Com venda incerta, Braskem terá novo comando em 2023

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A Braskem, maior fabricante de resinas termoplásticas das Américas, terá novo comando a partir de janeiro. Após três anos, o presidente Roberto Simões será sucedido por um colega de Novonor (antiga Odebrecht) e ex-executivo da petroquímica, Roberto Bischoff. A troca no comando foi antecipada pelo colunista Lauro Jardim, de “O Globo”, no domingo (27).
A percepção de que o processo de venda da Braskem se torna mais incerto com a mudança de governo e de comando na Petrobras, o agravamento do ciclo de baixa da petroquímica global projetado para 2023 e desgastes com a Novonor (controladora) compõem o pano de fundo para a decisão, em comum acordo, de substituição da presidência da companhia, apurou o Valor.
A notícia de transição na liderança da Braskem vem em um momento desafiador para a indústria petroquímica no mundo e de incertezas crescentes quanto à venda da companhia, que está subavaliada em bolsa e pelos potenciais compradores, na visão de seus principais acionistas. Segundo fontes próximas ao grupo, assuntos relacionados à venda e a elevada remuneração do comando da Braskem teriam contribuído para desgastes entre a cúpula da Novonor e Simões.
Em comunicado aos funcionários da petroquímica, ao qual o Valor teve acesso, a Novonor informou que Simões deixará tanto a presidência quanto o assento que ocupa no conselho de administração em 31 de dezembro. “Esta decisão ocorre em comum acordo entre as partes e Roberto seguirá outros projetos pessoais”, afirma o documento, lembrando que, sob a gestão do executivo, a Braskem registrou resultados históricos.
De fato, a petroquímica nunca distribuiu tantos dividendos quanto no ano passado: foram mais de R$ 7,35 bilhões, na esteira do desempenho operacional e financeiro recorde. A própria Novonor foi uma das grandes beneficiadas pelo bom momento da Braskem, que soube surfar com competência o ciclo de alta da petroquímica global e beneficiar-se de spreads históricos.
O momento do setor, contudo, mudou drasticamente e os números da Braskem no terceiro trimestre deram mostras do estrago que a correção nos spreads petroquímicos – a diferença de preços entre produto e sua principal matéria-prima – é capaz de provocar. Para 2023, o cenário é ainda mais crítico, particularmente no polietileno (PE), com a entrada de novas capacidades.
Como tradicionalmente ocorre, quanto pior o ciclo, maior a pressão sobre os CEOs. Nesse ambiente, segundo uma fonte, a elevada remuneração do comando da Braskem gerou mal-estar dentro da Novonor, que está em recuperação judicial. O nome do executivo figurou na lista dos 10 CEOs mais bem pagos no Brasil, com R$ 24 milhões em 2021.
Além do contexto operacional desafiador, o processo de venda da Braskem tende a esbarrar em mais um obstáculo com a troca na presidência da Petrobras e a vitória do PT nas eleições presidenciais. Sob um governo petista e com viés claramente nacionalista no que tange a recursos estratégicos, é improvável que a estatal siga em frente com o plano de também vender suas ações, inviabilizando a proposta de compra de 100% da petroquímica feita pela gestora Apollo – a preferida por alguns credores de peso da Novonor.
A chegada de Simões à Braskem, no início de 2020, visou justamente a arrumar a casa e destravar valor da empresa, cujos múltiplos seguem abaixo dos negociados por suas pares globais, enquanto a Novonor retomava o processo de venda de suas ações.
As consequências do evento geológico em Alagoas, que trouxe um passivo de mais de R$ 10 bilhões à petroquímica, foram controladas, um corte de fornecimento de matéria-prima à Braskem Idesa no México foi rapidamente contornado e a Braskem retomou nota de crédito grau de investimento. Mas esses avanços não se refletiram em ofertas de compra mais justas, comentou outra fonte.
Ao mesmo tempo, o próprio executivo já havia indicado que não planejava permanecer à frente da petroquímica por longa data. A ideia era arrumar a casa e alçar outros voos, e esse ciclo já teria sido cumprido na visão de Simões. As conversas sobre sucessão começaram a ocorrer há dois ou três meses, disse uma fonte.
Sob seu comando, a Braskem definiu o planejamento estratégico para 2023: otimizar os ativos existentes e gerar caixa para atravessar o ciclo de baixa e crescer em biopolímeros e renováveis. Caberá a Bischoff, que foi para a presidência da Ocyan em 2019 justamente no lugar de Simões, executá-lo.
Formado em engenharia mecânica, Bischoff teve longa passagem pela Braskem entre 1979 e 2019, e participou de projetos relevantes, entre os quais a implantação da Braskem Idesa. Sua indicação ainda será votada pelo conselho de administração. Simões, que antes de assumir o cargo também comandou a Ocyan, liderou a empresa por três anos. Em 2021, a Braskem teve resultado operacional (Ebitda) recorde, de R$ 30,3 bilhões.
Por Stella Fontes