De cruzeiro para real: 30 anos da saga brasileira
Investimentos demonstram a capacidade de proteger (e aumentar) o poder de compra no longo prazo
“2.750!”, gritou o meu colega na mesa de operações do banco. Foi a primeira vez que me lembro de ter ouvido esse número. Nem passou perto da minha mente a ideia de que 30 anos depois esse número ainda estaria na minha memória, muito menos em um artigo como este. Esse seria o último valor da URV, indexador criado para fazer a transição do cruzeiro para o real.
Quanto valeria o real?
Nas semanas anteriores, tinha havido importantes debates entre os economistas sobre qual seria esse número.
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Lembro-me de alguém que chegou a citar 3.000, um número mais redondo, mas o cálculo da URV era feito pelo Banco Central de forma a acompanhar o dólar, que por sua vez acompanhava os índices de inflação e 3000 não combinava em nada com a lógica do cálculo.
A questão da troca de moedas tinha sido comum nos anos anteriores, mas em todos os casos deu-se pelo simples corte de três zeros. Por isso, o número 2.750 trazia uma complexidade especial para a vida das pessoas, mas o Brasil tirou de letra.
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Saí do trabalho na Rua Boa Vista para pegar o metrô na estação São Bento. Era o fim do mês de junho de 1994, a noite estava com o frio característico de São Paulo nessa época. Embora o mês tivesse sido ainda mais frio do que o normal, a temperatura média foi de 17 graus. Mas os termômetros da cidade tinham marcado apenas 1 grau nas madrugadas em alguns pontos da cidade.
Morte de Senna e a seleção brasileira
O Brasil se dividia entre o luto da ainda recente morte de Ayrton Senna e um sentimento de esperança com a seleção brasileira de futebol. O time tinha passado em primeiro lugar no seu grupo na copa dos EUA, embora um empate em 1 a 1 contra a Suécia, no último jogo da primeira fase tivesse deixado um gosto amargo na boca.
Havia um certo tom de preocupação, pois o adversário nas oitavas seria a seleção do país sede e, para complicar as coisas, em 04 de julho, dia da independência dos EUA.
Esse tom de preocupação esperançosa também permeava a visão sobre o Plano Real, já que os diversos planos de estabilização anteriores tinham tido vida curta.
Análise sem ruídos
A grande vantagem de analisar os acontecimentos depois de uma longa janela de tempo (e isso vale não apenas para a transição do cruzado para o real) é que conseguimos retirar todos os ruídos que ocorreram no caminho.
Diversos governos passaram, tivemos guerras e crises mundiais, tecnologias apareceram e tomaram conta do mundo. E, no fim das contas, me atreveria a dizer que a maioria esmagadora dos acontecimentos não passou de sustos ou de alegrias passageiras.
Plano Real e o controle da inflação
O Plano Real foi eficiente no controle da inflação ao estabilizar a moeda, trazendo mais previsibilidade econômica. A inflação é prejudicial para a população, especialmente as pessoas de baixa renda, pois reduz o poder de compra e impacta negativamente a qualidade de vida. Do ponto de vista do investidor, vale sempre lembrar que os investimentos precisam ter ganho real, ou seja, rendimento acima da inflação.
Vamos a alguns dados a partir do Plano Real (dados atualizados em meados de junho de 2024):
- Inflação acumulada de 704%, ou 7,19% ao ano em média;
- O dólar rendeu 429%, abaixo da inflação;
- Apesar das visões nem sempre positivas sobre a bolsa, ela rendeu 3.258%, transformando R$ 10 mil em aproximadamente R$ 330 mil;
- O S&P500 rendeu 1.086% em dólar ou 5.645% em real, refletindo a força da economia americana (e batendo com folga o Ibovespa);
- Por fim, o CDI rendeu 8.000%, ou 15,75% ao ano em média (batendo todos os índices).
Os dados acima deixam claro que os investimentos têm demonstrado capacidade de proteger (e aumentar) o poder de compra. Além de destacarem a força do longo prazo como gerador de riqueza nos investimentos.
Lições do Plano Real
Ecoa na minha mente a frase de “O Grande Gatsby” de F. Scott Fitzgerald: “E assim avançamos, barcos contra a corrente, incessantemente empurrados de volta ao passado”.
Essa frase nos convida a uma reflexão profunda sobre como olhar para trás nos permite aprender com as lições da história, compreender nossos erros e sucessos, e aplicar esses aprendizados ao avançar.
O passado serve como um guia valioso, fornecendo insights sobre como superar desafios, construir um futuro mais sólido e evitar repetir os mesmos equívocos.
Ao reconhecer e honrar nossa jornada pregressa, somos capacitados a navegar em direção a um amanhã mais promissor.
Então, assim como os barcos que enfrentam a correnteza, podemos encontrar força no conhecimento e sabedoria acumulados ao longo do tempo. O passado é uma bússola que nos orienta em direção a um futuro mais consciente e próspero.