O que está por trás do boicote do Carrefour da França à carne brasileira e os impactos do embate

CEO do grupo, o francês Alexandre Bompard, afirmou que deixará de vender carnes provenientes do Mercosul

Unidade do Carrefour no Brasil (CRFB3). Foto: Divulgação
Unidade do Carrefour no Brasil (CRFB3). Foto: Divulgação

Na última quarta-feira (20) o CEO do Carrefour, o francês Alexandre Bompard, decidiu compartilhar em suas redes sociais que a rede varejista promoveria um boicote às carnes vendidas pelo Mercosul. O bloco é formado pelo Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai.

O posicionamento, argumentou em nota feita para o sindicato agrícola francês, era em solidariedade aos protestos dos agricultores locais contra o acordo entre o bloco sul-americano e a União Europeia.

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A repercussão foi imediata. Na sexta-feira (22) as ações do Carrefour (CRFB3) na bolsa brasileira despencaram 57,82%.

Boicote: governo brasileiro e a resposta ao Carrefour

O ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Carlos Fávaro, declarou, na quinta (21), apoio ao movimento de associações de produtores de proteína animal e entidades brasileiras do agronegócio que sugeriram boicote em repúdio à decisão da rede varejista Carrefour, na França.

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Na mesma quinta, o Mapa publicou nota em que rechaçou a decisão do Carrefour e reafirmou a qualidade da carne produzida no Brasil.

Em seguida, entidades do setor também divulgaram uma nota de repúdio. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) e a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) sugeriram a possibilidade de boicotar totalmente a oferta de carne ao Grupo Carrefour no Brasil.

Também participaram do comunicado a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e a Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). Além da Sociedade Rural Brasileira (SRB) e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Frigoríficos brasileiros afirmam que suspenderão vendas ao Carrefour

Os maiores frigoríficos brasileiros decidiram suspender o fornecimento de carne ao grupo no país, que também comanda a rede Atacadão.

Em nota conjunta, diversas associações, como a CNA e ABPA entre outras, afirmaram que, se o executivo (francês) entende que o Mercosul não é fornecedor à altura do mercado francês. Assim, também “não serve para abastecer o Carrefour em nenhum outro país”.

“Reafirmamos o compromisso do setor com a produção responsável, sustentável e com a segurança alimentar”, declararam as entidades.

Disputa comercial

Na avaliação do próprio ministério brasileiro, o veto do Carrefour à carne do Mercosul é uma forma de dificultar o avanço do acordo de livre comércio entre o bloco sul-americano e a União Europeia. O tema foi debatido durante a Cúpula do G20 na semana passada. Mas que se arrasta há mais de duas décadas e meia.

O próprio presidente da França, Emmanuel Macron, voltou a dizer, durante a cúpula, que “em seu estado atual, não é um tratado aceitável”.

Com alegações sobre o cumprimento de regras ambientais, a posição francesa vocaliza interesses dos produtores agrícolas do país. Ele temem perda de mercado com a entrada em vigor do acordo. Ele abriria espaço para a venda de produtos nos mercados internos dos países de ambos os blocos.

Jogando para a torcida

Welber Barral, sócio da BMJ e ex-secretário de comércio exterior, diz que a resistência do setor agropecuário da Europa, sobretudo da França, juntamente com outros países como Polônia e Irlanda, sempre foi uma das grandes dificuldades para o acordo.

“Eles querem abrir o mercado industrial do Mercosul, mas não querem abrir o mercado agrícola. E não estamos nem falando de abertura total. Porque, na verdade, a negociação envolve cotas de exportação que para alguns produtos são até pequenas e não deve trazer impacto tão grande assim no consumo europeu”, afirma.

“Mas os europeus acabam alegando questões ambientais ou de segurança sanitária. O que não tem fundamento, porque o Brasil exporta carnes para os Estados Unidos e outros países desenvolvidos. Esse é o contexto que nós estamos vivenciando há 20 anos de negociação do acordo”, diz o especialista.

A manifestação do Carrefour, aponta Barral, tem duas análises para serem feitas.

“A primeira é que o Carrefour da França está um pouco jogando para seus fornecedores e consumidores locais”, destaca.

Ação publicitária

Segundo ele, a declaração de seu presidente trata-se de uma ação publicitária para clientes e fornecedores na França. “O segundo ponto é que há risco concreto que já existe em vários outros produtos, que é a ideia de criar padrões privados. E isso acaba burocratizando a exportação brasileira para esse tipo de cliente.”

Como padrões privados, explica Barral, pode haver exigência de redes francesas de supermercados para que o exportador brasileiro de carne tenha um selo que diga que ele cuida da sanidade animal, de questões sociais, do meio ambiente, da emissão de carbono, por exemplo. Movimento nesse sentido, segundo ele, já ocorreu no fornecimento brasileiro de papel e celulose.

Para Barral, a declaração do Carrefour é “parte do jogo” na negociação do acordo União Europeia-Mercosul. “Não significa, necessariamente, que o acordo vai fazer água. É uma jogada de negociação e é uma pressão natural e esperada dos protecionistas franceses.”

Impacto na exportação brasileira

Apesar da grande repercussão, a França tem pouca relevância na exportação brasileira de carne bovina. Segundo dados do site especializado Farmnews, entre janeiro e outubro de 2024, o Brasil vendeu menos de 40 toneladas de carne in natura para os franceses, representando apenas 0,002% do total exportado no período, que somou 1,41 milhão de toneladas.

No entanto, o temor no setor agropecuário brasileiro é que o boicote francês influencie outros países europeus, ampliando o impacto na imagem da carne do Mercosul e reduzindo o mercado para os produtores da região.

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