Crédito ‘turbinado’, mais bolsa dos EUA e menos moeda chinesa: como pensa a Absolute?

Em entrevista exclusiva ao íon, o cofundador Tiago SantAnna explica a filosofia da Absolute Investimentos, que completou uma década neste ano com destaque para posições fora do consenso

"Estamos otimistas com as bolsas, mas particularmente em relação aos Estados Unidos", disse Tiago SantAnna, da Absolute - Foto: Vinícius Andrade
"Estamos otimistas com as bolsas, mas particularmente em relação aos Estados Unidos", disse Tiago SantAnna, da Absolute - Foto: Vinícius Andrade

O que é preciso para se manter relevante no mercado brasileiro de fundos de investimento? Já faz tempo que a grande concorrência neste meio fez a barra subir na indústria de gestão de recursos. Grande conhecimento e experiência comprovada de anos já não são atributos tão diferenciais assim. Cabe a cada gestora traçar estratégias para se descolar umas das outras e se destacar em um mercado tão competitivo.

A Absolute, que completou 10 anos neste ano, vem assumindo um lugar de destaque com uma gestão que preza por um olhar macroeconômico apurado.

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Não à toa, dentre R$ 33 de bilhões sob gestão, mais de 80% correspondem a dois fundos multimercado com a estratégia Macro – ambos superando as expectativas de retorno.

O fundo Absolute Hedge, desde 2013, acumula uma rentabilidade de cerca de 120% do CDI, enquanto o fundo Absolute Vertex, desde 2015, acumula um retorno de 180% do CDI.

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Mas como manter a consistência ao longo de anos? É isso que Tiago SantAnna, um dos fundadores da gestora, respondeu em entrevista exclusiva para a coluna Pano de Fundo, do Feed de Notícias do íon.

No bate-papo, que você confere abaixo, SantAnna conta que incrementar e turbinar a vertical de fundos de crédito é o próximo grande passo da gestora.

O executivo falou também das principais posições atuais da carteira, com destaque para a aposta contra a moeda chinesa e para o otimismo com a Bolsa dos Estados Unidos.

Qual é o pano de fundo da Absolute considerando o aniversário de 10 anos da casa?

De forma geral, eu vejo a empresa num momento muito maduro. A gente teve um processo de crescimento gradativo ao longo do tempo, muito pensado em cada etapa. Hoje gerimos R$ 33 bilhões dos nossos clientes e temos quatro verticais de atuação. Isso não veio da noite para o dia. Começamos em 2013 com duas estratégias, Macro e Arbitragem, dentro do mundo de multimercados. Ao longo do tempo fomos consolidando tanto a empresa, do ponto de vista de trazer pessoas, melhorar processos, quanto de identificar novas frentes que poderíamos atuar. Em 2018, trouxemos uma equipe de equities para entrar em Fundos de Ações. E, no ano passado, abrimos uma área de crédito, para iniciar no mundo High Grade.

Durante esses 10 anos, teve algum contratempo muito grande que vocês chegaram a pensar em desistir?

Apreensão sempre há por empreender e por começar algo do zero. Mas a gente sempre calibrou muito bem a empresa desde o início e a gente sabe que o business (gerir uma asset) é cíclico e não é trivial. A gente tinha uma experiência muito grande já em gestoras de recursos. E vemos ainda no Brasil muitos profissionais inexperientes em montar uma empresa de gestão. Existem muitos bons gestores em tesouraria, em bancos, mas muitos não têm o conhecimento do business. Quando a gente foi montar, conhecíamos muito a área, já sabíamos como funcionava e conseguimos equilibrar muito bem investimento de pessoas em conjunto com o crescimento na captação de recursos para os nossos fundos. Então a gente nunca se colocou em uma situação que nos colocasse em xeque. Nunca tivemos em uma situação periclitante ou naquele “vai ou racha”, felizmente.

A grande parte dos fundos da Absolute tem como foco a estratégia Macro. Como foi lá atrás essa decisão de começar assim e como isso se consolidou?

Em todas as nossas outras áreas aqui, bolsa, Arbitragem e Crédito, a gente pode dizer que somos especialistas, com gente muito gabaritada na análise de ativos e na gestão. De fato, temos um histórico mais longo nos fundos Macro e é uma estratégia que aceita mais volume do que outras como Bolsa, por exemplo, tanto por demanda quanto por oferta aqui no Brasil. O projeto lá em 2013 foi capitaneado pelo Fabiano Rios, que já vinha com uma bagagem muito boa em Macro quando ele era da Tesouraria do Santander. Então, foi muito natural usar essa expertise que ele já tinha.

Há um ano, vocês começaram uma operação nova aderindo aos fundos de crédito. Como foi essa decisão e por quê?

Sempre quando a gente faz um movimento novo, eu tento trazer duas óticas de racional para tomar uma decisão. O primeiro é o lado do negócio, no qual a gente vê um mundo mais desafiador para a indústria de fundos. A barra está subindo. Os clientes demandam mais governança, mais processos, a própria legislação vem exigindo cada vez mais uma maior robustez na estrutura e isso faz com que passe a fazer sentido que pessoas muito boas, que teriam capacidade de montar seu próprio negócio, se juntem a uma estrutura já montada. Então, tanto na parte de Ações quanto na de Crédito entramos e trouxemos grandes profissionais porque foi uma oportunidade tanto do ponto de vista de negócio e também do ponto de vista de ter melhores produtos para os clientes. E é interessante isso porque, por exemplo, uma área de crédito agrega valor para fundos de outras áreas, como Macro e Ações, complementando e ajudando a gestão dessas outras verticais.

Logo quando vocês começaram com os fundos de crédito, houve a crise da Lojas Americanas, que acabou impactando o mercado. Como vocês lidaram com isso?

Do ponto de vista de gestão foi muito positivo porque não tínhamos na carteira nenhuma das empresas que deram problema. Do ponto de vista de captação foi um desafio, mas no médio prazo vai ser positivo porque, mesmo na época com um fundo novo, a gente montou a carteira e, deliberadamente, escolheu não ter certos ativos. E olha como nossas áreas se ajudam muito: nossa visão para os fundos ajudou na escolha de ativos para os fundos de crédito. Então, o macro é muito relevante, ainda mais em um país cíclico como o Brasil. Quando fomos montar a carteira, não era a carteira que tinha o legado de quem montou quando os juros do Brasil eram 2% ao ano. Foi uma visão de juros em patamares maiores, de mais desafio do ponto de vista de atividade econômica, então, com isso, evitamos alguns setores. Essa visão nos ajudou a construir uma carteira que passou ilesa a essa crise.

E qual é o próximo passo da Absolute? Vem algo novo por aí?

O que a gente pensa é se aprofundar no crédito. A gente montou uma área de crédito High Grade, que a gente acha um passo inicial mais natural. E agora devemos ir para um crédito mais estruturado, que são aquelas operações mais específicas e que vão mais no detalhe de empresas até menores. Você precisa muitas vezes entender o contrato da operação, saber as garantias da companhia. Ou seja, é um desafio maior do ponto de vista de análise, mas a intenção é buscar um retorno potencial maior.

Nas cartas que vocês divulgam ao público, há algumas posições “zeradas”. Como a Absolute lida com os riscos dentro do processo de investimento?

Ficar zerado em alguns mercados é muito comum dentro do nosso processo de investimentos. A gente entende que esse movimento faz parte do instrumental de um gestor, mesmo que o fato de não tomar risco, com isso, não seja algo tão trivial. A consistência que entregamos nos fundos tem a ver com as posições zeradas que tivemos justamente por termos evitado, com isso, grandes perdas ao longo do tempo. Uma coisa que fizemos muito bem ao longo dos últimos dez anos é investir muito em análise econômica e de pesquisa, sempre checando e entendendo o que está no preço dos ativos. A ideia é: se você achar uma informação que ainda não está refletida no preço é exatamente aí que mora a tão falada assimetria. Se não está no preço, a tendência é ganhar muito se a aposta for certa. E, caso a aposta esteja errada, a tendência é perder pouco. Quando a nossa leitura já está no preço de determinado ativo a gente prefere ter riscos mais leves e ficar em posições mais zeradas esperando as grandes oportunidades aparecerem. Essa é a grande arte de um bom gestor.

Sobre as posições recentes da Absolute, na última carta vocês mencionam uma mudança de estarem “zerados” em juros. Por que houve esse movimento?

Especificamente juros, estamos zerados porque não vemos grandes assimetrias e oportunidades considerando o que já está precificado. A gente acha que o que tem de corte de juros implícito pelo mercado já é o suficiente e entrar em juros nesse patamar não é algo que vemos como grande oportunidade. Estamos aguardando um pouco o mercado exagerar para algum dos lados para apostar em juros de novo. Nos EUA, também estamos zerados em juros porque tem sido um mercado muito volátil nos últimos tempos e porque não vemos mais, com esse patamar de juros, uma grande oportunidade.

A Absolute vem assumindo neste ano uma posição otimista e de compra da Bolsa do Brasil e das Bolsas nos EUA. Quais são os motivos?

Estamos otimistas com as bolsas, mas particularmente em relação aos Estados Unidos. Enxergamos no mercado norte-americano uma atividade econômica muito forte e com inflação em ritmo de queda. Na nossa visão, o risco de uma alta elevada de juros por lá caiu por terra, principalmente depois da quebra de alguns bancos, que começou com o Sillicon Valley Bank. O Fed (Banco Central dos EUA) foi muito claro para uma política monetária de sintonia fina. Ou seja, sai o risco de uma grande elevação de juros e, assim, passa a ser uma política monetária em que o BC dos EUA adota uma postura de maior acomodação sobre a inflação, apenas em tom de ajuste. E o mercado como um todo vem com uma narrativa totalmente oposta, esperando uma grande recessão na economia norte-americana, totalmente fora de posições otimistas em ativos de risco. Foi assim que vimos uma assimetria muito grande e, consequentemente, uma oportunidade.

E na Bolsa brasileira, onde estão as oportunidades?

A gente acredita que o grande movimento de alta generalizada, pela perspectiva de queda dos juros no Brasil, já foi. Agora, o nome do jogo é seletividade via escolha a dedo de ações na Bolsa. A gente gosta dos setores de Utilities (empresas que oferecem serviços essenciais, como água, energia e saneamento), Petróleo, Commodities e, inclusive, voltamos a comprar Vale.

Sobre a preferência pela Vale, o quanto isso tem a ver com a China?

Nossa compra de Vale não é em função do minério e do desenvolvimento da China. É pelo valuation da Vale, que está muito atrativo depois de uma perda muito grande. A gente acredita que a empresa vai reverter o quadro e apresentar bons resultados. Na verdade, em relação à China, uma posição importante que temos neste ano é de venda na moeda chinesa. Essa aposta nos deu um resultado positivo até então e é o tipo da posição que gostamos pela assimetria e pela oportunidade. Tem um diferencial de juros do dólar contra a moeda chinesa e tem também um diferencial do desenvolvimento econômico dos EUA contra o da China. São dois vetores importantes que colocam a moeda chinesa em depreciação em relação ao dólar.

Vocês se consideram uma gestora com um viés contrário ao consenso?

A gente se considera agnóstico, sem um viés preestabelecido. Tem um ponto muito importante aqui: não somos contrarian por definição, mas a nossa busca por assimetria do mercado é muito relevante. E as grandes assimetrias tendem a acontecer quando se tem uma visão dissonante do consenso. Mas a gente participa de trades de consenso com alguma frequência também. A única coisa é que, quando você está no consenso, tem muito essa cabeça de que você estiver errado, você vai estar errado junto com todo mundo, e é aí que os grandes problemas acontecem. Somos agnósticos porque não dá pra operar só de forma oposta ao mercado, é um tipo de estratégia muito difícil de carregar para o cliente e também muitas vezes o consenso está certo e se ganha muito dinheiro.

*Texto de Leonardo Pinto, CEA, jornalista e editor do Feed de Notícias do íon, onde o artigo foi publicado originalmente. Para ler este e outros conteúdos, acesse ou baixe o app agora mesmo.

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