Em carta anual, Warren Buffett dá recado ESG e lamenta excesso de caixa

Investidor considera importante ter disponibilidade de caixa elevada, mas admitiu que US$ 144 bilhões é muito dinheiro

O megainvestidor Warren Buffett, atualmente o sexto maior bilionário do mundo, com uma fortuna estimada em US$ 116 bilhões, publicou no sábado (26) sua tradicional carta anual aos acionistas da Berkshire Hathaway, a empresa que controla e comanda junto com Charlie Munger. Os textos anuais de Buffett são lidos detidamente pelos agentes do mercado de investimentos, e em especial pelos adeptos de estratégias de “investimento em valor”, que procuram comprar empresas baratas com foco no retorno de longo prazo, e não em ganhos com giro rápido da carteira de ações.

A edição de 2022, que tem 11 páginas e que acompanha o balanço de 2021, está disponível no site Berkshire. Ele começa reforçando justamente esse traço da sua estratégia de investimento.

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“Nossa meta é ter investimentos significativos em negócios que tenham ao mesmo tempo vantagens econômicas duráveis e presidentes executivos de primeira classe. Compramos ações com base na nossa expectativa de performance dos negócios no longo prazo, e não porque as vemos como veículos para ganhos com movimentos de mercado no tempo certo. Esse ponto é crucial: Charlie e eu não somos stock-pickers; nós somos business-pickers.” – Warren Buffett

Seleção de empresas, não de ações

Mas se Buffett está tranquilo com essa definição de “selecionador de empresas”, e não de ações, o mesmo não se pode dizer das possibilidades que ele tem para injetar dinheiro em companhias que passem pelo crivo dele e de Charlie Munger. O bem-humorado Buffett comenta que a Berkshire possui hoje US$ 144 bilhões investidos em títulos públicos dos EUA, algo entre 0,5% e 1% do total da dívida pública americana, mas que não faz isso por uma “torta expressão de patriotismo”.

Ele diz que sempre considerou importante que sua empresa tenha disponibilidade de caixa elevada para não depender de “estranhos”, mas admitiu que US$ 144 bilhões é muito dinheiro. Segundo ele, desde 1942 sua alocação em ações nunca foi inferior a 80%, e a preferida é 100%. Porém, diante do tamanho da Berkshire, a possibilidade de aumentar os investimentos em empresas baratas nem sempre está a mão.

Nessa linha, ele comentou que as baixas taxas de juros nos EUA elevam os preços dos ativos, o que reduz as oportunidades de reinvestimento maior nos negócios atuais ou em novos negócios inteiros em condições favoráveis. Por isso, ele diz que a empresa tem optado pela recompra de ações — num total de US$ 51,7 bilhões nos últimos dois anos, ou cerca de 9% dos papéis emitidos — e que seguirá fazendo isso — somente — quando as cotações estiverem favoráveis.

Referência ao ESG

E se o posicionamento como “selecionador de empresas” baratas não chega a ser uma novidade para quem conhece a carreira e história de Buffett, algo novo que aparece na carta deste ano é uma referência indireta ao acrônimo ESG, sigla em inglês para os temas ambiental, social de governança.

No ano passado, alguns investidores minoritários da Berkshire pediram em assembleia que a empresa passasse a fazer um relato detalhado de suas ações nessa área, o que Buffett e outros acionistas rechaçaram, por considerarem muito custoso. No texto divulgado, quando comemora a boa performance de longo prazo da BNSF Railway, uma subsidiária de transporte ferroviário, ele comenta que, se as 535 milhões de toneladas de produtos que a empresa transporta anualmente tivessem que ser movidas por caminhões, “as emissões de carbono” dos EUA disparariam.

Em seguida, ao falar do desempenho da BHE, sigla para Berkshire Hathaway Energy, outra subsidiária do grupo, ele comenta que no ano 2000 ela não gerava um megawatt por fonte solar ou eólica, e que agora a empresa tem posição de liderança nessas fontes renováveis, o que ele diz ter sido detalhado em um relatório que nada tem de “green-washing” (termo usado para se referir à prática de se tentar dar um verniz ESG para atividades não tão sustentáveis assim).

Dinheiro sem custo e lucro ajustado

Além do recado ESG, Buffett voltou a exaltar a acertada decisão de entrar no ramo de seguros décadas atrás, pelo fato de poder usar o dinheiro que garante as apólices dos segurados para fazer parte relevante dos investimentos da Berkshire. “(Esse float) é um dinheiro que podemos investir, mas que não pertence a nós”, explica o investidor a seus acionistas.

Ele conta que essa cifra hoje alcança US$ 147 bilhões, afirma que ela “não custa nada” para a empresa, e ao mesmo tempo é estável, o que permite que a Berkshire faça investimentos de longo prazo. “O negócio de seguros foi feito sob encomenda para a Berkshire. O produto nunca será obsoleto, as venda e volume vão crescer junto com a economia e a inflação. E, também, integridade e capital serão sempre importantes”, descreve.

Pitacos contábeis

O megainvestidor tenta ser bem didático com seus acionistas ao explicar como cada empresa aparece representada no seu balanço. Se os negócios de seguros, ferrovias e de energia são de empresas controladas e aparecem plenamente nos resultados, o investimento na Kraft Heinz é registrado pelo método de equivalência patrimonial (com uma fração do lucro da empresa entrando no resultado da Berkshire) e outros tantos aparecendo como investimentos em ações, como as fatias em Apple, American Express, Coca-Cola e Moody’s, entre outras.

Crítica ao Ebitda

E, além da aula de contabilidade, Buffett aproveita uma deixa para voltar a criticar o amplo uso de medidas ajustadas de lucro, como o adorado Ebitda aqui no Brasil. Quando fala do resultado da BNSF Railway, diz que ela gerou US$ 6 bilhões de lucro em 2021. E acrescenta: “Aqui cabe notar que estamos falando do lucro “das antigas” (old-fashioned) que nós preferimos, um número calculado depois de juros, impostos, depreciação, amortização e todos os tipos de remuneração de executivos”, afirma.

E completa: “Nossa definição sugere um aviso: “ajustes” enganosos para medidas de lucro – para usar uma descrição educada – tornam-se mais frequentes e mais fantasiosos à medida que as ações se valorizam. Falando de forma menos educada, eu diria que os mercados de alta (bull markets) geram touros inflados”.

Com reportagem do Valor Investe

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