Catar: como o país deixou de ser pobre para se tornar um dos mais ricos do mundo em 50 anos
Inflação e desemprego são baixos, mas região vive uma ditadura
Quem vê fotos do Catar de meados do século passado, se impressiona com a mudança da paisagem ao longo dos anos.
Com um território do tamanho de Sergipe, o menor Estado brasileiro, e uma população de menos de 3 milhões de pessoas, a região desértica era antes reservada a beduínos e pescadores.
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Porém, em algumas décadas surgiram cidades mais modernas e o país com a quarta maior renda per capita do mundo, taxa de inflação 2,3% ao ano e desemprego de apenas 0,6%.
E veja: o produto interno bruto (PIB) per capita do país é de US$ 85 mil, o que eleva o Catar para o sexto melhor do planeta.
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Catar muda relação com petroleiras
Para entender a grandiosidade dessas mudanças no país sede da Copa do Mundo, é preciso voltar um pouco no tempo.
O país é um emirado, ou seja, governado pela classe dominante descendente da dinastia que controla a região desde o início do século XIX.
Até 1914, o Catar pertencia ao Império Otomano, e com o fim da primeira guerra, se tornou um protetorado britânico. O processo de descobertas de petróleo caminhava de maneira lenta, e as primeiras reservas de óleo só começariam a ser comercializadas em 1949, com o fim da segunda guerra.
Mas a grande transformação se deu na década de 1970, quando o Catar se tornou independente. A autocracia local determinou a nacionalização de empresas estrangeiras exploradoras de petróleo, mas em pouco tempo, optou pela melhor forma de explorar suas reservas.
Cinco anos após as nacionalizações, devolveu a exploração dos campos às antigas petroleiras, mas dessa vez, como concessionárias.
Do que vive o Catar?
A perspicácia na exploração de suas gigantescas bacias de hidrocarbonetos não parou por aí. Com o passar dos anos, preocupados com os ciclos do petróleo, a economia do Catar se voltou também para a exploração de gás. Hoje, detentora da terceira maior reserva do mundo, o gás já é mais importante que a exploração de petróleo no país.
O país tem uma grande reserva de gás natural e petróleo, com extração de 600 mil barris por dia. E isso permite que o Catar mantenha a atual produção por 56 anos. O país foi a primeira nação árabe a integrar a Opep, o cartel dos países produtores de petróleo, em 1960.
E, tradicionalmente, a principal base econômica da região foi durante anos a extração de pérolas. O petróleo foi descoberto nos anos 40.
Foi nessa onda que na década de 1990 a expansão comercial internacional do emirado se acentuou. Foi criada a Qatar Airways, considerada a melhor companhia aérea do mundo nos últimos dois anos, e a criação da Al Jazeera, maior empresa de mídia do Oriente Médio.
E o fluxo de investimentos não para por aí.
Diversificação dos negócios é o modelo de investimentos faz parte da gestão das reservas qatari há muito tempo. Todo esse dinheiro precisava ser aplicado também em outros ramos. É de lá também a Qatar Sports Investments (QSI), grupo que controla o clube de futebol francês Paris Saint-Germain e que, recentemente, também comprou 21,67% das ações do clube Braga, de Portugal.
Lembrando, que a QSI é apenas um dos braços do Fundo Soberano do Catar (Qatar Investment Authority), fundo do país com quase U$$ 500 bilhões em ativos. O super fundo de investimentos também é o dono de um percentual do fundo Brookfield, do icônico Empire State Building, nos Estados Unidos e de 10,5% das ações da montadora alemã Volkswagen.
Números astronômicos e polêmicas
As cifras enormes explicam a quantia astronômica investida na Copa de 2022, a mais cara de todos os tempos. E de longe. O Catar gastou U$$ 220 bilhões, quase 19 vezes a mais do que a Copa de 2018, na Rússia (US$ 11,6 bi), e 14 vezes a mais o custo da Copa de 2014, no Brasil (US$ 15 bi). Um país com tanto dinheiro, índices sociais de primeiro mundo, mas nem por isso, imune a um olhar um pouco mais atento.
Segundo o jornal britânico The Guardian, desde 2010, mais de 6 mil trabalhadores imigrantes morreram nas obras da Copa do Mundo. Os trabalhadores eram submetidos a contratos de trabalho, que previam até mesmo a retenção de passaporte, em caso de descumprimento de cláusulas. A regra, conhecida como Kafala – um tipo de escravização moderna – só sofreu flexibilizações por conta de denúncias de entidades internacionais e com a aproximação da Copa.
De acordo com a Anistia Internacional, no caso dos trabalhadores domésticos, muitos ouvidos disseram trabalhar mais de 14 horas por dia, sem nenhuma folga semanal.
Além dos que declararam serem insultados, cuspidos ou agredidos fisicamente.
Segundo reportagem da BBC, a realidade econômica dos imigrantes, cerca de 90% da população do país é distinta dos nascidos no país.
Os estrangeiros, muitos dos vindos de Bangladesh, Índia, Nepal e Paquistão, países pobres da Ásia, recebem salários, em média, muito mais baixos que os locais.
Um trabalhador migrante da área de construção ganha cerca de US$ 2 mil anuais. Já os cidadãos locais têm um salário médio de cerca de US$ 700 mil por ano.
Catar vive uma ditadura
O Catar não é uma democracia. Todas as decisões são tomadas pela dinastia Al Thani e seus conselheiros.
E, logo, os cidadãos não têm influência nos rumos do país.
Eles recebem alguns benefícios derivados das riquezas naturais.
O governo distribui incentivos para contar com a lealdade e apoio dos catarianos.
Veja abaixo uma lista de alguns dos benefícios que os cidadãos do Catar têm:
- Não pagam Imposto de Renda;
- Há muitos empregos com altos salários no setor público;
- Sistema de saúde gratuito;
- Educação superior gratuita;
- Apoio financeiro para quem se casa;
- Auxílio moradia;
- Subsídios para a conta de energia;
- Boas aposentadorias
Como as mulheres são tratadas no Catar
Em um relatório de 2021, a Human Rights Watch documentou que as leis, regulamentos e práticas do Catar impõem regras discriminatórias de tutela masculina, que negam às mulheres o direito de tomar decisões importantes sobre suas vidas.
As mulheres no Catar devem obter permissão de seus guardiões do sexo masculino (membros da família do sexo masculino) para se casar, estudar no exterior com bolsas do governo, trabalhar em muitos empregos do governo, viajar para o exterior até certas idades e receber certos cuidados de saúde reprodutiva.
O código penal do Catar criminaliza todas as formas de sexo fora do casamento, com sentenças de até sete anos de prisão. Se forem muçulmanas, também podem ser condenadas a açoitamento ou apedrejamento.
Relação sexual entre homens é punida
O relatório da ONG também informa que o código penal do Catar pune relações sexuais consensuais entre homens maiores de 16 anos com até 7 anos de prisão.
O código prevê também penas de um a três anos para qualquer homem que “instigue” ou “estimule” outro homem a “cometer um ato de sodomia ou imoralidade”.
A pena de até 10 anos é imposta a quem se envolver em relações sexuais consensuais, o que pode ser aplicado a relações homossexuais consensuais entre mulheres, homens ou parceiros heterossexuais.