Abercrombie & Fitch abandona polêmicas e ações disparam. Vale a pena investir na varejista?
Confira avaliação de analistas de Wall Street sobre as ações da empresa
Lembra dela? A Abercrombie & Fitch (ANF), marca que foi objeto de desejo de jovens e adolescentes entre 1990 e meados de 2010, com seu moletons e camisetas que estampavam o logo da marca, voltou à cena. Saltando 285% em 2023, a ação da empresa de moda teve o melhor desempenho do ano passado no índice S&P 1500. Superou até mesmo a Nvidia, a big tech queridinha do momento.
A recuperação da empresa, entretanto, não ocorreu do dia para a noite. De marca icônica, com a aura alimentada por campanhas publicitárias com modelos exibindo corpos perfeitos e que exalavam sensualidade, a A&F foi para a ruína. Em 2016, chegou a receber o título de “varejista mais odiada dos Estados Unidos”. Para se ter uma ideia da decadência, a empresa teve uma sequência de quedas nas vendas de suas lojas por 11 trimestres consecutivos.
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Assim, com as ações em baixa trimestre após trimestre, a Abercrombie teve de repensar sua postura. Em 2017, as ações da marca caíram para o patamar dos US$ 10, ou seja, o menor valor em 20 anos.
Foi aí que a varejista percebeu que a cultura da exclusão, chave do sucesso até aquele momento, tinha deixado de ser algo positivo.
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O recomeço com Fran Horowitz
A Abercrombie & Fitch está sob nova liderança desde 2017, quando a atual CEO, Fran Horowitz, assumiu o comando da varejista. Desde então, a marca vem se reinventando com um posicionamento focado em inclusão, propósito e pertencimento.
A marca mudou praticamente tudo. Em resumo, as peças, antes famosas pelas estampas e pelo enorme logo com o nome da grife, hoje têm um estilo mais clean e casual. Além disso, são apresentadas no site da empresa e nas campanhas publicitárias fotos com modelos brancos, negros, pardos, asiáticos, magros e gordos.
“Hoje – e todos os dias – estamos liderando com propósito, defendendo a inclusão e criando um sentimento de pertencimento”, diz mensagem de abertura no site da empresa.
As mudanças promovidas por Fran Horowitz deram resultado, culminando no melhor desempenho anual da companhia em 2023 – a A&F abriu capital em 1996. A seguir, entenda por que as ações da Abercrombie bombaram no ano passado e saiba se vale a pena investir na varejista.
Os números da Abercrombie & Fitch em 2024
As ações da Abercrombie & Fitch (ANF) subiram 24,32% no dia 29 de maio, fechando a US$ 189,45, depois que a varejista de roupas divulgou vendas fiscais no primeiro trimestre que cresceram 22% em relação ao ano anterior. O valor, entretanto, não se sustentou. Na última segunda-feira (22), os papéis encerraram o pregão em queda, valendo US$ 158,42.
Os números do balanço, entretanto, surpreenderam. O lucro da Abercrombie durante o período foi quase sete vezes maior se comparado ao mesmo período de 2023 e ficou acima das estimativas de Wall Street. A receita aumentou pelo sexto trimestre consecutivo, chegando a US$ 1 bilhão, com o lucro melhorando em função de menos promoções e acordos de liquidação.
De acordo com a CEO Fran Horowitz, na teleconferência de resultados, os vestidos femininos e as novas tendências em jeans, incluindo pernas largas e jeans largos de cintura baixa, ajudaram a impulsionar as vendas.
Vale a pena investir na Abercrombie & Fitch (ANF)?
Após a divulgação dos resultados do primeiro trimestre deste ano, os analistas não se empolgaram. Recentemente, porém, o JPMorgan fez alterações em suas classificações de ações no setor de varejo de roupas.
De acordo com relatório divulgado na segunda-feira (22), o banco aumentou a classificação da Abercrombie & Fitch para “overweight” (retorno ou performance superior às expectativas).
“Com o preço das ações da empresa caindo aproximadamente 20% desde o relatório de lucro por ação do primeiro trimestre, aumentamos a classificação da ANF para overweight”, afirmou o JPMorgan.
O banco enfatiza a forte demanda consistente pelos produtos da Abercrombie. Além disso, o JPMorgan identificou uma oportunidade para a empresa recuperar aproximadamente US$ 400 milhões em vendas internacionais.
O JPMorgan também aumentou sua estimativa de lucro por ação do segundo trimestre para a ANF para US$ 2,30. Ou seja, trata-se de um valor superior à estimativa média dos analistas, de US$ 2,13. A previsão do lucro por ação para o ano fiscal de 2024 ficou em US$ 9,95, também acima da estimativa média dos analistas, de US$ 9,51.
Além disso, o banco espera que a receita da empresa cresça aproximadamente 19% no segundo trimestre. Por fim, a instituição financeira estabeleceu um preço-alvo para as ações da ANF em US$ 194 para dezembro de 2025. O valor se baseia em um múltiplo de oito vezes do lucro da empresa antes de juros, impostos, depreciação e amortização para o ano fiscal de 2026.
O que Wall Street diz sobre a ANF?
De acordo com oito analistas de Wall Street, o preço-alvo médio da ação da Abercrombie & Fitch (ANF) é de US$ 175. A previsão máxima é de US$ 215, e a mínima, de US$ 149. Os dados são da TipRanks, empresa de tecnologia financeira que usa inteligência artificial para analisar dados financeiros para fornecer ferramentas de pesquisa de mercado de ações para investidores de varejo.
Dos oito analistas, três recomendam a compra das ações da Abercrombie, e cinco têm avaliação neutra para os papéis.
Abercrombie & Fitch (ANF): documentário mostra a queda
Ficou curioso para conhecer um pouco mais sobre a história da A&F? Então vale conferir a trajetória daquela que foi uma gigante do vestuário no documentário “Abercrombie & Fitch: Ascensão e Queda”, disponível na Netflix.
No filme dá para se ter uma ideia da obsessão do ex-CEO Mike Jeffries pela imagem de juventude, exclusividade e elitismo que fez da Abercrombie & Fitch uma marca de sucesso. Sua visão preconceituosa, entretanto, tornou a empresa, em pesquisa realizada em 2016, a mais odiada pelos americanos.
Apesar de todas as polêmicas envolvendo a A&F, Jeffries, que deixou o cargo em 2014, transformou a marca em fenômeno cultural, representando o que era ser “cool” nos ano 1990 e começo dos 2000. Ele soube projetar uma imagem de perfeição da juventude americana e fez da Abercrombie uma espécie de fantasia para o público adolescente e jovem.
“As roupas não eram nada demais, mas a etiqueta funcionava como um emblema”, declarou Alan Karo, executivo de marketing e de publicidade no mundo da moda, em depoimento no filme dirigido por Alison Klayman (confira o trailer abaixo).
As lojas da Abercrombie tinham persianas marrons nas vitrines, forçando o consumidor a entrar para ver as peças à venda. Sempre com música muito alta e um perfume da marca no ar, a grife criava uma atmosfera especial que deduziu muita gente. Na porta de algumas de suas lojas, os vendedores, jovens e sarados, ficavam sem camisa chamando os consumidores para entrar.
Veja abaixo o trailer do documentário da marca, que está passando na Netflix:
Quem é o polêmico Mike Jeffries, ex-CEO da marca?
Em 1992, o bilionário Leslie Wexner, fundador da L Brands (que engloba a Victoria’s Secret), chamou Mike Jeffries para renovar a Abercrombie, que já existia desde 1892. Inicialmente a grife tinha como público aventureiros e esportistas de elite. O escritor Ernest Hemingway (1899-1961) e o presidente Theodore Roosevelt (1858-1919) estavam entre os consumidores da marca.
Com a ajuda do fotógrafo Bruce Weber, conhecido por campanhas publicitárias de moda, Jeffries deu aos jeans, aos moletons e às camisetas polo masculinas da Abercrombie uma aura descolada e sensual. Com fotos de jovens seminus e garotos propaganda como Channing Tatum, Jennifer Lawrence, Olivia Wilde e Taylor Swift, a Abercrombie vendia uma imagem sexy e de status social.
Nos anúncios, seus modelos muitas vezes faziam atividades ao ar livre e apareciam acompanhados de cães da raça golden retriever. O problema é que a Abercrombie só queria vender roupa para quem fosse como seus modelos, ou seja, muito belos, jovens, magros e brancos.
Suas roupas não traziam tamanhos grandes, e o próprio Jeffries chegou a afirmar em entrevista que a Abercrombie era uma marca apenas para as “cool kids”. “Muitas pessoas não se encaixam e não podem se encaixar. Somos excludentes? Sim, sem dúvida”, disse o CEO, em 2006.
Racismo
A marca ainda vendia camisetas racistas, ridicularizando latinos e asiáticos, o que gerou protestos nos EUA. Além disso, havia uma discriminação sistêmica dentro da empresa. Para se ter uma ideia, funcionários negros e asiáticos ficavam escondidos nos fundos das lojas. E muitos foram demitidos por não se encaixar no perfil da empresa – quem não era jovem e branco estava fora dos planos da A&F.
Consequentemente, a Abercrombie foi alvo de vários processos judiciais em decorrência da conduta imposta por Jeffries.
O ex-CEO, que se recusou a dar depoimento no documentário “Abercrombie & Fitch: Ascensão e Queda”, admitia com naturalidade nas entrevistas que só contratava “pessoas bonitas” para trabalhar na linha de frente. O resultado? A marca adquiriu uma conotação negativa, o que acabou refletindo nas vendas.
Em 2014, Jeffries se demitiu diante de tantas polêmicas e da derrocada da marca. Desde então, a grife vem se reposicionando, com foco na diversidade.
Exploração sexual
Porém, as polêmicas envolvendo Mike Jeffries não chegaram ao fim após a saída dele da Abercrombie & Fitch. O FBI (Departamento Federal de Investigação dos Estados Unidos) abriu uma investigação para apurar alegações contra o ex-CEO, acusado de explorar e abusar sexualmente de homens em eventos organizados em várias cidades do mundo. A informação foi revelada neste ano.
De acordo com a BBC, que reuniu relatos de vítimas num documentário, agentes do FBI têm entrevistado testemunhas e enviado intimações a pessoas que possam ter informações sobre o caso – fontes apontaram que a apuração tem sido conduzida por agentes especializados em crimes sexuais e por promotores federais do Distrito Leste de Nova York.
Além disso, Jeffries e seu parceiro respondem na esfera cível por terem supostamente comandado uma “operação de tráfico sexual”, diz a rede britânica.