Ambipar (AMBP3) vai sair da bolsa? Entenda a rara decisão da CVM

Autarquia determinou à Trustee realização de OPA por aumento de participação na companhia

Foram oito meses de movimentações atípicas na bolsa, que levaram a uma alta acumulada de 848% das ações até a última sexta-feira (21) e motivaram questionamentos da B3 e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) ao controlador da Ambipar (AMBP3), Tércio Borlenghi Júnior, e à Trustee DTVM.

Agora, em uma rara decisão, a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (SRE) da CVM determinou que a corretora faça uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) por aumento de participação na empresa, tendo como objeto todas as ações em circulação da companhia.

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    Segundo cálculos de analistas, com base no fechamento da última sexta-feira (R$ 122,23), essa fatia, 17,3% do total, corresponde a R$ 3,5 bilhões.

    OPA da Ambipar

    De acordo com comunicado da CVM, a decisão é baseada na conclusão da área técnica do órgão regulador de que a Trustee, em nome de fundos sob sua gestão, “atuou em conjunto” com Borlenghi ao adquirir ações entre julho e agosto de 2024.

    “A medida resultou, em 12/7/2024, após aquisição realizada pela Trustee, na ultrapassagem do limite de 1/3 de ações em circulação, de que trata o art. 30 da Resolução CVM 85.”

    O pedido de registro da OPA deve ser apresentado à autarquia até 21 de abril, mas ainda cabe recurso.

    Paula Magalhães, sócia da área de Companhias Abertas do Demarest Advogados, explica que o controlador pode escolher se desfazer da participação e devolver o free float ao nível determinado por lei.

    Ela afirma que, embora não conheça os detalhes da investigação, as poucas informações reveladas pela CVM mostram que mercado e regulador estão cada vez mais voltados a entender a atuação da grande rede de fundos de investimentos existente atualmente.

    A Trustee, que no site da CVM aparece com 190 fundos operacionais, a maioria com apenas um cotista, tinha 6,6% da Ambipar no início de julho, subiu a 11,03% no mesmo mês, e em agosto chegou a 15,03%.

    Na ocasião, a corretora chegou a comunicar que indicaria dois representantes para o Conselho de Administração da companhia. Em outubro, porém, a DTVM começou a reduzir sua fatia, que caiu a 11,9% e, depois, a 8,98% em janeiro deste ano, quando também manifestou que não tinha mais interesse nos assentos no conselho.

    Borlenghi, por sua vez, elevou sua participação na empresa de 66,7% para 73,48%. Com a alta acumulada, a Ambipar atingiu um valor de mercado hoje em torno de R$ 20 bilhões e saiu em janeiro do índice de Small Caps da B3.

    Em Tesouraria, ficaram apenas 0,29% das ações, segundo a posição válida em 28 de fevereiro de 2025, disponível no site da Ambipar, embora a empresa tenha anunciado em 3 de junho de 2024 que iniciaria um programa de recompra de até 20,8 milhões de ações (R$ 167,9 milhões), equivalente a 37,35% dos ativos em circulação, o chamado “free float”, a R$ 8,07, considerando o fechamento de 31 de maio do ano passado.

    A recompra de ações é uma prática comum, tem, por lei, limites máximos de quantidade e prazo e pode ter diferentes objetivos. Por exemplo, quando a empresa considera que o preço de seus papéis está abaixo do seu valor.

    As alterações na estrutura acionária foram comunicadas à CVM, que, em 15 de julho e 5 de agosto, enviou à empresa pedidos de esclarecimentos acerca da movimentação atípica das ações, assim como a B3, que em dezembro chegou a determinar que o papel entrasse em negociação não contínua. A todos os questionamentos a Ambipar respondeu que não tinha “conhecimento de ato ou fato relevante não divulgado que poderia justificar tais oscilações.”

    Em agosto, esse movimento levou ao chamado “short squeeze”, que faz com que os preços de um ativo disparem. A aposta entre muitos investidores era que os papéis cairiam, o que levou a um grande volume de aluguel de ações. A taxa pelo aluguel chegou a atingir quase 200% ao ano, de uma média histórica de 35%.

    Fábio Coelho, presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), que também faz a ressalva de que conhece apenas os elementos que foram divulgados pela CVM sobre o caso, aponta que a afirmação de que houve atuação em conjunto é forte e mostra que a autarquia obteve elementos suficientes para verificar que os controladores atuaram de forma a evitar uma OPA.

    Ele diz que, em outros momentos no país, se percebeu transações semelhantes, mas não se conseguiu provar. “O caso da Ambipar revela a falta de transparência que vemos em muitas situações de relacionamento entre acionistas que atuam de forma conjunta em votações em assembleias, por exemplo.”

    A Trustee não respondeu aos pedidos de entrevista do Valor, feitos pelo site da corretora e pelo LinkedIn do chefe da área de compliance. Como o processo da CVM corre em sigilo, não se sabe para qual fundo as ações foram compradas.

    O empresário Nelson Tanure é cotista de um dos fundos da corretora, o Phoenix, que arrematou em leilão em 2024 a estatal paulista Emae (Empresa Metropolitana de Águas e Energia) por R$ 1,04 bilhão. Tanure também não respondeu ao pedido de entrevista feito na sexta-feira.

    Já a Ambipar divulgou nota na qual afirma que “recebeu com surpresa o comunicado” da CVM e que a empresa e Borlenghi atuam “em total conformidade com a legislação vigente e com as normas regulatórias estabelecidas para o mercado.” A companhia afirma ainda que buscará “as devidas informações para tomar as providências cabíveis” junto ao órgão.

    Com informações do Valor Econômico

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