Petróleo tende a manter pressão sobre inflação e BCs alertas
Em 2021, o preço dos contratos futuros do petróleo Brent, a referência global, foi pressionado para cima, atingindo o maior valor desde outubro de 2014
Em 2021, o preço dos contratos futuros do petróleo Brent, a referência global, foi pressionado para cima, atingindo o maior valor desde outubro de 2014. O principal motivo foi a retomada rápida de grandes economias após o esfriamento causado pela pandemia de covid-19. Com a oferta muito abaixo da demanda, os barris subiram para alcançar o pico de US$ 86,40 em outubro. A escalada do petróleo vem sendo um problema também para os bancos centrais, devido a seu impacto na inflação.
Ainda que haja uma suavização nos preços do contrato Brent neste ano, o valor do barril não deve cair para baixo de US$ 70, como ocorria antes da pandemia. Essa é a avaliação de bancos e casas de análises consultadas pelo Valor. O contrato do Brent para março fechou o ano a US$ 77,78 por barril na ICE, em Londres, acumulando ganhos de 50% em 2021.
Receba no seu e-mail a Calculadora de Aposentadoria 1-3-6-9® e descubra quanto você precisa juntar para se aposentar sem depender do INSS
“Projetamos um crescimento da demanda, uma recuperação mais forte do que vimos neste ano, descasada do bombeamento de petróleo. Entre outras coisas que devem impulsionar a retomada está o retorno das viagens aéreas no próximo verão [no hemisfério norte, inverno no Brasil]. Claro que temos consciência de que a ômicron pode mudar esse cenário”, diz Francisco Blanch, chefe global de commodities do Bank of America. O banco, que estima o Brent a US$ 85 por barril no fim de 2022, afirma que ainda que uma cepa mais perigosa altere o cenário, o efeito deve ser limitado.
Seguindo essa linha, o Goldman Sachs, que também prevê o barril a US$ 85, afirma que o mercado já internalizou o impacto da ômicron. “Quando pensamos na queda de 20% de preços que tivemos na Black Friday e nos dias posteriores, após o anúncio da descoberta da nova cepa na África do Sul, já tivemos uma precificação agressiva, ainda que não tenhamos uma clara orientação sobre o que de fato vai acontecer”, avalia Damien Courvalin, analista de commodities do Goldman Sachs.
Por ser utilizado em setores-chave do transporte, como o automobilístico e na aviação, além de ser insumo para outros segmentos, o petróleo em alta tem forte impacto na inflação. Mas controlar a elevação de preços pela oferta não é simples e nem cabe aos bancos centrais, por isso houve movimentações da maior economia do planeta para tentar amenizar as pressões inflacionárias. O presidente americano, Joe Biden, chegou a fazer um apelo a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) para que seus membros aumentassem a produção. Foi ignorado. Como resposta, no fim de novembro, a Casa Branca anunciou uma ação coordenada ao lado de países como Reino Unido e China para lançar barris de suas reservas estratégicas e buscar um alívio na inflação, principalmente da gasolina – cujo indicador de preços em novembro subiu 58,1% nos EUA, na maior alta desde 1980.
O preço do contrato futuro Brent recuou com força após o anúncio da descoberta de uma variante mais contagiosa na África do Sul, em 26 de novembro de 2021. Na sessão daquele dia o recuo foi de 11,55%, de US$ 82,22 para US$ 72,72 por barril. Desde então, os preços gradativamente vem subindo.
“Temos essa incerteza no horizonte. Até mesmo a Opep deve continuar com sua expansão de 400 mil barris diários em janeiro porque, ainda que mais transmissível, não há dados suficientemente conclusivos sobre a letalidade dessa nova variante do coronavírus”, diz Warren Patterson, chefe de commodities do ING, que prevê o Brent em torno de US$ 76 em 2022.
Um dos maiores entraves para retornar aos preços pré-pandemia é o financiamento da produção. Hoje a negociação por volta de US$ 60 e US$ 80 o barril se faz necessária para justificar aportes na exploração de jazidas, explica Luiz Carvalho, analista sênior de óleo e gás da UBS. “Todo ano, as reservas reduzem sua capacidade de fornecimento. Em algum momento um campo de petróleo vai chegar ao seu limite e será necessário explorar outro. Para manter a produção estável é preciso construir mais estruturas para exploração”, diz.
O que também não deve sair do horizonte do investidor é a falta de gás natural que, ao ser substituído pelo petróleo na geração de energia, acaba elevando os preços dos contratos WTI e Brent, avalia Andres Abadia, economista-chefe para América Latina da Pantheon Macroeconomics. “Um inverno mais frio do que o esperado no Hemisfério Norte aliado a uma retomada da economia global e a Europa com escassez de gás natural pode fazer com que aquilo que chamaram em 2021 de ‘tempestade perfeita’ continue existindo.”
Mesmo que ocorra mais liberações de reservas estratégicas para tentar atenuar a pressão sobre os preços, analistas veem o movimento mais como posicionamento político. “A liberação das reservas é uma solução que funciona por pouco tempo. Pode até ter impacto imediato, mas não resolve o problema de médio e longo prazo”, diz Patterson.
Um evento em particular é tido entre os analistas como o mais importante e impactante para a redução dos preços do petróleo neste ano: um acordo nuclear entre Irã e EUA. Caso isso ocorra, chegaria ao fim o embargo ao petróleo iraniano, o que pode significar 1 milhão de barris a mais por dia no mercado. “Isso causaria algum tipo de desbalanceamento de curto prazo. Mas tem que ver se, em uma situação dessas, a própria Opep não faria uma intervenção para regular”, diz Carvalho.
O analista diz também que há um teto para os preços e que, “acima de US$ 100 o barril, a negociação começa a se tornar desfavorável para a Opep, porque os consumidores começam a pensar em substituição da commodity”. Para o Credit Suisse, esse teto é mais baixo, em US$ 85 por barril, uma vez que acima disso “há destruição da demanda (especialmente pelo lado da gasolina)”.
Ainda que para a maioria dos bancos e casas de análise o valor do barril do petróleo siga neste ano em patamares mais elevados (se comparado ao período anterior à pandemia), há quem projete uma redução gradual dos preços. É o caso do suíço Julius Baer. Segundo o chefe de economia e pesquisa do banco, Norbert Rücker, a retomada da produção do petróleo de xisto nos EUA, de fato, deve ocorrer em um ritmo mais fraco do que no ciclo de 2016-2018. “Porém, a produção na bacia americana de Permian está prestes a superar seu recorde”, afirma.