Investimento estrangeiro no Brasil patina desde 2023. O que isso significa?

Importante métrica da confiança do investidor, o investimento estrangeiro no Brasil tem dado sinais desencontrados

Ilustração do mapa mundial com o Brasil em destaque. Foto: Filo/Getty Images
Ilustração do mapa mundial com o Brasil em destaque. Foto: Filo/Getty Images

As taxas de juros e inflação estão em queda e os ativos domésticos têm preços atrativos.

Adicionalmente, o Brasil é apontado por investidores como um destino privilegiado para investimentos em áreas como energia renovável, semicondutores e biotecnologia.

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Momentaneamente, porém, os fluxos de recursos para o país não conversam com essas avaliações.

Importante métrica da confiança do investidor, o investimento estrangeiro no Brasil tem dado sinais desencontrados desde o ano passado.

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Tanto as operações de curto prazo – basicamente aplicações no mercado financeiro -, quanto as inversões para horizontes maiores indicam estagnação ou queda.

Na B3, o saldo de investimentos de não residentes está negativo em R$ 22,2 bilhões no acumulado do ano até 26 de março.

Gráfico acima mostra o saldo de investimento estrangeiro na B3. O dado foi compilado por Einar Rivero, sócio-fundador da Elos Ayta.

Como eles são a principal classe de investidores da bolsa brasileira, o Ibovespa perdeu força. Mesmo com as ações consideradas baratas.

Assim, o BTG Pactual calcula que o Ibovespa (excluindo Petrobras e Vale) é negociado a 9,8 vezes o preço lucro esperado para os 12 meses seguintes. A média histórica é de 12,3 vezes.

Já o dado de investimento estrangeiro direto (IED), que enquadra entradas para projetos de longo prazo, como obras de infraestrutura, também não é animador.

Após um repique no começo do ano passado, os ingressos perderam força.

Fonte: Banco Central. Gráfico mostra o investimento direto no país

Ruídos

Para especialistas, esse quadro reflete uma combinação de fatores domésticos e externos, incluindo ruídos de conjuntura e outros mais estruturais.

Numa mão, sinais de maior intervencionismo do governo em empresas nas quais tem participação assustaram o mercado.

O caso de maior visibilidade foi a surpreendente decisão da Petrobras (PETR4) de não pagar dividendos extraordinários.

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Além disso, a insistência do Palácio do Planalto de tentar emplacar um nome de confiança no comando da Vale (VALE3) também contaminou o humor dos investidores, assim como o embate para tentar reverter partes do processo de privatização da Eletrobras (ELET3).

Diante disso, algumas instituições internacionais agora pedem maior cautela com empresas que tenham o governo como sócio.

Dessa forma, o Goldman Sachs recomendou num relatório recente de estratégia de curto prazo apostar contra ações de estatais.

“O aumento da intervenção nas estatais concentrou a atenção em um prêmio político potencial para as ações e o crédito brasileiros”, afirmou o banco.

Os desenvolvimentos recentes sobre a política de dividendos da Petrobras lembraram aos investidores casos passados de maior envolvimento do governo em empresas estatais, acrescentou.

Num espectro mais amplo, o grupo sujeito a ingerência direta ou indireta do governo responde por quase um terço do peso do Ibovespa.

PIB desacelera e fiscal ainda preocupa

Há outros fatores domésticos que nublando o cenário. Um deles é a expectativa de desaceleração da economia nacional.

Depois de crescer 3% em 2022 e 2,9% no ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) do país deve avançar 1,85% em 2024.

Isso, segundo a previsão do Boletim Focus, a pesquisa do Banco Central com bancos, que também aponta alta de 2% em 2025.

Na divulgação do Relatório Trimestral de Inflação, o BC indicou que o PIB pode subir de 1,7% para 1,9%.

Em outra frente, ainda há uma preocupação com as contas públicas federais, em particular a meta de déficit fiscal zero neste ano, na qual a maioria do mercado não acredita.

Em relatório recente, o JPMorgan considerou que a arrecadação recorde no primeiro bimestre amenizou as preocupações com a dinâmica fiscal.

Porém, “um caminho mais desafiador está adiante”, afirmou o JPMorgan, alertando que o governo conta com receitas de “fontes incertas”.

Dessa forma, o banco também alertou para a possibilidade de despesas maiores com previdência, o que ainda não está na conta.

Fator Estados Unidos

Por fim, pelo menos um fator determinante para os fluxos estrangeiros de curto prazo para o Brasil está relacionado ao juro nos Estados Unidos.

No final do ano passado, com a expectativa de que a taxa básica dos Estados Unidos começasse a cair neste mês, o ingresso de dinheiro nas bolsas do mundo todo foi impulsionado, inclusive a brasileira. (veja tabela abaixo).

Hoje a taxa norte-americana está na faixa de 5,25% a 5,5% ao ano – o pico em mais de 20 anos.

Com o repique da inflação norte-americana no começo de 2024, a aposta no início de corte no juro migrou para junho, segundo o FedWatch.

Isso frustrou investidores, que desfizeram parte das apostas em ativos de maior risco, como ações.

Brasil atrativo no longo prazo

Mesmo com todos esses problemas, o Brasil figurou nos últimos anos entre a terceira e a quarta posições no ranking dos maiores destinos de investimento estrangeiro direto.

Segundo Daniel Gewehr, estrategista-chefe do Itaú BBA, ao lado de México e Índia, o país é um dos mercados mais promissores para estrangeiros nos próximos anos.

Pesam a favor do Brasil aspectos como a agronegócio forte, a vocação para energias renováveis, além de oportunidades destacadas em áreas como indústria e infraestrutura.

“Além disso, o país ganhou mais atenção internacional principalmente porque houve redução de atratividade de outros mercados, como a China”, disse Joelson Sampaio, professor de Economia da FGV EESP.

Outros especialistas citam que a guerra da Rússia com a Ucrânia e o conflito em Israel também tornou essas geografias menos atraentes.

Fonte: Banco Mundial. Trata-se do ingresso de investimento estrangeiro direto no Brasil.

Ingressos internacionais

Nesse aspecto, a expectativa por volumes crescentes de ingressos internacionais para o Brasil ganha ainda mais relevância.

Primeiro porque ele é um componente importante dos investimentos totais na economia, que incluem também capitais privado e estatal domésticos.

E a foto mais recente desse dado, chamado Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), também não traz boas notícias, com queda de 3,4% em 2023, segundo dados do IBGE.

Para garantir um nível satisfatório de crescimento econômico para um país como o Brasil, economistas avaliam que esse índice deveria ser de 20% a 25% do PIB.

Desde 2015, a taxa brasileira oscila entre 16% e 19%, segundo dados da Fundação Getulio Vargas (FGV).

No governo liberal de Jair Bolsonaro (2019-22), esse índice cresceu apoiado parcialmente na venda de participações em estatais.

Com a orientação do governo Lula de suspender privatizações, os recursos estrangeiros para investimentos tendem a ficar mais concentrados em concessões públicas, parcerias público-privadas (PPPs) e nos investimentos de multinacionais, incluindo fusões e aquisições.

Por enquanto, esses ingressos não são suficientes para compensar a menor entrada de capitais com as desestatizações.

Andar mais rápido

Outro fator importante da entrada de maior IED é a melhora da qualidade do crescimento econômico.

Investimentos internacionais implicam maior transferência de tecnologia, aumento de produtividade e da capacidade de exportações.

Captar uma fatia maior do bolo de investimentos globais, porém, demanda um amplo conjunto, que envolve segurança jurídica, aparato regulatório e estrutura de impostos, entre outros.

Nesse sentido, alguns avanços estruturais foram alcançados pelo Brasil, disse Sampaio, como a reforma tributária.

Adicionalmente, o governo está no caminho da regulamentação da Lei Cambial, prevista ainda para 2024, que deve criar um ambiente mais amigável para investimentos.

Em outra frente, o governo acaba de regulamentar as debêntures de infraestrutura, que cria incentivos fiscais para investimentos de longo prazo no setor.

Apesar dessas e outras iniciativas, o Brasil nos últimos anos perdeu espaço nos rankings internacionais de competitividade.

Um dos tendões de Aquiles do país é o baixo nível educacional, apesar dos crescentes gastos estatais no setor.

E uma das consequências desse quadro é a baixa produtividade média do trabalhador.

Em relatório publicado em março, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) apontou que o crescimento da produtividade no Brasil e na América Latina é “preocupantemente baixo”.

E que para mudar isso, a região precisa se encaixar nas cadeias globais de valor e de investimento estrangeiro.

A Inteligência Financeira é um canal jornalístico e este conteúdo não deve ser interpretado como uma recomendação de compra ou venda de investimentos. Antes de investir, verifique seu perfil de investidor, seus objetivos e mantenha-se sempre bem informado.

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