Análise: Melhora no mercado de trabalho surpreende e governo eleva projeção

Leitura na área econômica é que o ritmo de geração de postos deve seguir intenso ao longo dos próximos meses, diz Fabio Graner, do JOTA

Carteira de trabalho (Foto: Pixabay)
Carteira de trabalho (Foto: Pixabay)

O governo trabalha com um crescimento de 9,5% no total de trabalhadores ocupados neste ano. A mais recente projeção do Ministério da Economia é um ponto percentual acima do que a pasta estimava há dois meses. E tem sido comum ouvir nos corredores do bloco P da Esplanada que o total de trabalhadores empregados vai chegar na marca de 100 milhões.

A revisão recente reflete muito mais o que já ocorreu ao longo deste ano. O ritmo de geração de vagas e a queda no índice de desemprego, que já se aproxima da média histórica, tem surpreendido até o governo, que vinha desde 2021 apontando que o mercado de trabalho teria um desempenho melhor que o esperado pelos analistas do sistema financeiro.

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Nesse sentido, vale lembrar que o mercado, conforme a pesquisa Focus, do Banco Central, iniciou o ano projetando um desemprego de 11,8% no ano e agora está com 9,9% – número que já está em linha com os 9,8% apontados pelo IBGE no trimestre encerrado em maio (em torno de 9,5% com ajuste sazonal, aquele que retira os efeitos típicos de cada período). Há pouco mais de um ano, o IBGE mostrava uma desocupação de quase 15%, um quadro dramático legado pela pandemia.

Olhando para frente, a leitura na área econômica é que o ritmo de geração de postos deve seguir intenso ao longo dos próximos meses, ainda que em menor ritmo do que foi visto na primeira metade de 2022.

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Uma fonte explica que o principal determinante para esse desempenho é o setor de serviços, impulsionado pela normalização das atividades pós-pandemia, processo que vem em curso desde o fim do ano passado. Esse interlocutor aponta que os números do mercado de trabalho são ao mesmo tempo causa e consequência do desempenho mais favorável da economia como um todo, que tem empurrado as projeções para o PIB para cima há várias semanas. O próprio governo elevou sua estimativa para o conjunto de riquezas produzidas no país para alta de 2%. E muitas casas no mercado financeiro estão indo na mesma direção.

O economista-sênior da LCA Consultores e pesquisador associado do Ibre, Braulio Borges, tem estudado com mais afinco essas surpresas do mercado de trabalho. Segundo ele, a composição do crescimento econômico recente, com maior peso de setores intensivos em mão de obra (como serviços), ajuda a entender o que está acontecendo. Mesmo assim, reconhece, o saldo é mais favorável do que se esperava para o nível de expansão do PIB brasileiro.

“De fato, 55,6% do fluxo de novas ocupações criadas nos últimos 12 meses (ou seja, 5,21 milhões de um total de 9,38 milhões, na comparação mai-mar/22 vs mai-mar/21) adveio dos segmentos de comércio, construção civil, outros serviços e serviços domésticos – que também são aqueles com as menores produtividades do trabalho e salários médios dentre os grandes setores. A título de comparação, no acumulado de 2017 a 2019 esses mesmos setores foram responsáveis por 49% do fluxo de novas ocupações geradas no Brasil”, disse Borges, em análise recente no blog do Ibre.

“Em 2013 (ano imediatamente anterior à recessão de 2014-16), tais setores responderam por 15% das ocupações criadas. Essa composição setorial do emprego desde meados de 2021 ajuda a compreender por que, a despeito da taxa de desemprego ter recuado quase 5 p.p. nesse ínterim, o rendimento médio real caiu expressivamente no mesmo período, atingindo os menores níveis desde 2012”, completou.

A partir desse comportamento surpreendente, o economista também provoca a discussão sobre qual seria a taxa natural de desemprego do país e se a economia doméstica já estaria encontrando esse nível. A taxa natural é aquela que não acelera a inflação. Ponderando com fatores como o rendimento real, Borges reestimou sua conta para esse indicador, apontando que ele estaria em 8,5% (antes ele trabalhava com 9,5%, que foi a média dos últimos 25 anos) da população economicamente ativa.

Assim, explica Borges, apesar de estar em alta, o mercado de trabalho ainda não seria um fator de pressão inflacionária e teria um espaço para continuar crescendo sem estimular reajustes de preços por algum tempo.

No governo, evita-se falar qual seria a taxa natural de desemprego. Mas também há uma avaliação de que ainda há ociosidade presente e esse não deve ser um fator a prejudicar o combate à inflação no curto prazo.

Na área econômica, apesar do cenário ser de continuidade de geração de bom número de vagas, admite-se que o principal risco para isso é um quadro recessivo agudo no mundo se materializar. Não é a expectativa central, mas é um risco que existe, dado os níveis insistentemente altos da inflação nos Estados Unidos e Europa.

(Por Fabio Graner, analista de economia do JOTA em Brasília)
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