‘Queremos um Itaú que olhe para o cliente de ponta a ponta’, diz Milton Maluhy Filho
Nesta entrevista, presidente do Itaú Unibanco fala dos desafios de implementar o que chama de ‘One Itaú’, dos esforços internos de transformação digital, do ambiente competitivo no setor e da estratégia do Itaú para a América Latina
O Itaú Unibanco vem acelerando o seu esforço de transformação digital. Após avanços na migração de sistemas para a nuvem e ajustes na rede de atendimento, o Itaú começa a implementar o que chama de “One Itaú”.
Ao invés de organizar-se por produtos ou marcas, como fazia até poucos anos atrás, o banco passará a ser dividido internamente em grandes áreas que terão o objetivo de olhar para o cliente como um só em todo o conglomerado. “Quanto mais engajado e satisfeito é o cliente, maior é o resultado”, disse Milton Maluhy Filho, presidente do Itaú Unibanco, em entrevista ao Broadcast, após o Itaú Day, evento anual do conglomerado com investidores.
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Confira os principais trechos da entrevista.
O banco vem apresentando resultados entre os melhores do setor. Quanto disso é reflexo da transformação digital?
Todo o esforço de transformação digital vem sendo acelerado. Uma alavanca importante é como medimos a satisfação dos clientes. Os nossos NPSs [net promoter scores, termo que define a satisfação dos clientes com a empresa] estão nas máximas históricas. E temos perspectivas de estar, até o final do ano, acima de 70 em todos os negócios. Isso só é possível ao se abraçar a agenda de centralidade do cliente. E a transformação digital é a forma como entregamos uma melhor experiência todos os dias. Quanto mais engajado e satisfeito é o cliente, maior é o resultado.
O senhor tem ressaltado que o Itaú está fazendo esforços no digital mas não será um banco remoto. Como todos os bancos, o Itaú fechou agências e investiu no digital. O banco já chegou a um ponto de equilíbrio?
Precisamos ajustar a presença à medida que os nossos clientes demandem mais ou menos os canais físicos e digitais. Acreditamos no modelo digital [que junta físico e digital], mas ser um banco digital não significa ser um banco remoto. Hoje, 100% dos nossos produtos estão nos canais digitais, com uma experiência que vem evoluindo, e contamos com uma rede de agências muito capacitada, com capital humano de primeira, que atende os clientes nas suas necessidades mais estruturadas, principalmente. No horizonte recente, o banco reduziu sua rede de agências, mas ainda vemos uma demanda relevante.
Há uma pressão sobre fontes de receita transacionais, como recebimentos e conta corrente. Onde o Itaú vai compensá-la?
À medida que conseguimos ser mais eficientes, conseguimos entregar preço e produtos mais competitivos para o nosso cliente. Para vários negócios, estamos mudando a proposta de valor e, ao mesmo tempo, quando se perde receita de modo consciente e se toma decisões numa agenda de centralidade no cliente, o trabalho é de eficiência para que você consiga ser barato, reduzir custo e a proposta de valor continue sustentável. É um trabalho de ampliar o relacionamento com o cliente e é disso que se trata o novo modelo operacional, o One Itaú: entregar um banco que olha para o cliente de ponta a ponta.
O One Itaú já fazia parte do processo de transformação?
Começamos a desenhar o One Itaú no ano passado e passamos um bom período do tempo discutindo como de fato tornávamos a operação de varejo 100% focada no cliente e nas suas necessidades. Essa transformação começou a ser desenhada no ano passado. Iniciamos 2023 com as estruturas e os times organizados e agora estamos em processo de implementação.
Existe um prazo para que esteja pronto?
Um processo como esse, da magnitude e da relevância que está sendo feita, deve levar pelo menos mais dois anos estar absolutamente estável e no ponto em que começamos a capturar benefícios relevantes.
Nos neobancos e fintechs, há um movimento de mudar incentivos, restringindo remuneração de contas ou cobrando tarifas. O modelo de dar isenção a tudo se esgotou?
A melhor vacina para os excessos é a taxa de juros. Tivemos uma etapa em que os juros no mundo eram baixos ou negativos e houve uma transferência de capital muito grande para empresas que tinham o único objetivo de crescer a base de clientes. À medida que as economias passaram a ter inflação e o juro subiu, o investidor começou a exigir um retorno diferente. Ele não está só olhando crescimento, mas também espera uma certa rentabilidade.
Não só houve uma redução de alocação de investimentos para essas empresas, como também houve uma mudança de expectativa em relação ao plano de negócio. E aí vem uma racionalização. Agora, há uma competição mais racional, mas mesmo naquele momento, fomos capazes de crescer de forma relevante e consistente a base de clientes.
Os maiores entre os novatos começam a lidar com dilemas de um banco tradicional?
Vários estão passando pelo que chamamos de dores do crescimento porque quando a empresa é menor, o grau de dificuldade é um e, à medida que se torna mais complexa, começa a enfrentar outros desafios. Naturalmente, toda empresa que passa por um crescimento muito rápido vai enfrentar as dores. Não foi diferente para o Itaú Unibanco, e não vai ser diferente para essas companhias.
Qual a estratégia do Itaú na América Latina?
Queremos estar nos lugares em que temos condições de rentabilizar e levar as nossas operações para o mesmo nível de excelência com que operamos no Brasil. Temos um movimento específico na Argentina, em que não existe um acordo vinculante e sim uma conversa [para a venda]. E a razão central é de que o nosso banco lá é muito pequeno. Ele tem por volta de 1% de mercado de varejo e é muito mais relevante no atacado, um negócio em que queremos continuar presentes. Temos duas grandes assimetrias como investidor brasileiro. O imposto que se paga nesses países tem de ter a diferença reconhecida no Brasil para a alíquota local.
Uma segunda assimetria importante é capital. No Brasil, temos um apetite definido no conselho de não operar com capital abaixo de 13%, sendo 11,5% de nível 1 [capital de maior qualidade e liquidez]. Esses países têm um nível de capitalização mais baixo, então, quando alocamos o capital adicional no Brasil, perdemos pelo menos quatro pontos na rentabilidade observada pelo investidor brasileiro do Itaú Unibanco em relação ao investidor daqueles países. São assimetrias importantes.
Por isso, hoje, não há interesse em fazer uma expansão internacional mais forte. No Chile, a estratégia é o contrário: temos 65,6% do banco e estamos em uma oferta voluntária para adquirir até 100% das ações.
A operação de venda na Argentina deve sair neste ano?
É um processo bastante longo porque depende não só das condições, mas também das aprovações regulatórias. É muito difícil fazer qualquer tipo de estimativa, sobretudo quando se precisa de aprovação do regulador tanto no Brasil quanto na Argentina. Na América Latina, o que temos feito é incrementar o ecossistema, com fintechs, mais tecnologia e mais modelos de negócio. São acordos [aquisições] pequenos.