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Ataque golpista em Brasília reacende tema de investimento no exterior; quando vale a pena?
Os atentados da ala extremista do bolsonarismo em Brasília no domingo (8) reacenderam a discussão entre participantes do mercado sobre a “dolarização da carteira” de investimentos e a aplicação direta ou indireta em ativos no exterior.
O risco de crise institucional trouxe de volta às rodas de conversa o questionamento sobre movimentar, ou não, parte do portfólio para fora do país.
Quando a tendência de o pequeno investidor levar dinheiro para fora começou, o principal motor da discussão era a taxa básica Selic em 2% ao ano, com a diversificação geográfica da carteira.
Agora, o cenário é outro.
Seja porque a taxa básica está hoje em 13,75% o ano, garantindo os maiores juros reais do mundo, seja por causa do cenário nebuloso também lá fora, o que faz a busca por rendimento ou proteção fora do Brasil não seja tão trivial quanto já foi noutros momentos.
Phil Soares, chefe de análise de ações da Órama, lembra que nos Estados Unidos — principal foco de quem quer investir no exterior —, os juros altos e a atividade ainda pujante devem continuar penalizando a bolsa por um bom tempo.
Ele explica, por exemplo, que o desemprego segue muito baixo por lá, o que ajuda a trazer pressão inflacionária.
E uma eventual consequência disso seria um aperto monetário mais intenso por parte do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano). Trocando em miúdos, com ainda mais juros, as bolsas tendem a cair por lá sob risco recessivo.
“Tivemos uma queda forte da bolsa americana em 2022, mas muito em função do cenário da alta de juros. E, neste momento, o Fed está sendo menos incisivo do que poderia para combater inflação. Os indicadores de atividade americanos continuam altos; o desemprego, perto da mínima histórica; e a inflação cai, mas ainda sem oferecer horizonte de fim do ciclo de aperto monetário. Então, nossa perspectiva para bolsa americana ao longo de 2023 é de leve queda”, afirma o especialista.
Diversificação não deve ser ocasional
Por outro lado, a diversificação como uma estratégia perene na carteira, especialmente geográfica, é vista pelos analistas como algo fundamental em qualquer momento.
Para começar, porque o Brasil é um país emergente, que em geral oferece mais riscos que economias desenvolvidas.
Portanto, no longo prazo, esses mercados tendem a passar por menos instabilidades.
“Os acontecimentos de domingo aumentam o interesse dos investidores brasileiros no exterior. Mas esse é só mais um fator dentre vários que trouxeram instabilidade nos últimos anos”, diz Daniel Haddad, principal executivo de tecnologia da Avenue, corretora especializada em investimentos no exterior.
Após a eleição, diz, o volume de captação da companhia mais do que duplicou frente ao período pré-eleitoral.
“Assim como os acontecimentos do fim de semana, qualquer coisa que traga incerteza leva o investidor a pensar em lugares aparentemente mais seguros, com ativos de mais qualidade. A maior democracia, a mais parruda do mundo, continua sendo os Estados Unidos. É natural que esse movimento de migração para lá aconteça, e o câmbio é um termômetro. Quanto mais incerteza tem aqui, mais ele sobe, dada a busca por alternativas alheias ao Brasil”, diz Haddad.
Carteira deve ser estrutural
Ele destaca, no entanto, que, para investir no exterior, é preciso pensar numa carteira mais “estrutural”, de longo prazo. Segundo o especialista, o mercado norte-americano permite isso, justamente por ser grande o suficiente e contemplar muitos ativos de diferentes tipos, classes e setores.
“No Brasil, o curto prazo faz muita diferença no preço das ações e títulos de renda fixa, porque o Brasil é emergente. Pensamos de forma tática, se o governo faz alguma coisa, tenho que mudar o portfólio porque vai afetar as regras do jogo, o humor dos players. Nos Estados Unidos tem menos isso, podemos fazer alocação estrutural, que é mais robusta do ponto de vista de classe de ativos e você mexe menos na sua carteira. Você deixa aquilo ali e recebe os juros compostos. O grande dinheiro que você faz nos EUA não está na compra nem na venda, está na espera. O investidor pode se dar ao luxo de fazer uma alocação e ir fazendo poucos ajustes”, diz.
Pense no longo prazo
Ian Cao, diretor de investimentos da Gama, pensa em linha semelhante. Aos investidores mais temorosos com consequências imediatas dos atos golpistas, ele recorre à boa e velha tese da diversificação mirando o futuro, que deveria permear a carteira dos negociantes com ou sem ato terrorista em Brasília.
“As pessoas devem ter alocações em moeda forte visando o longo prazo. Esses movimentos de curto prazo, de alta volatilidade, podem acabar fazendo com que se entre nessas opções de investimento esperando retorno rápido, que pode acabar não vindo, com a reversão rápida de cenário que motivou o investimento”, explica.
Terceirizando a gestão
Além disso, Cao entende que delegar a decisão de investimento a quem entende do ramo, em vez de fazer diretamente esse tipo de alocação, é a decisão mais ponderada.
“Caso a pessoa queira mesmo fazer diretamente esse investimento, a recomendação principal é pesquisar muito e entender se o investimento em questão é mesmo o mais adequado ao seu próprio perfil de risco. Mas a melhor maneira de não errar é indo atrás de gestoras que tenham boa governança, que tem mostrando boa rentabilidade ao longo dos anos ao investir em fundos vendidos no exterior”, conclui.
Economia dinâmica
Leonardo Nascimento, sócio da Urca Capital Partners, entende que, embora o cenário externo esteja passando por um período mais nebuloso, a economia dos países desenvolvidos é mais dinâmica.
Tem capacidade de reagir mais rápido. Por isso, seria “mandatório” diversificar no exterior.
Para ele, os investidores de varejo podem começar a investir lá fora por meio das BDRs (Brazilian Depositary Receipts), ativos que funcionam como um “espelho” de ações listadas em bolsas estrangeiras, dos ETFs (fundos de índices da bolsa, que podem ser estrangeiros ou nacionais), incluindo os do mercado imobiliário americano.
Para o especialista, as melhores oportunidades do momento estão não só no mercado imobiliário como também em commodities, apesar do segundo mercado ser “mais volátil” e “angustiante” para investidores que pensam mais no curto-prazo.
Phil Soares, da Órama, também vê boas oportunidades nas commodities, especialmente nas petroleiras. Assim como Nascimento, ele vê os BDRs como um bom instrumento para a diversificação no exterior.
Indiretamente no exterior
Gestor de um fundo multimercado, Rodrigo Galindo, da Novus Capital, vende seu peixe frisando que os fundos da categoria estão entre as melhores opções para quem quer passar ao largo de “ambientes inóspitos” oferecidos pela cena local. E não só para o que julga ruídos passageiros, como a tentativa de golpe de domingo. Mas, essencialmente, por causa das incertezas de natureza fiscal oferecidas pelo governo que acabou de começar.
Esses produtos, é bom lembrar, permitem que os gestores façam alocações em ativos de diversos países, na busca das melhores oportunidades independentemente da geografia.
“O ambiente interno é complexo, cheio de medos, mas, para o nosso tipo de fundo, é muito bom esses instantes, por permitir a gente se posicione de acordo com as perspectivas, seja de queda ou de alta do mercado local”, garante. “No momento, por exemplo, não estamos expostos a nenhum tipo de risco local. Estamos totalmente zerados na bolsa nacional, algo que não me lembro de fazer desde 2014”.
Toda a exposição a bolsas dos fundos sob gestão da Novus, explica Galindo, está totalmente concentrada em teses de reabertura da China, que vai se livrando da política de “covid zero”.
Ativos americanos e europeus, dadas as respectivas lutas contra a inflação, estão deixados de canto por ele.
“Infelizmente, o Brasil tem grande chance de não tirar proveito da reabertura da China, mesmo sendo um grande produtor de commodities, por causa do ambiente interno conturbado”, diz.
“Estamos comprados em bolsas emergentes, sendo quase 70% asiáticas, e a parcela restante se divide entre o ETF do MSCI Emerging Market. Temos ainda uma parcela direta em commodities, com posições compradas em cobre, e outra em moedas, como as australiana e canadense, que podem se favorecer com a reabertura da China assim como poderia o real, não fossem os riscos nacionais.”
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