Decisão de juros do Fed: ainda há espaço para um novo aumento?

A inflação de maio, acompanhada pelo banco central dos EUA, veio acima do esperado, reforçando o discurso do Fed de que ainda há espaço para mais um aumento de juros

Wall Street: mercado de capitais global. Foto: Pixabay

Tema das últimas semanas, o receio, fantasma ou monstro do teto da dívida dos Estados Unidos (EUA) foi embora. Ou, pelo menos, o problema foi postergado por dois anos, com o “waiver” concedido pelo Congresso dos EUA. Na prática, não houve aumento do teto de gastos, mas sim a eliminação temporária do limite de despesas do governo por dois anos, até 1º de janeiro de 2025.

Passada a eleição de 2024, voltaremos a discutir a matéria. Sim, nada foi resolvido, a alternativa adotada foi empurrar com a barriga. Não por acaso, vários republicanos criticaram o acordo. Inclusive o candidato às primárias do partido e governador da Flórida, Ronald De Santis.

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Ainda assim, como contrapartida da eliminação temporária do teto, houve um congelamento de uma série de gastos do governo democrata do presidente Joe Biden, os quais só podem ser aumentados em 1% nos próximos 2 anos.

Estima-se que a legislação reduza os déficits do governo em cerca de US$1,5 trilhão ao longo de uma década em comparação com o texto base inicial, de acordo com o Congressional Budget Office. Aqui está o texto completo que foi aprovado na Câmara.

Enfim, dos males o menor, por hora o tema parece resolvido e o #nãoVaiTerCalote venceu.

E agora? Tudo sobre juros

Com a questão do teto da dívida resolvida, o foco do mercado volta a ser o ‘antagonista’ de sempre: os juros. O banco central dos EUA (Federal Reserve, Fed na sigla eem inglês) se reúne nos dias 13 e 14 de junho para definir as taxas de juros e as apostas são para a manutenção da faixa entre 5% e 5,25%, embora com elevada incerteza. Tenho notado muitas mudanças nessas percepções.

Ainda assim, vimos as curvas de juros “abrindo” (yields aumentando), sinalizando que essa interpretação ainda guarda certa reserva ou dúvida, à medida que os dados da economia americana têm surpreendido positivamente.

Olhando para o curto prazo, a julgar pelos últimos dados, ainda há espaço para mais um aumento de juros. O dado de inflação acompanhado pelo Fed, o PCE, veio acima do esperado, reforçando o discurso do Fed de que ainda há muito trabalho a ser feito no combate à inflação. Olhando adiante, a tendência é de desaceleração.

O mercado de trabalho não desacelera

Apesar de se falar muito em recessão e/ou desaceleração na economia, uma vez por mês somos surpreendidos com um novo relatório do mercado de trabalho (Payroll), mostrando a pujança da economia americana.

São 29 meses consecutivos de geração positiva de postos de trabalho. Na semana passada, esperava-se a criação de 180 mil postos de trabalho; o relatório mostrou a criação de 339 mil. Algumas coisas chamaram atenção:

  • Houve aceleração da criação de postos de trabalho nos últimos 3 meses;
  • A revisão dos números de março foi para cima em 52 mil, de +165 mil para +217 mil, e a variação de abril também foi revisada para cima em 41 mil, de +253 mil para +294 mil;
  • Os salários cresceram menos que o esperado, o que foi bem-visto pelo mercado – renda crescendo menos traz a leitura de menos pressão sobre o consumo e, consequentemente, inflação menor.

Dois mundos no mercado americano

Na semana passada, comentei que temos visto dois mundos no mercado americano: refiro-me à forte alta de um universo de 10 ou menos ações que respondem por grande parte da alta do índice S&P500.

A explicação para esses dois mundos no mercado acionário dos EUA está nas expectativas exageradas em relação aos impactos do desenvolvimento da inteligência artificial na economia e em algumas empresas. Enquanto as outras ações refletem de forma mais fidedigna o cenário desafiador que as empresas enfrentam na economia.

Essa dinâmica tornou ainda menos atraente a alocação mais robusta em bolsa, ou em algumas empresas ou setor específico de tecnologia, que negocia com um elevado prêmio sobre outros setores. O Equity Risk Premium – prêmio por investir em ações em comparação com a alocação em Treasury bond (títulos do governo dos EUA) – está em um dos patamares mais baixos dos últimos anos. Mantemos nossa postura cautelosa com a classe de ativos e preferimos esperar um cenário melhor para uma alocação acima da média.

China decepciona

Muito se esperava que a reabertura da China e a flexibilização da política de Covid-zero pudessem impulsionar o crescimento global e gerar demanda adicional para sustentar os preços das commodities. Até agora, essa realidade tem sido frustrante. Os dados apresentados pela China têm ficado aquém do esperado.

Recentemente, algumas empresas têm salientado certa incerteza com o crescimento da segunda maior economia do mundo. As ações da Estée Lauder (EL) tiveram sua maior queda diária já registrada, depois que a empresa reduziu suas perspectivas de vendas, citando pressões na China e em outras partes da Ásia.

A Starbucks (SBUX) e a Qualcomm (QCOM) também sinalizaram incertezas relacionadas ao país, que é um mercado importante para ambas. Na semana passada, o índice oficial de gerentes de compras (PMI) da indústria caiu para 48,8, o menor nível em 5 meses, segundo o Escritório Nacional de Estatísticas (NBS) – lembrando que esse é um indicador que, abaixo de 50, mostra contração (redução) da atividade. O setor de serviços expandiu no ritmo mais lento em 4 meses em maio, com o PMI não manufatureiro oficial caindo de 56,4 para 54,5.

O impacto tem sido sentido nos preços das commodities. Na semana passada, o índice Dow Jones de commodities atingiu a mínima de 18 meses.

Hegemonia americana

Na faculdade de economia, aprendi que o PIB (Produto Interno Bruto), que é uma medida de riqueza e tamanho da economia, é uma função de três fatores: capital monetário (recursos financeiros), capital humano (quantidade de trabalhadores) e capital intelectual (tecnologia e produtividade dos trabalhadores). Ou seja, o PIB depende ou deriva da capacidade dos países em conjugar esses fatores.

Países como a China possuíam e possuem uma massa de trabalhadores; o Japão deu um salto de tecnologia e produtividade desde a década de 80; o capital monetário europeu ajudou países como a Irlanda a crescer e ter uma das melhores qualidades de vida do mundo; e os EUA conseguiram agregar os três fatores com qualidade, o que os tornou a maior economia do mundo.

Ora, mas o que acontece quando a população envelhece e há menos trabalhadores em idade produtiva? Em tese, perde-se a capacidade de crescimento do PIB e/ou riqueza na sociedade. Esse é um dilema ou uma dificuldade enfrentada por diversos países atualmente. Pode-se ter capital monetário, intelectual (tecnologia), mas ainda é preciso ter pessoas para ajudar a construir ou manter essa riqueza.

Os EUA têm e atraem capital, estão na vanguarda da tecnologia e conseguem atrair trabalhadores que compensem o envelhecimento da população. Será que eles perdem a hegemonia econômica tão facilmente como alguns dizem?

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