos sobre a renda pessoal que fez 2017 e que estão programados para expirar depois de 2025, além de ter mencionada mais cortes dos impostos sobre empresas.

Há também boas razões para não esperar que Trump reduza gastos, apesar de republicanos no Congresso demonstrarem certa aversão ao crescimento das despesas públicas. O motivo é que nos próximos anos haverá pressão para aumento de gastos por diversas razões, dentre elas o envelhecimento da população (que eleva gastos com saúde e seguridade) e o atual ambiente geopolítico bastante conflituoso (que pressiona gastos militares).

Relacionado ao tema geopolítico, os atuais conflitos comerciais entre países, já bastante intensos, devem ganhar força com a volta de Trump. Nessa linha, Trump indicou que pretende impor tarifas de 60% ou mais sobre produtos manufaturados chineses.

Mudanças com Trump

Como na “guerra comercial” anterior, esse novo confronto dificilmente promoverá a reindustrialização americana, como almeja Donald Trump. Afinal, não apenas preços de bens finais importados subiriam, mas também os de insumos (bens intermediários) importados, o que encareceria os produtos americanos também. Além disso, é certo que haverá retaliação, como fizeram China e Europa na versão anterior da guerra comercial. 

Outras possíveis mudanças que merecem menção:

  • Trump deve tentar cumprir sua promessa de ter energia mais barata nos EUA, para isso deixando de subsidiar uma “transição verde” e voltando a estimular a produção de combustíveis fósseis, especialmente petróleo e gás.
  • Uma menor regulação ambiental (ligada ao ponto anterior) e financeira é outra promessa de Trump, embora não haja clareza dos detalhes aqui.

Consequências

E quais são as principais consequências de tudo isso?

A mais clara implicação é que novos níveis de desarranjo nas relações internacionais (comerciais e de outra natureza) devem ser atingidos, impulsionando a tendência recente de “desglobalização”.

Mas teremos redução do déficit comercial americano? Provavelmente não. A teoria econômica indica que a imposição de tarifas tende a diminuir a demanda por importações e, portanto, por moeda estrangeira. Isso tende a fortalecer o dólar, o que compensa a elevação de tarifas e impede ganhos comerciais.

Pela mesma razão, não se deve esperar que a elevação de tarifas gere uma alta da inflação doméstica, já que um dólar mais apreciado evitaria tal efeito.

Na outra direção, também não se deve esperar grande queda da inflação devido ao objetivo de Donald Trump de diminuir preços de energia. Afinal, prometer menores preços não é a melhor estratégia para obter mais investimentos no setor, especialmente quando nos EUA a produção de petróleo está em níveis recordes e há excesso de produção de gás natural.

Trump e Fed

Dito tudo isto, a postura de Trump com relação ao banco central americano (Fed) será bastante decisiva para o cenário de inflação.

Em seu primeiro mandato, Donald Trump não poupou críticas ao presidente do Fed, Jerome Powell (indicado por ele!). Agora com um grau de endividamento público maior, que pressiona o juros americano, a pressão por uma política monetária mais frouxa tende a ser ainda mais intensa.

Como da primeira vez, Powell não deve mudar a condução da política monetária por pressões externas. Só que seu mandato termina em maio de 2026 e Trump pode então tentar indicar alguém alinhado com suas ambições, o que precisa de aprovação do Congresso.

Um banco central mais politizado representaria um risco real para a inflação americana. Aqui seria útil aprender com a experiência de Biden: a popularidade do presidente americano pode ser muito afetada pela elevação da inflação. Resta saber se esta lição será aprendida ou não por Trump, caso seja eleito.