12 anos e dívida 4 vezes maior: o tamanho das dificuldades do Corinthians

Receitas crescem, mas sobra cada vez menos para pagar despesas financeiras

Neo Química Arena, estádio do Corinthians localizado no bairro de Itaquera, na zona leste de São Paulo. Foto: José Manoel Idalgo/ Ag. Corinthians
Neo Química Arena, estádio do Corinthians localizado no bairro de Itaquera, na zona leste de São Paulo. Foto: José Manoel Idalgo/ Ag. Corinthians

Vamos imaginar que, num período de 7 anos, um determinado clube de futebol tenha conquistado sua primeira Copa Libertadores, um Mundial de Clubes, três campeonatos brasileiros. Este time construíu uma das mais bem-sucedidas estratégias de marketing no futebol. Este time, aliás, ele é o único que, de fato, conseguiu com que patrocinadores tenham pago os salários de um astro. Agora, 12 anos depois do início dessa história, e 6 após o último título, este clube enfrenta uma situação financeira que transforma a gestão diária num eterno apagar de incêndios, que compromete a capacidade competitiva. Sim, estou falando da dívida do Corinthians.

Evolução da dívida do Corinthians

Vamos ao quadro de evolução desde 2012. Lembrando que em 2011 o clube foi campeão brasileiro e em 2012 foi da Libertadores e Mundial.

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Antes, porém, já havia apresentado um grande plano de marketing na volta da Série B, com a chegada de Ronaldo e uma série de novos patrocinadores, que turbinaram as receitas do clube.

Em 2012 teve início, também, o novo contrato de direitos de transmissão com a Globo. Por ele, o clube recebe o maior valor junto com o Flamengo, após a implosão do Clube dos 13 capitaneada pelos dirigentes do clube paulista.

Ou seja, cenário perfeito para seguir voando. Inclusive porque Flamengo e Palmeiras entravam em período de reestruturação, e o São Paulo vivia preso ao passado, tornando-se cada vez mais arcaico.

O quadro abaixo mostra bem a evolução da dívida do Corinthians:

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Dívida que se multiplica

No período entre 2012 e 2023 a dívida foi multiplicada por 4, enquanto as receitas cresceram 2,8 vezes em termos nominais e 1,4 vezes em termos reais (corrigidas pela inflação). E o comportamento precisa ser analisado com cautela, porque há fases.

Observe que entre 2012 e 2015, a dívida do Corinthians tem um comportamento de alta, mas moderado.

Na sequência, entre 2016 e 2018 não chega a ter grandes saltos, que ocorrem a partir de 2019 – ou seja, pré-pandemia – explodir no pós-pandemia e depois andar de lado até 2023.

Dívida X receita

Algo que sempre digo é que o número isolado da dívida diz pouco. Afinal, quem ganha R$ 10 mil e deve R$ 1 mil está melhor do que quem ganha R$ 1 mil e deve R$ 500, pois no primeiro caso a dívida representa 10% da receita mensal e no segundo ela representa 50%.

Então, em se tratando da dívida do Corinthians, vamos comparar os números com as receitas e com a geração de caixa, o famoso EBITDA, que é a diferença entre receitas e custos/despesas, e indica a capacidade de pagamento dessa dívida.

Note que há melhora no índice que compara as dívidas com as receitas. Isso mostra um cenário que não é de todo mal, afinal, mais receita geram mais capacidade de organizar a vida e reduzir as dívidas.

Entretanto, quando comparamos com o EBITDA, observe que ele roda sempre acima de 6 vezes, com exceção de 2023.

Mas isso tem como explicação a entrada de uma receita extraordinária de R$ 50 milhões referente ao contrato de venda de placas com a Brax. Sem ela, a relação vai acima de 7 vezes.

O que acontece com a dívida do Corinthians?

O que isso indica?

Que as receitas crescem mas estão sendo gastas, e que sobra menos dinheiro para cumprir com pagamento de despesas financeiras, investimentos e pagamento das dívidas.

Dois indicadores dessa realidade: posição de dívida com impostos parcelados no curto prazo e pagamento de despesas financeiras, como vemos logo abaixo:

Entre 2013 e 2023 o clube gastou 13,9% das receitas com pagamentos de despesas financeiras e impostos renegociados, e nos últimos 4 anos a média é de 15,8%.

E isso, considerando que os impostos parcelados pagos são aqueles que constam no curto prazo do ano anterior.

Aliás, note que à medida em que a dívida com parcelamentos cresce – saiu de R$ 211 milhões em 2019 para R$ 511 milhões em 2023 –, cresce também a parcela de curto prazo. Esta saiu de R$ 9,6 milhões para R$ 67,3 milhões.

Não dá para saber se tudo é realmente pago.

Isso porque os balanços somam diversas movimentações, mas este é o número que, em tese, deveria ser pago no ano.

Gestão de caixa

O que isso tudo significa?

Antes de mais nada, há notícias ruins, mas também há boas notícias.

Começando pelas ruins, a realidade do clube é de enorme dificuldade na gestão de caixa, fruto da opção por tentar ser competitivo a partir da estratégia de se endividar.

Ao mesmo tempo em que Palmeiras e Flamengo faziam a lição de casa, o Corinthians optou pelo caminho oposto, especialmente quando percebeu que os rivais tinham andado algumas casas no tabuleiro, e ele permanecia no mesmo lugar.

Agora, para solucionar este problema é necessário um processo duro de renegociação dos passivos, busca por parceiros financeiros que auxiliem na redução das dívidas, eventualmente uma recuperação judicial, e necessariamente uma gestão profissional e focada em corte de custos e reorganização do clube.

E, francamente, sem a ladainha de que “agora as receitas dependem de performance e é preciso investir, gastar, dar all in, etc e tal”. Menos, bem menos. Esse discurso não gerou resultados além de uma final de Copa do Brasil, e levou a dívida para patamares perto do insustentável.

E olha que aqui nem incluímos a dívida com a Arena, que drena perto de R$ 100 milhões anuais do caixa do clube só com despesas financeiras, o que aumenta ainda mais o grau de dificuldade de gestão.

A boa notícia, que exploraremos mais em detalhe no próximo Relatório Convocados, é que as receitas podem chegar a perto de R$ 1 bilhão, e com organização, controle de custos, eficiência de gastos, associados a uma reestruturação de passivos, há possibilidade de recuperar o clube.

Recuperação do caixa do Corinthians

Os dados acima assustam?

Sim, e devem mesmo assustar.

Mas se começar o trabalho rapidamente, abandonar a visão e prática amadoras, e ter consciência de que a recuperação vai levar um tempo, mas é possível alcançá-la, então o susto teve efeito positivo.

Se não, será apenas mais um episódio de uma série de terror sem fim.

A Inteligência Financeira é um canal jornalístico e este conteúdo não deve ser interpretado como uma recomendação de compra ou venda de investimentos. Antes de investir, verifique seu perfil de investidor, seus objetivos e mantenha-se sempre bem informado.

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