Real Madrid se rende ao mercado e deve buscar investidores
Eis que um dos últimos baluartes do futebol associativo está estudando atrair investidores. O “traidor do futebol raiz” se chama Florentino Perez, que anunciou interesse em atrair capital para o Real Madrid. Primeiro clube a faturar mais de € 1 bilhão, montante atingido na temporada 23/24 e que deve se repetir na atual temporada. Aliás, […]
Eis que um dos últimos baluartes do futebol associativo está estudando atrair investidores. O “traidor do futebol raiz” se chama Florentino Perez, que anunciou interesse em atrair capital para o Real Madrid.
Primeiro clube a faturar mais de € 1 bilhão, montante atingido na temporada 23/24 e que deve se repetir na atual temporada. Aliás, curiosamente, o clube que primeiramente orçou chegar a € 1 bi de receitas foi o Barcelona, fato que não ocorreu por conta da pandemia.
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Perez anunciou que vai propor um referendo entre os 94 mil sócios. A ideia é analisar a transformação da associação numa estrutura empresarial. Assim, cada sócio passe a ser acionista, e a partir daí o clube possa ir a mercado captar novos acionistas.
Situação financeira do Real Madrid
Obviamente estamos falando de um processo nada trivial. Convencer os sócios de um dos clubes mais vitoriosos do mundo, e que se sobrepõe continuamente a estruturas empresariais com dinheiro e ainda assim incapazes de chegar aos níveis de receita do gigante espanhol é um desafio e tanto. Imagino os sócios conversando nos corredores da sede social e blasfemando contra a ideia.
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Ao mesmo tempo, num futebol cada vez mais competitivo, ter dinheiro não faz mal, e permite que a estrutura seja ainda mais robusta. Porque a situação econômico-financeira do clube é bastante saudável, diga-se.
Números de 2023/24 mostram o seguinte:
O clube fez € 1,09 em receitas totais, considerando que os € 12 milhões de negociações de atletas são no padrão contábil europeu, ou seja, apresentam apenas o lucro da operação, deduzido o valor contábil de ativo.
Números que impressionam, e a maior parte do crescimento do Real Madrid está relacionado ao aumento de receitas do novo estádio, o remodelado Santiago Bernabeu, que saltou de algo como € 175 milhões para € 325 milhões.
Na temporada 23/24 o estádio nem estava integralmente operacional, o que deve trazer ainda mais receitas na atual temporada. Impacto que esperamos para o Barcelona, conforme coluna de algumas semanas atrás.
Não é à toa que no caso da Portuguesa, do Paris FC e da maioria dos negócios envolvendo clubes italianos existe um vetor de crescimento associado a novos estádios.
Real Madrid e o controle de custos
E o desempenho operacional seguiu muito bom, com crescimento bastante controlado dos custos com remuneração, e aumento de outros custos e despesas associados à implantação do estádio. Espera-se, inclusive, que haja diluição dos custo com a operação funcionamento plenamente.
Geração de Caixa | |||
22/23 | 23/24 | ||
Receita Total | 917 | 1.085 | |
Pessoal | (495) | (510) | |
Outros Custos | (264) | (419) | |
EBITDA | 158 | 156 | |
€ milhões – Fonte: Press Release do Clube |
Em relação às dívidas, que o clube apresentou sob o conceito de Dívidas com Bancos (+) Pagamentos a Clubes e Fornecedores (-) Valores a receber de clubes (-) Caixa, o valor ao final da temporada passada era de € 8 milhões. Isso mesmo: € 8 milhões. Não tenho ainda o balanço para fazer o comparativo com clubes brasileiros, mas é um número bastante baixo, considerando que o clube possui sempre mais a pagar que a receber por negociações de atletas.
Dívida de reforma
O que resta é uma dívida relevante associado à reforma do Bernabeu. São € 1,16 bilhão. Muito? Pois é, não se a estrutura for correta.
A maior parte dessa dívida está parcelada em 27 anos a partir de agora.
Ou seja, estamos falando em cerca de € 45 milhões anuais de amortização, incluindo juros que variam entre 1,75% e 2,5% ao ano. Cerca de 30% da dívida será paga com 30% das receitas totais do estádio, o que significa que a amortização tende a ser em tempo menor que os 30 anos contratados.
Projetos de grande porte como estádios demandam financiamento de longo prazo a custos adequados e com fluxo de pagamento pré-estabelecido.
Por isso que projetos semelhantes são de difícil aplicação no Brasil, cuja taxa de juros de referência é perto de 10% ao ano, e não há financiamentos de 30 anos.
Por que o Real Madrid quer investidores?
Pois é. Se a situação é tão tranquila, qual o motivo do Real Madrid buscar investidores? Equilíbrio financeiro, estádio novo, infraestrutura de alto padrão, títulos. O que mais?
Mais! Florentino Perez quer mais! Seja dinheiro para fazer um clube mais forte, seja garantir um colchão de liquidez que permita ao clube tomar decisões mais arrojadas na formação de elenco, ou mesmo para criar uma governança que garanta que aquilo que Perez fez até aqui seja mantido no futuro. Inclusive olhando o que aconteceu com seu maior rival, o Barcelona.
Quanto vale o Real Madrid?
Ah, o tal do valuation. Sinto informar, mas os modelos de valuation não definem o valor do Real Madrid. Se usarmos fluxo de caixa descontado podemos chegar a € 5 bi ou € 6 bi, se usarmos múltiplos do Chelsea – cujo múltiplo foi de 6,5 vezes a receita – podemos chegar a € 7 bilhões.
Mas estamos falando do Real Madrid e como em qualquer relação de compra e venda Florentino Perez já falou que o clube vale € 10 bilhões. E que está disposto a vender 15% e colocar € 1,5 bi no caixa do clube.
Preço X valor
Preço e valor são coisas diferentes. Inclusive porque o preço está associado ao desejo de ser dono do clube, mas também a qual a forma de remuneração do investimento. O Real Madrid pagará dividendos? Ou o investidor vai querer ganhar numa venda futura? Mas baseado em qual retorno? Apenas no desejo de ser dono do clube?
Enfim, temas que ficam em aberto, mas que fazem parte das análises sobre investimentos em clubes de grande porte, e que jogam por terra ideias de abertura de capital como se clube de futebol fosse fábrica de molho de tomates.
O que Florentino mostra ao Brasil
Se até a principal liderança do Real Madrid percebeu que não dá mais para fazer futebol sem apoio de investidores, fica claro que o futebol mudou.
E para quem pensa que só clubes desesperados é que procuram soluções junto ao mercado, fica a dica: jacaré que dorme vira bolsa.