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O que acontece com o Barcelona serve de alerta para os clubes brasileiros
Era uma vez um clube global, gigante. Por mais de uma temporada, ele a maior receita do futebol mundial. Teve craques inquestionáveis, era sonho de desejo de qualquer jovem atleta, suas camisas estavam espalhadas por garotos mundo a fora. Tudo parecia perfeito, até que deixou de ser. Se as palavras acima não deixaram claro, estamos falando do Barcelona.
Estamos na temporada 2024/2025, e desde que a situação financeira desastrosa do Barcelona veio à tona, já se foram 4 temporadas e estamos entrando na 5ª.
Buraco financeiro do Barcelona
Desde então, o clube que era referência em campo, com camisas recentemente vestidas por Ronaldinho Gaúcho, Neymar e Messi, luta para solucionar o buraco financeiro em que se enfiou. Isso limita a gestão do futebol, com altos gastos com salários e contratações.
Recapitulando, os números do período que pré e pós-crise deflagrada são os seguintes:
Milhões de € | 2019/20 | 2020/21 | 2021/22 |
Receitas | 729 | 590 | 639 |
Custos com pessoal | (487) | (490) | (457) |
Outros custos e despesas | (224) | (276) | (200) |
EBITDA | 18 | (176) | (17) |
Resultado Líquido | (101) | (481) | 98 |
O que aconteceu com o Barcelona?
Desde a temporada 2019/2020 o clube catalão rodava com EBITDA (diferença entre as receitas e os custos e despesas caixa) perto de zero. E, a partir de 2020/21, negativo.
A queda de receitas em 2020/21 tem relação com a pandemia, que retirou receitas e foi o estopim de um problema que existia, mas estava escondido.
Vale lembrar, por exemplo, que em 2017, quando Neymar foi vendido por € 222 milhões, o resultado líquido da temporada foi de apenas € 30 milhões de lucro.
Um erro, pois uma receita extraordinária como essa deveria ter um saldo maior. Isso que mostra que o dinheiro foi para gastos correntes.
O caos no Barcelona
Salários altos, muitas contratações, a certeza de que nenhuma sanção de fair play financeiro aconteceria para um dos clubes que carrega o futebol espanhol. De certa forma, o futebol europeu também com orçamentos que projetavam receitas de € 1 bilhão, nunca cumpridas, levaram a este caos.
Aliás, caos é uma boa definição para um clube que mostrou que a governança corporativa e organização dependem mais das pessoas que dos processos.
Entre 2003 e 2008 o responsável financeiro do Barcelona era Ferran Soriano, autor do famoso livro “A bola não entra por acaso”, publicado em 2008. Ele contava como uma boa gestão fora de campo justifica bons vitórias dentro de campo.
Parece que as orientações não acontecerão com sua saída. Pessoas são mais importantes que processos.
Dívida bilionária em euros
Mas, voltando ao cenário pós-crise, o clube teve que tomar ações para estancar o problema e levantar dinheiro para solucioná-lo. A dívida em 2020/2021 era de € 1,15 bilhão, para uma receita de € 590 milhões (efeito pandemia), mas que em curso normal seria de algo como € 700 milhões. Daria 1,64 vezes as receitas usuais.
Solução para o Barcelona
Com um clube que gastava muito mais do que arrecadava, essa dívida é monstruosa e impagável. A solução? O que toda empresa em crise faz: alongar dívidas e vender ativos.
Conseguiu alongar € 600 milhões com a Goldman Sachs e vendeu um monte de coisas: 40% das receitas futuras de TV da LaLiga, 49% da Braça TV um projeto ainda greenfield e outras movimentações que resultaram num total de € 787 milhões em 2 anos. Mas, curiosamente, no lugar de pagar dívidas, o clube usou os recursos para aumentar sua capacidade de gastos salariais.
A LaLiga, em seu modelo de fair play financeiro, calcula o limite máximo de gastos com salários e contratações que um clube pode ter a partir das suas receitas.
O Barcelona usou as receitas de venda de ativos para turbinar o total e poder contratar, numa manobra aceita pela LaLiga, pois na temporada chegaram Lewandovski, Raphinha e Kounde.
O que isso tudo te lembra?
Torcedor, isso lembra o comportamento de clubes de algum país conhecido?
As vendas de ativos permitiram manter os gastos salariais em cerca de € 600 milhões, mas passado seu efeito, o limite voltou a € 200 milhões, sendo que o clube gastou em 2022/2023 € 490 milhões com salários. Coloque na conta as chegadas de “atletas livres”, como Gundogan e a contratação de Vitor Roque (€ 30 milhões). “Vida Loka catalã”.
E para “melhorar”, ainda tem mais cerca de € 1,5 bi em dívidas relacionadas à reforma do Camp Nou.
Cortes de gastos devem existir, e, por isso, Vitor Roque não está na LaLiga e precisa sair. Ainda assim, o clube sonha com as contratações de Dani Olmo e Nico Willians, numa total falta de entendimento da realidade.
O que o Barcelona fez
Aliás, é na realidade virtual que o Barcelona busca uma nova saída para seguir empurrando o problema com a barriga. Além de vender outros jogadores promissores da base, o clube de Laporte, atual presidente, criou a Barça Vision, uma empresa para explorar “web3, NFTs e multiverso”, que supostamente estaria avaliada em € 1 bilhão e pronta para abrir capital na Nasdaq.
Obviamente a operação pensada não deu certo, e agora o clube busca nos parceiros comerciais alguém que resolva apostar na ideia, que tem entre seus produtos um podcast com Laporta, o presidente. Genial.
Eis que a empresa que cuida do catering do complexo do Barcelona, a Aramark, virou acionista do projeto Barça Vision, e a participação está estimada em € 40 milhões, valores que cobrem a falta de pagamento de um dos investidores da Barça Midia, que inclui a Barça TV.
Ou seja, o clube catalão segue montando seu castelo de cartas, vendendo almoço para comprar um pãozinho para o café da manhã do dia seguinte, porque não dá nem para o jantar de hoje.
Resumo dessa história
Ao longo do texto, onde está escrito “Barcelona”, faça um exercício sério e troque o nome para “Meu Time do Coração”. Veja se há semelhanças, como promessa de receitas estratosféricas, dívidas elevadas e impagáveis, contratações infinitas e descaso total com a responsabilidade financeira.
O futuro do Barcelona é cada vez mais incerto.
Mesmo com um estádio novo, que ajudará a recompor receitas, quase todos os anéis se foram, e o problema permanece.
Enquanto isso, outros clubes globais se ajustam, crescem, conquistam, o Real Madrid e o Atlético de Madrid se preparam para o futuro.
Que no caso do Barça, e de muitos clubes brasileiros, poderá ser apenas um quadro amarelado pendurado na parede.
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