Rendimento da poupança não segura investidor: para onde está indo o dinheiro da caderneta?
Fuga do rendimento estável da poupança está ligada ao déficit de R$ 87 bilhões da caderneta em 2023; geração Z pode estar por trás.
Mesmo ligada aos juros, o rendimento da poupança não vem sendo atraente a ponto de a caderneta ter uma captação líquida positiva. Pelo contrário: em 2023, o saldo do produto, considerado a porta de entrada em investimentos, foi negativo em R$ 87,819 bilhões.
Especialistas ouvidos pela Inteligência Financeira apontam que o investidor da poupança vem migrando para outras modalidades de renda fixa, especialmente as que apresentam rendimentos diários frente à poupança. Ganham, neste cenário, os títulos prefixados, que oferecem o rendimento do produto no contrato.
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Rendimento da poupança é parecido há 2 anos
A caderneta, de maneira geral, vem sangrando recursos desde 2021, quando terminou o ano com saldo negativo de R$ 34,7 bilhões. O rendimento da poupança, a partir de dezembro daquele ano, passou a aumentar seguindo a alta dos juros. Quando a Selic subiu para 9,25% por decisão do Copom (Comitê de Política Monetária do BC), a poupança passou a render por mês 0,5% mais a TR (Taxa de Referência).
Apesar de a TR variar porque é uma taxa de juros para reajuste da poupança, o investimento tem um rendimento parecido há 2 anos.
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De acordo com especialistas, o baixo rendimento, apesar da isenção de impostos, é um dos fatores que explica a fuga de recursos da poupança.
Com a taxa Selic em alta pelos últimos 3 anos até atingir o teto de 13,75% em 2023, outras aplicações ganharam destaque com retornos atrativos, mesmo com o desconto do Imposto de Renda. Esta é a avaliação de Lucas Queiroz, estrategista de renda fixa do Itaú BBA.
Para Queiroz, o saque da poupança em 2023 tem similaridade com o período entre 2015 e 2016, quando a caderneta também ficou no vermelho.
“Em 2015 e 2016 tivemos saques (na poupança) também. Os momentos são diferentes, mas a similaridade é a taxas de juros elevada. Acho que este é um grande fator que explica os saques de 2023”.
O mercado está ganhando o dinheiro que sai da poupança?
Para especialistas, o rentista que está saindo da poupança está escolhendo, principalmente, produtos de crédito privado.
Isso porque, diz Adriana Siebert, superintendente da plataforma digital de investimento do banco Daycoval, o fenômeno de bancarização dos brasileiros contribuiu para que o mercado desenvolvesse produtos mais atrativos que a poupança em termos de rendimento, e a um risco igual ou maior. Títulos de emissão bancária, como CBD, LCI e LCA.
A executiva do Daycoval vê o CDB como “mais atrativo” para quem sai da poupança. “Olhando racionalmente os números, parece que a maior parte do dinheiro da poupança foi para o CDB. Dentro dos R$ 2 trilhões do total investidos em renda fixa, o CDB representa hoje mais de 50% do montante”, afirma Adriana.
A migração do dinheiro também tem como destino o mercado fiduciário. Apesar de um ano sofrido para a indústria como um todo, os fundos de renda fixa se destacaram em novembro pela captação líquida de R$ 25,4 bilhões, de acordo com dados da Anbima. Mas no ano esses fundos perderam R$ 59,8 bilhões.
Também conforme dados da entidade, a entrada líquida do CDB foi de R$ 119,8 bilhões em 2023, um acréscimo de 16,8% em relação a 2022.
No C6 Bank, houve aumento de demanda na procura por crédito privado e por fundos, entre eles os Fundos de Investimento Imobiliário (FIIs). Larissa Frias, planejadora financeira do C6, explica que recursos da poupança podem ajudar a explicar a recuperação dos fundos de renda fixa ao final de 2023, na contramão do rendimento da poupança.
“Outra classe de ativos que vem crescendo na renda fixa é o Tesouro Direto. Cada vez mais temos uma parcela expressiva de investidores no Tesouro Selic, que no ano passado somou R$ 120 bilhões em investimentos”, aponta Larissa.
Geração Z pode estar por trás de fuga da poupança
Especialistas também destacam que o perfil de investidor também podem explicar a saída de recursos da poupança. A idade do rentista é destacada entre as fontes ouvidas pela Inteligência Financeira.
Adriana Siebert, do Daycoval, afirma que investidores da geração X ou até mais velhos preferem produtos com isenção de imposto de renda, migrando para LCI (Letras de Crédito Imobiliário) ou LCA (Letras de Crédito do Agronegócio).
“Principalmente uma geração mais velha e que não quer pagar Imposto de Renda”, diz.
Já investidores mais jovens, como os da Geração Z, não enxergam o rendimento da poupança como uma forma de economizar, aponta a especialista.
Dados da Anbima mostram que, em 2022, apenas 16% dos investidores brasileiros entre 16 a 25 anos investiam na poupança. Para perfis mais velhos, como os da geração millenial (de 25 a 40 anos), um quarto dos investidores aplica na caderneta.
“Existe uma diferença grande entre guardar dinheiro e investir. Com mais pessoas olhando diversificação, prazo… acredito que isso provoque uma mudança para melhor no mercado”
Larissa Frias, planejadora financeira do C6 Bank
Por outro lado, 31% dos investidores da Geração X, entre 41 e 60, usa a poupança.
“Hoje temos um cenário em que a geração X e millenials são predominantes no mercado de investimentos, mas estudos mostram que a geração Z é menos apegada à poupança. É uma faixa de investidores mais ligada ao retorno”, explica Adriana.
Fuga do rendimento da poupança veio para ficar?
As especialistas acreditam que a fuga do investidor da caderneta de poupança pode ter vindo para ficar. Com o avanço geracional dos rentistas e o que chamam de “amadurecimento do mercado”, o rendimento da poupança deve ficar cada vez mais obsoleto, avaliam.
“Isso porque temos opções mais rentáveis de investimento”, diz Larissa. “Na minha opinião, com o cenário de rentabilidade da poupança se mantendo (TR + 0,5% ao mês), acredito que continuaremos a ver migração do investidor”, conclui.
Já Adriana Siebert acredita que a poupança pode sim voltar a ter patamar positivo. Ela relembra que, quando a taxa de juros caiu para 2% em 2020, a caderneta terminou dezembro com saldo líquido de R$ 166 bilhões.
Lucas Queiroz, do Itaú BBA, afirma que “seria precipitado” cravar que a poupança está cada vez mais impopular como investimento.
“Neste caso, me parece que é por causa da baixa rentabilidade.”
Lucas Queiroz, estrategista de renda fixa do Itaú BBA
“Temos que observar como vai ficar o movimento de saque à medida em que a Selic vai caindo. Seria precipitado tentar cravar uma perpetuação desta tendência para frente”, frisa. “A poupança já teve anos consecutivos de saques e já voltou a ser positiva.”