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Disputa entre comprados e vendidos: por dentro da disparada das ações da Ambipar (AMBP3)
Uma disputa entre comprados e vendidos na bolsa vem chamando a atenção no mercado financeiro. Nela, os comprados estão levando a melhor, porque estão concentrados em três forças poderosas: a própria empresa, a Ambipar (AMBP3); o controlador, Tércio Borlenghi Júnior; e uma gestora que pretende assumir um assento no conselho de administração, a Trustee DTVM.
Então, o resultado desse jogo de poder é uma impressionante alta de R$ 8,07 em 31 de maio para R$ 76,30 em 6 de agosto. Sendo que somente em julho a valorização foi de 291%.
Todos os demais números são superlativos. A média diária de negociação na B3 subiu de R$ 15,6 milhões em maio a R$ 171,8 milhões no mês passado e da taxa de aluguel, de 3,17% ao ano para 181,71% no período, segundo levantamento feito por Einar Rivero, sócio-fundador da Elos Ayta Consultoria, a pedido do Valor.
AMBP3: um caso de short squeeze?
Enrico Cozzolino, sócio e chefe da área de análise da Levante Investimentos, explica que é um caso clássico de “short squeeze”, movimento anormal que faz com que os preços de um ativo disparem.
As ações da Ambipar vinham sofrendo desvalorização significativa desde 2022, após um agressivo programa de aquisições de empresas – 42 desde 2020, ano em que estreou na bolsa – que elevou o endividamento e reduziu o lucro líquido. Em 2022, a queda foi de 22,8% e, em 2023, de 44,65%.
Daniel Nogueira, coordenador de distribuição da InvestSmart, conta que a aposta entre investidores era de que a empresa teria que rever sua estrutura de capital e de que os papéis continuariam caindo, o que levou a um grande volume de aluguel de ações.
A operação de aluguel acontece quando o investidor acredita que o preço de uma ação vai cair mas não tem o papel. Então ele aluga e paga uma taxa por isso. Ao fim do contrato ele tem que devolver as ações ao dono original. Como ele espera que o preço caia, o ganho acontece quando compra o papel mais barato do que vendeu, para devolver.
Recompra de ações
No fim de maio, a empresa anunciou que se comprometia a reduzir a alavancagem (relação dívida/Ebitda, o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização), que está em torno de 3 vezes, para 2,5 vezes, até metade de 2025, sem realizar novas aquisições.
Para a receita líquida, a empresa fixou a meta de crescimento de 10% até 31 de dezembro de 2024. E, em 3 de junho, iniciou um programa de recompra de até 20,8 milhões de ações, equivalente a 37,35% dos ativos em circulação, o chamado “free float”, a R$ 8,07, considerando o fechamento do pregão de 31 de maio deste ano. A companhia separou R$ 167,9 milhões em reservas de capital para as aquisições.
A recompra de ações é uma prática comum no mercado e pode ter diferentes objetivos. Por exemplo, quando a empresa considera que o preço de seus papéis está abaixo do seu valor.
Ou para aumentar o retorno de capital de seus acionistas, já que, ao cancelar as ações que comprou, aumenta a participação de cada um na companhia. As operações de recompra têm, por lei, limites máximos de quantidade e prazo.
No entanto, o mercado pareceu não reagir e a ação continuou caindo até dia 18 de junho, quando a trajetória de alta começou continuamente até agosto. Em paralelo à tesouraria da Ambipar, o controlador, Borlenghi Júnior, iniciou pesadas compras de ações.
Sua fatia na empresa subiu de 66,7% para 73,14%. Em tesouraria, ficaram em torno de 2,74% e, em free float, 24,12%, segundo informe da companhia de 10 de julho. A Trustee, por sua vez, elevou em julho sua fatia de 6,60% para o atual patamar de 11,03%.
CVM pede esclarecimentos
Todas as alterações na estrutura acionária foram comunicadas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão regulador e fiscalizador do mercado, que, em 15 de julho e no último dia 5 de agosto, enviou à empresa pedidos de esclarecimentos acerca da movimentação atípica das ações.
Em resposta ao mais recente questionamento, a Ambipar afirma que investigou possíveis causas, sem nada encontrar, e atribui a alta ao programa de recompra de ações da empresa, aos esforços para redução da alavancagem, à “concretização de projetos para desmobilização de ativos” e até à proximidade do anúncio dos resultados do segundo trimestre, previsto para a quinta-feira, 8 de agosto.
Nogueira, da InvestSmart, faz uma conta simples: “Se tirar a Trustee e o que é do controlador sobram cerca de 13% do total de ações da empresa. E, dessa parcela, quase metade estava alugada em junho.”
“Quando há essa quantidade ‘shorteada’ com esse volume de compras do controlador e da Trustee já é suficiente para fazer o ‘short squeeze’”, acrescenta um gestor que não quis ser identificado.
Até maio, 33% do capital da Ambipar estavam em circulação no mercado no free float, com volume médio de R$ 170 milhões em aluguel de ações, a uma taxa média de 36,78%, ainda segundo o levantamento de Rivero. Em julho, o volume financeiro médio em operações de aluguel subiu para R$ 231 milhões, a uma taxa de até 191% ao ano.
Disparada das ações
No entanto, o volume cresceu no mês passado muito puxado pelo preço da ação, que disparou – em número de papéis caiu ao menor patamar desde agosto do ano passado, de acordo com levantamento de Cozzolino, da Levante. Em junho eram 18 milhões de ações alugadas. Em julho, o número caiu a 7,724 milhões e, nos primeiros dias de agosto, a 7,825 milhões.
“Quem estava alugando passou a encerrar suas posições porque estava perdendo, e isso impulsiona ainda mais a cotação, porque o investidor precisa comprar a qualquer preço para fechar o contrato”, comenta ele. “E a volatilidade atrai ainda mais gente, em um efeito em cadeia de pressão de compra”, diz Nogueira, da InvestSmart.
Ele lembra que o papel não subiu por uma mudança estrutural da empresa: “O fundamento não mudou. A companhia tem endividamento alto. Fez aquisições que ainda não estão se pagando, mas, quando você está alugando uma ação, o tempo trabalha contra você.” Com o fechamento de R$ 76,30 da última terça-feira, a ação bate recorde histórico e está 208% acima dos R$ 24,75 da estreia da Ambipar na bolsa.
Estudo feito pela plataforma de informações financeiras Quantum Finance em julho mostra que, no início do aumento dos preços, próximo ao dia 18 de junho até a virada do mês, “a dupla composta por controlador mais Tesouraria foi responsáveis por 10% a 35% do volume negociado dos papéis na bolsa nesse período.” “O movimento trouxe uma grande influência para o início da subida dos preços e redução do float, desencadeando posteriormente a corrida dos short sellers para fechamento de suas posições em aberto”, diz o estudo.
Possível OPA?
Segundo fontes próximas a Borlenghi Júnior, o empresário pretende desacelerar suas compras de ações. Analistas chegaram a considerar se não seria o caso de fazer uma oferta pública de aquisição de ações (OPA) por aumento de participação, mas as fontes afirmam que o empresário e a empresa “calculam estar longe de uma OPA”, por isso a operação não está nos planos.
A Trustee tem participado de operações importantes, como a de seu fundo Phoenix, que tem o empresário Nelson Tanure entre seus cotistas e arrematou em leilão em abril deste ano a estatal paulista Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia) por R$ 1,04 bilhão. Em fevereiro, comunicou à Oi que passou a deter 5,14% das ações ordinárias da telefônica e que pretende influenciar os rumos da empresa.
Procurada pelo Valor, a gestora e Tanure não responderam aos pedidos de entrevista para comentar o assunto. A Ambipar está em período de silêncio por estar próxima de divulgar seus resultados e também não se pronunciou.
Já a CVM respondeu apenas que não comenta casos específicos e que “acompanha e analisa informações e movimentações no âmbito do mercado de valores mobiliários brasileiro, tomando as medidas cabíveis, sempre que necessário.”
Com informações do Valor Econômico
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