Lições de Sir John Templeton, o maior selecionador de ações do século
Templeton selecionava seus investimentos com base em análise fundamentalista. Ele estudava e entendia as ações que investia. Conheça suas outras estratégias
Tive a oportunidade de participar, na semana que passou, de um evento realizado pela gestora de recursos Franklin Templeton em sua sede em São Francisco, na Califórnia (EUA).
Trago aqui ‘insights’ que podem ajudar na compreensão de cenário macro e seus impactos na alocação dos seus investimentos globais. Foram diversos pontos abordados por diferentes gestores nos painéis realizados no evento.
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Mas antes de adentrar no universo mais prático e conjuntural do que foi abordado lá, deixe-me fazer uma inserção para falar um pouco de história e as lições que ela nos ensina.
Lições de Sir John Templeton
A Franklin Templeton foi fundada em 1947, em Nova York, por Rupert H. Johnson Sr, tendo como inspiração para o nome a figura de Benjamin Franklin e sua disciplina e prudência com dinheiro e investimentos.
Seu nome atual derivou da aquisição da Templeton, Galbraith & Hansberger Ltd.em 1992. E aí que chegamos à história de Sir John Marks Templeton, um renomado investidor e gestor americano. Existem diversas lições, curiosidades e pontos superinteressantes a respeito de sua vida, vou aqui apenas trazer alguns deles.
Stock Picking
Templeton tinha por característica selecionar ações com base em análise fundamentalista, estudando e entendendo as ações nas quais investia. Em 1999, a revista Money o chamou de “indiscutivelmente o maior selecionador de ações do século”.
Ele não procurava prever os movimentos do mercado, focava sua análise nos negócios em que investia. Templeton focava seus investimentos em empresas de valor (value stocks) ao invés das chamadas “growth stocks” (ações de crescimento).
Templeton buscava boas empresas, com boa gestão, lucrativas e subvalorizadas em sua avaliação, mantendo-as até a venda, quando julgava que seu preço havia retornado a um patamar justo – em média, ele carregava posições por cerca de quatro anos.”
Diversificação geográfica
Templeton foi um dos primeiros gestores americanos a dedicar foco a oportunidades em mercados estrangeiros. Por exemplo, ele foi um dos primeiros investidores no Japão durante a década de 1950. Com sua mentalidade e filosofia de investir em bons negócios a preços acessíveis, ele foi atrás de ações baratas (em sua avaliação) mundo afora.
Bahamas e uma curiosidade
Dada a sua abordagem diversificada globalmente e o perfil de seus clientes (muitos deles de fora dos EUA), Templeton estabeleceu seu fundo, o Templeton Growth Fund, nas Bahamas – um paraíso fiscal. É interessante que, ao ser questionado sobre como seria administrar um fundo sem estar em Wall Street, ele dizia que seus retornos haviam melhorado quando se mudou para as Bahamas.
A razão?
Segundo ele, porque recebia o Wall Street Journal alguns dias depois de todos os outros. Ou seja, não estar tão up to date (“atualizado”) com as informações do dia a dia do mercado o ajudara a investir melhor. A lição aqui é aprender a discernir ruídos (informações ruins) de sinais (indicadores relevantes para a decisão de investimento).
Mentalidade
Algo sempre fundamental no universo de investimentos é saber conviver com seus investimentos e seu portfólio em meio aos diferentes cenários sem que este o afete ou tire seu equilíbrio. Templeton atribuiu muito de seu sucesso à sua capacidade de manter um humor elevado, evitar a ansiedade e permanecer disciplinado. Apesar de ter acumulado um vasto patrimônio ele manteve um estilo de vida frugal e foi um grande filantropo.
Performance
Templeton teve resultados decepcionantes durante alguns anos, especialmente em momentos de mercados de alta, por evitar ações do momento ou “da moda”.
Seu desempenho superior se deu especialmente em mercados em baixa quando seu fundo apresentou menores quedas do que a média do mercado.”
Seu principal fundo superou um índice de ações global em uma média de 3% ao ano durante toda a sua carreira e em mais de 6% ao ano no período após sua mudança para as Bahamas. Sua abordagem global fez com que a empresa, sob sua gestão, tivesse diferentes fundos globais, sendo o seu principal, o Templeton Growth Fund, tendo apresentado um retorno médio anual de 14,5% de 1954 a 1992.
Conjuntura e cenário de investimentos
Voltando à conjuntura e ao cenário de investimentos, vejamos os insights do evento em diferentes assuntos que tem sido recorrentes no noticiário atualmente.
Teto de dívida americana
Parece haver um consenso que, no limite, os congressistas irão “se entender” e chegar a um acordo que evite o calote. Apesar disso, o aumento de gastos em si e a trajetória de dívida americana foi algo criticado em São Francisco. A ideia de manter elevados os gastos do governo financiados com dívidas e mais imposto, questões como o déficit fiscal e comercial, um sistema político cada vez mais populista… Todos esses fatores tendem a gerar menos crescimento potencial, algo que, inclusive, já foi visto inúmeras vezes em países emergentes. A ideia aqui é que as regras da economia também se aplicam aos EUA e esses fatores preocupam.
Um mundo diferente
Esse tem sido um dos momentos mais difíceis de se prever a economia, há um certo consenso de que o mundo é outro pós-Covid. Você tem um aumento da regionalização das cadeias produtivas.
As empresas buscam produzir em locais que talvez não sejam os mais baratos em termos de custos, mas que sejam parceiros com alguma segurança institucional. Nesse sentido, países como México, Indonésia e Índia foram citados como alternativas.
Uma globalização diferente que se dá sobre a égide de um conflito entre EUA e China que é muito mais complexo do que a Guerra Fria onde parecia haver 2 lados bem definidos, com os demais países se associando a cada um dos lados. A ideia aqui é que agora é diferente e os “lados” são menos dicotômicos e menos óbvios.
Inflação veio para ficar?
Se o mundo se regionaliza, você “perde” a força desinflacionaria da China. Ou seja, a China nas últimas décadas se tornou uma grande fábrica do mundo com sua mão de obra em excesso propiciando baixos custos de produção que baratearam diversos produtos.
Ora, levar a produção a outros países, regionalizá-la ou até mesmo internalizá-la, torna a produção mais cara. Além disso, a preocupação com o ESG também encarece a produção. Então, olhando os atuais dados e sob o olhar histórico, trazer de volta a inflação para a meta de 2% do Fed (banco central dos EUA) parece ser um desafio grande e que pode levar mais tempo do que se imagina.
Juros e empregos
Ora, se a conjuntura tornou a inflação mais “teimosa”, o normal é que os juros permaneçam altos até que a trajetória de queda se mostre mais clara. Esse é o cenário base que percebi em São Francisco. Existe a percepção de que o Fed tem sido muito claro em sua comunicação de que não pretende baixar os juros em breve. Segundo um dos participantes, historicamente, juros caem 100 dias depois do banco central interromper o ciclo de aumento de juros.
Por outro lado, nas curvas de juros o mercado precifica algo diferente. O mercado se apega ao fato de que, historicamente, o Fed começa a cortar juros quando a criação de trabalho se torna negativa (se fecham mais postos de trabalho do que são criados), no entanto, atualmente, o gráfico de projeções do Fed aponta para esse potencial aumento do desemprego, mas sem expectativas de cortes de juros.
Recessão se aproximando?
A recente escalada dos juros tem feito a economia americana, muito pautada em consumo e crédito, se “adaptar” ou “digerir” esse novo patamar de juros. O volume de crédito já voltou às máximas pré-covid, então há pouco espaço para expansão do crédito; a turbulência bancária tornou os padrões de empréstimos mais apertados; fora isso, as taxas subiram muito. Portanto, numa economia onde o consumo representa quase que 70% do PIB e o crédito tem um papel relevante nessa equação, temos então uma tendência de que essa desaceleração leve sim a uma recessão.
Dado interessante trazido por um dos participantes: das últimas 13 vezes em que o Fed elevou os juros, em 10 tivemos recessões nos EUA. Então, pareceu haver um consenso de que a recessão é inevitável e uma questão de tempo até que chegue. A Franklin Templeton produz esse “check box” bem interessante sobre o assunto. Uma forma de monitorar indicadores que apontam ou não para uma recessão. Segundo o check box, temos diversos vetores que indicam uma recessão nos EUA, tais quais tivemos em outros momentos de recessão nos EUA.
Cenário para alocação
Tal qual já comentei aqui, o fato de termos uma recessão nos EUA não é algo novo ou que deve ser encarado com medo pelos investidores. Na verdade, recessões criam oportunidades que podem ser aproveitadas.
Renda fixa
Na renda fixa, grande parte dos participantes vê os juros americanos cedendo mais para o final deste ano de 2023, em linha com o Fed, e divergindo da aposta recente do mercado de que os juros possam cair já no 3T23. Seja no final do ano ou antes, o momento tem sido de aproveitar os yields mais elevados desde 2007 focando a alocação em títulos de mais curto prazo e de elevada qualidade de crédito (investment grade ou bonds soberanos de dívida dos EUA, por exemplo).
Houve também um viés positivo para investimento em renda fixa em emergentes, nesse caso, Brasil e México se destacam, mas sempre pensando dentro de um portfólio diversificado, com alocação em outras geografias de forma a reduzir os riscos de se investir em emergentes.
Ações nos EUA
Em ações nos EUA, parece haver um consenso de que a alta dos índices americanos nesse ano não reflete bem a realidade da economia. Na verdade, grande parte das empresas do S&P 500 apresentam uma fraca performance, mas o índice subiu muito por conta do forte desempenho das ações de tecnologia.
Dado que economia caminha para uma recessão, muitos se mostraram cautelosos com a alocação em ações. Ressaltando historicamente, o índice S&P fez suas mínimas 3 meses antes da recessão terminar, ou seja, durante as recessões e não antes delas.
Ainda assim, para quem tem paciência, um dos participantes ressaltou que as small caps já precificam um cenário de recessão tendo caído, em média, cerca de 30% do seu pico, e que atualmente são a classe de ativos mais barata da bolsa americana. Ainda olhando seu histórico de performance, a classe entregou retornos superiores ao do índice principal após esses momentos de turbulência – em outras palavras, ele observou que o retorno do Russel 2000 foi superior ao retorno do S&P 500 em uma janela de 3 anos depois do início do aumento de juros nos EUA.
Além dos EUA
Olhando para fora dos EUA, as empresas japonesas ganharam destaque e foram bem comentadas. Em geral, elas apresentam elevadas posições de caixa, baixo endividamento, fluxo de caixa sólido, alta intensidade de tecnologia em seu processo produtivo, ainda que tenham apresentado um crescimento modesto nos últimos anos.
Além do Japão, existe a percepção de que mercados emergentes possam apresentar bons retornos esse ano, uma vez que muitos deles estão num outro momento do ciclo econômico – inflação cedendo e, consequentemente, política monetária mais frouxa (redução de juros).