Qual é a relação entre emprego, salário e inflação? E como você pode usar tudo isso a favor dos seus investimentos?

Curva de Philips mostra como esses três elementos interferem na sua vida financeira

Quem acompanha as notícias de economia já deve ter reparado que sempre que é falado sobre a inflação, menciona-se a taxa de emprego e o salário médio do brasileiro. Mas, afinal de contas, qual é a relação entre esses três elementos (inflação, emprego, salário)? Um spoiler: uma dessas ligações envolve a chamada Curva de Philips.

Vamos explicar, em detalhes, sobre essa teoria logo abaixo. Mas antes, é importante saber por que a inflação é tão importante para a economia e para o seu bolso.

Poder de compra

Então, basicamente, a inflação é um aumento contínuo e generalizado de níveis de preço. “É um indicador social importante para a economia. Por isso, a primeira coisa é que a inflação é nociva para a economia e para o poder de compra dos consumidores. Já que a inflação afeta o quanto o dinheiro vale”, explica Rubens Moura, professor de ciências econômicas da Faculdade Presbiteriana Mackenzie.

Portanto, a taxa é tema importante para a economia porque, quando ela está elevada, pode gerar incerteza no mercado e levar à redução dos níveis de investimento.

“Na prática, a inflação faz com que o dinheiro do consumidor passe a valer menos. O que significa que a mesma quantia possibilita a aquisição de uma quantidade menor de bens e serviços. E isso reduz o poder de compra da população e pode impactar negativamente o bem-estar econômico geral. Além disso, a alta inflação pode levar a um ambiente econômico instável, dificultando o planejamento de longo prazo para empresas e consumidores”, comenta Luciana Maia Campos Machado, superintendente acadêmica e professora de finanças da FIPECAFI.

Além disso, a inflação alta também afeta o custo da dívida pública. Isso porque os agentes que compram os títulos do governo só continuarão comprando-os se esses incluírem um prêmio que compense as incertezas associadas com a inflação mais alta.

“Dessa maneira, diante de um cenário de inflação crescente, o governo vê reduzida a sua capacidade de se financiar via endividamento e se depara com maiores custos da dívida. E isso prejudica o investimento em áreas relevantes para o crescimento econômico, como saúde, educação e infraestrutura, por exemplo”, afirma Alex Nery, professor da FIA Business School.

Aumento dos preços ao longo dos anos

Fato é que analisar a inflação acumulada nos oferece uma visão clara do impacto do aumento de preços em um período mais extenso. O que revela como a inflação pode corroer o valor do dinheiro ao longo dos anos.

“Isso enfatiza a importância de proteger suas economias contra a inflação, pois deixar de fazê-lo pode resultar em uma perda significativa de poder de compra. Sem uma estratégia para compensar as perdas inflacionárias, o valor real de suas economias diminui, comprometendo sua capacidade de adquirir bens e serviços no futuro”, analisa Luciana.

No gráfico abaixo, é possível ver a inflação dos últimos 10 anos, de abril de 2014 a abril de 2024. No período, a inflação acumulada foi de 81%. Isso mostra como os preços aumentaram significativamente ao longo de uma década. Acompanhe:

Fonte: elaborado com dados do IBGE

Inflação em baixa também é problema

Por outro lado, quando a taxa está negativa, ou seja, em deflação, ela pode prejudicar o funcionamento da economia. “Quem vende o produto poderá ter prejuízo se os preços diminuírem, pois irá ganhar menos na venda de um estoque já realizado quando os preços estavam mais altos”, diz o professor.

Então, quem adquire o produto pode deixar de comprar hoje na esperança de que no futuro o preço esteja menor. Com isso, investimento e consumo podem reduzir, impactando negativamente o crescimento da economia.

“Portanto, para uma economia saudável, o ideal é manter a inflação em um nível estável e controlado, impedindo que os preços subam ou desçam de maneira imprevisível”, conta Nery.

Curva de Philips: taxa de emprego versus inflação

Como você percebeu, então, essa relação do emprego com a inflação é um aspecto importante da economia e começou a ser estudada já na década de 1920. Porém, foi o economista A. W. Phillips que desenvolveu em 1958 um diagrama que estabeleceu uma relação entre a inflação e a taxa de desemprego no Reino Unido, ano a ano, no período compreendido entre 1861 e 1957.

“Com base nesse trabalho, Phillips observou uma relação inversa entre inflação e desemprego no curto prazo. Ou seja, quando o desemprego subia, a inflação baixava, e vice-versa”. E foi assim que foi criada a chamada Curva de Philips.

Mas por que isso ocorre? “Quando muitas pessoas estão empregadas, há mais dinheiro circulando. Com mais dinheiro circulando, a demanda por bens e serviços aumenta. Se a demanda aumenta mais rápido que a oferta, os preços tendem a subir. O que resulta em inflação. Do outro lado, quando poucas pessoas estão empregadas, menos dinheiro está sendo gasto. Com menor demanda por bens e serviços, os preços tendem a crescer mais lentamente, o que reduz a inflação”, explica Luciana.

Salário versus inflação

Bem, agora que você já sabe como funciona a Curva de Philips, vale entender que, de certa forma, a relação do salário médio com a inflação é bem parecida com a teoria mencionada. Então, em geral, o aumento do salário médio resulta no maior poder de compra dos consumidores e, consequentemente, em aumento do consumo por bens e serviços.

“E aí, com uma maior demanda por seus produtos e os aumentos nos custos de produção decorrentes dos salários mais altos, os empresários tendem a elevar os preços das mercadorias. O que pressiona os índices de inflação. Diante da elevação da taxa, o poder de compra dos salários diminui. E para manter o padrão de vida, os trabalhadores podem exigir novos aumentos salariais, num círculo que tende a retroalimentar o processo inflacionário”, conta Alex Nery.

Para se ter uma ideia, de acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), atualmente o salário médio no Brasil é de R$ 3.118 por mês. Já no último Boletim Focus, a expectativa de inflação é de 3,80% ao ano.

“No início do ano, com R$ 3.118, uma pessoa poderia comprar um certo conjunto de bens e serviços. Mas, ao final do ano, para comprar o mesmo conjunto de bens e serviços, essa pessoa precisaria de aproximadamente R$ 3.237,48. Então, se o salário dessa pessoa não aumentar para pelo menos R$ 3.237,48, ela terá que cortar gastos ou comprar menos, porque o poder de compra diminuiu devido ao aumento dos preços causado pela inflação”, afirma Luciana Maia Campos Machado.

Informalidade atrapalha relação salário e inflação

Por outro lado, de acordo com Nery, a teoria estabelece essa relação para situações nas quais a economia está em pleno emprego. Ou seja, quando o desemprego efetivo se encontra na sua taxa natural.

“Mas embora as taxas de desocupação no Brasil estejam se reduzindo ao longo dos últimos anos, com a média móvel da taxa de desocupação em 7,75% da força de trabalho em março de 2024 contra 8,49% de maio de 2023, não há consenso se a economia brasileira está em pleno emprego. Além disso, o trabalho informal e baixa produtividade do trabalho são fatores que prejudicam a aplicação mecânica da relação entre salário/inflação para o caso brasileiro”, afirma. 

Como o investidor pode usar a Curva de Philips a seu favor?

A relação entre emprego, salário e inflação mexe com a roda da economia. E pode ainda influenciar os investimentos. Mas veja: de uma forma positiva. Ajudando a planejar estratégias de investimento e reduzir o risco da carteira.

“Quando a taxa de emprego é alta e a inflação está subindo, os investidores podem ajustar suas carteiras para incluir ativos que se valorizam em ambientes inflacionários. E aí estamos falando de ações de empresas com poder de precificação e títulos de renda fixa atrelados à inflação, como o Tesouro IPCA+ no Brasil. Investir em imóveis também pode ser vantajoso, pois os preços dos imóveis e os aluguéis tendem a subir com a inflação”, comenta Luciana.

Já quando a inflação aumenta e os salários não acompanham, o poder de compra dos consumidores diminui. E isso pode levar a uma queda na demanda por bens e serviços. O que afeta negativamente as empresas que dependem do consumo doméstico.

“Investidores podem antecipar essa dinâmica e ajustar suas estratégias de investimento para proteger o capital. Ações de empresas com poder de precificação, especialmente nos setores de consumo básico, energia e saúde, tendem a ser boas escolhas”, afirma a professora da FIPECAFI.

Além disso, diversificar portfólios internacionalmente, investindo em ativos denominados em moedas fortes como o dólar ou o euro, pode proteger contra a inflação doméstica. “Embora mercados emergentes possam oferecer crescimento, eles também trazem maior volatilidade e risco inflacionário. Setores como tecnologia e saúde, que têm demanda relativamente inelástica, podem oferecer proteção durante diferentes ciclos econômicos. Investimentos em commodities como ouro e petróleo também podem se beneficiar em períodos de alta inflação”, finaliza a especialista.

Então, agora é com você, investidor e investidora. Fique atento à Curva de Philips e às relações com a inflação e use tudo isso a seu favor.