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Por que o Banco Central se preocupa tanto com a taxa de juros de equilíbrio?
Lembro de anos atrás, numa noite de segunda-feira, quando me preparava para mais uma aula de economia para a turma de finanças. Decidi que aquele dia seria especial. Não íamos simplesmente falar sobre inflação, desemprego e taxa de juros. Não. Queríamos mergulhar no coração das decisões que os bancos centrais tomam para manter uma economia saudável — ou, pelo menos, tentar.
Banco Central e juros de equilíbrio
Com a sala cheia, comecei lançando uma pergunta para aquecer os motores: “Por que o Banco Central se preocupa tanto com uma coisa chamada taxa de juros de equilíbrio?” Alguns alunos franziram a testa, mas outros já conheciam bem o tema e arriscaram respostas. Fomos aprofundando, até que chegamos ao ponto onde as peças se encaixam.
“A taxa de juros de equilíbrio”, comecei, “é como a velocidade ideal do vento para o barco. Nem tão fraca que ele quase não se move, nem tão forte que o barco fique fora de controle. Uma taxa onde a economia pode navegar sem turbulências, sem gerar mais inflação do que o desejado, nem deixar a economia estagnada.”
A essa altura, já tinha a atenção deles. “Imaginem um barco velejando e o capitão ajustando as velas para aproveitar o vento na medida certa, ou mesmo jogando âncoras para manter o barco em controle nas tempestades. Esse capitão é o banco central, e suas velas e âncoras são a taxa de juros.”
A teoria da taxa de equilíbrio do Banco Central
Claro, o problema é que essa taxa de equilíbrio que o Banco Central busca não está impressa em lugar nenhum. Ela é teórica, uma linha tênue que os bancos centrais perseguem com base em dados e previsões. Ninguém sabe ao certo onde ela está, mas todos sabem que, se errarmos muito, o barco vira.
Com a deixa da taxa de juros de equilíbrio, apresentei a Regra de Taylor.
“Vocês já ouviram falar do John Taylor?”
Neste assunto de Banco Central e juros, alguns alunos balançaram a cabeça, outros pareciam intrigados. Expliquei que Taylor tinha criado uma regra prática para ajudar os capitães das economias — os banqueiros centrais — a não perderem a mão.
“Se a inflação está acima da meta, Taylor sugere que é preciso frear, ou seja, fechar as velas, ou até lançar âncoras para reduzir a velocidade. Se a economia está fria e o barco muito lento, então é hora de abrir as velas, permitindo que o vento (ou, no caso, o crédito) impulsione o crescimento.”
O brilho nos olhos deles me dizia que o exemplo do barco funcionava bem.
PIB potencial
Logo, fomos além. Introduzi o conceito de PIB potencial. “Esse é o verdadeiro ‘norte’ do capitão”, expliquei. “É o máximo de velocidade que o barco pode alcançar sem se desgastar demais.”
O PIB potencial representa a capacidade máxima de uma economia produzir de forma sustentável, usando plenamente seus recursos, como uma espécie de linha de chegada teórica que, na prática, raramente alcançamos.
“E onde entra a famosa Curva de Phillips?” — perguntei. No quadro, desenhei uma curva decrescente entre inflação e desemprego. Expliquei que, no curto prazo, economias aquecidas tendem a reduzir o desemprego, mas elevam a inflação. Uma economia mais fria, ao contrário, reduz a pressão inflacionária, mas deixa trabalhadores ociosos.
Alguns estudantes entenderam o recado: “É uma relação delicada”, comentou uma aluna do fundo. Sim, concordei. E assim, o trabalho do banco central é justamente equilibrar esses dois fatores.
Taxa de desemprego
Nesse momento não foi difícil introduzir o conceito de NAIRU — a taxa de desemprego que não acelera a inflação (Non Acceleting Inflation Rate of Unemployment).
“Pensem na NAIRU como um ponto de equilíbrio para o mercado de trabalho. Se o desemprego ficar abaixo dela, os salários começam a subir rápido demais, e a inflação também. Mas se o desemprego ficar acima, a economia está desperdiçando recursos, embora a inflação tenda a cair.”
Economia é como um mapa sem rotas definidas
A turma já estava absorvida na conversa sobre Banco Central e juros. “Então, professor, todo o trabalho do Banco Central é seguir essa bússola?”, alguém perguntou.
E eu sorri. “Em teoria, sim, mas a economia é mais como um mapa sem rotas definidas. O banco central tem um objetivo, mas ele não tem certeza absoluta de onde fica o ‘equilíbrio’. Então ele navega a partir de estimativas, de experiências passadas e do que as curvas nos dizem.”
O valor da intuição
Para encerrar, soltei um último desafio: “Lembrem-se, todos esses conceitos – Phillips, Taylor, NAIRU, PIB potencial – são ferramentas, mas o capitão ainda precisa do instinto. Afinal, no meio de uma tempestade, é preciso ter um pouco de intuição para não deixar o barco à deriva.”
E com isso, encerramos a aula sobre Banco Central e juros. Ao sair, percebi que essa turma talvez tivesse aprendido mais do que as fórmulas e teorias. Com sorte, entenderiam que a economia é um desafio constante de navegar no desconhecido, guiando-se por uma mistura de ciência, arte e até uma pitada de sorte.
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