Novo serviço do WhatsApp, ‘Comunidades’ pode facilitar proliferação de notícias falsas; entenda
Serviço, menos restrito para circulação de mensagens, pode impulsionar 'fake news' de contestação do resultado das eleições, tal como aconteceu nos EUA após a derrota de Trump
O WhatsApp, da empresa Meta, anunciou, nesta quinta-feira (14), que está trabalhando em uma ferramenta para “pequenas comunidades”, com o objetivo de unir e organizar pessoas em torno de um lugar ou interesse comum. A grande diferença dos grupos já existentes é que, as comunidades unirão vários desses grupos num mesmo espaço.
O recurso estará em testes nos próximos meses e deve ser lançado no próximo ano, segundo a empresa. Não está claro se poderá ser lançado após o segundo turno da eleição de outubro e a posse em janeiro de 2023, o que também é motivo de preocupação. O presidente da República, Jair Bolsonaro, vem colocando a lisura do processo eleitoral em xeque, e um WhatsApp menos restrito para circulação de mensagens pode impulsionar mensagens de contestação do resultado das eleições, tal como aconteceu nos Estados Unidos após a derrota do ex-presidente Donald Trump.
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“Dessa forma, as pessoas podem receber atualizações enviadas para toda a Comunidade e organizar facilmente grupos de discussão menores sobre o que é importante para elas. As comunidades também conterão novas ferramentas poderosas para administradores, incluindo mensagens de anúncio enviadas a todos e controle sobre quais grupos podem ser incluídos”, informou o WhatsApp.
A empresa diz que a atualização foi pensada para grupos de amigos, conhecidos e familiares como escolas, clubes e organizações sem fins lucrativos. “Enquanto outros aplicativos estão criando bate-papos para centenas de milhares de pessoas, optamos por nos concentrar em apoiar os grupos que fazem parte do nosso dia a dia”.
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Em janeiro, O GLOBO mostrou que especialistas brasileiros demonstraram preocupação acerca da nova funcionalidade, ao serem procurados pela empresa, no mês anterior, para uma pesquisa de mercado — ocasião em que o recurso em testes foi apresentado. Segundo eles, o Comunidades pode turbinar a disseminação de notícias falsas e ataques virtuais, já que o aplicativo está presente em 99% dos smartphones no Brasil, segundo levantamento da Opinion Box, e figura como a principal fonte de informação dos brasileiros, de acordo com pesquisa realizada pelo Congresso em 2019.
Após O GLOBO publicar a reportagem, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso, marcou uma reunião com o chefe internacional do WhatsApp, Will Cathcart, para debater as ações que serão implementadas pelo aplicativo de mensagens para combater notícias falsas e apoiar o processo eleitoral no Brasil para as eleições. Na conversa, Barroso ouviu de Cathcart que a empresa não implementaria mudanças consideráveis até o pleito de outubro.
“Nós acreditamos firmemente em proteger a privacidade das conversas das pessoas e acreditamos em mudanças cuidadosas como limites para o encaminhamento de mensagens, que desencorajam a desinformação ao mesmo tempo que respeitam a privacidade. Nós manteremos as medidas efetivas que tomamos e não estamos planejando nenhuma mudança significativa para o WhatsApp no Brasil durante o período eleitoral”, afirmou o executivo.
O temor de especialistas e autoridades recai sobre o fato de que a circulação em massa de mensagens com conteúdo falso, especialmente em ambientes fechados, como o WhatsApp, foi apontada como uma ameaça na eleição de 2018, o que levou autoridades a se mobilizarem para evitar o mesmo cenário este ano. Daqui a seis meses, o país passará por novas eleições presidenciais.
Analistas relacionam o movimento da Meta, empresa dona do WhatsApp, Facebook e Instagram, ao crescimento do concorrente Telegram. No Brasil, o aplicativo russo estava em 53% dos aparelhos em agosto de 2021 (o índice era de 15% três anos antes) e tem uma filosofia de mínima moderação e possibilidade de compartilhamento irrestrito de mensagens e, por isso, virou terreno fértil não para desinformação e compartilhamento de conteúdo criminoso. A plataforma permite a existência de diversos grupos e canais que negociam venda de armamentos, comprovantes de vacina falsos, pornografia infantil, distribuição de vídeos de tortura e execuções e conteúdo nazista e antissemita.
Além disso, o Telegram permite grupos de 200 mil pessoas e canais com número ilimitado de inscritos. O canal de Bolsonaro, por exemplo, possui 1,3 milhão de inscrições.
Após a reportagem do GLOBO, o Ministério Público Federal em São Paulo questionou a empresa, num inquérito civil, acerca da preocupação com o impulsionamento de notícias falsas no aplicativo. A empresa respondeu que “possui uma abordagem responsável em relação à inovação e continua a investir em limites cautelosos em relação à viralização de desinformação, enquanto protege a privacidade das comunicações entre as pessoas”, sem especificar o que seriam “limites cautelosos”.