Investigação na Americanas tem por onde começar: os denunciantes

Dois executivos apontaram a conta fornecedor como 'ponto de atenção' nas reuniões de imersão com Rial

Sergio Rial, que renunicou ao cargo de diretor-presidente da Amerianas — Foto: Andre Coelho/Valor
Sergio Rial, que renunicou ao cargo de diretor-presidente da Amerianas — Foto: Andre Coelho/Valor

O comitê independente que vai averiguar as inconsistências contábeis na Americanas e definir se foi fraude de fato, como afirmam os bancos, tem um prato cheio para começar o trabalho: os denunciantes.

Muita gente no mercado financeiro se perguntou como Sergio Rial, o CEO com 10 dias de cargo, poderia ter descoberto tão rápido uma prática contábil que pode ter durado uma década na Americanas. Teve quem considerasse que, por ser chairman do Santander, Rial notou a inconsistência no saldo da conta fornecedor tendo a informação de qual era a exposição do banco espanhol. Ainda que sem explicitar, Rial deu a dica: “falando com as pessoas internamente”, “notando resistência em certos temas”.

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A coisa foi um pouco mais direta, apurou o Pipeline. Nas reuniões de imersão de Rial com executivos do alto escalão em seu primeiro dia na função, 2 de janeiro, ouviu de dois deles que deveria olhar com mais cuidado a conta fornecedor e o risco sacado. “Foi uma conversa na linha ‘sabemos que isso ocorre e não somos parte disso”, diz uma fonte. “Dá uma ideia do incômodo interno, para essas pessoas já terem falado disso na primeira interação com o novo chefe.”

Ao CEO, os executivos da casa não trataram o assunto como denúncia, mas como um ponto de atenção, disseram as fontes.

Rial ficou numa sinuca de bico. Tinha agendado uma live com os milhares de funcionários da companhia no dia 3, em que daria mensagens de estímulo sobre o que estava por vir. Desmarcá-la poderia ser prudente ou poderia ser exagero, considerando que a superficialidade do conhecimento sobre o assunto naquele momento. Seguiu a programação.

Depois dessa “assembleia”, chamou novamente os executivos com quem tinha conversado, desta vez acompanhado de André Covre, o então novo CFO. A reunião, desta vez, tinha a papelada do balanço na mesa, para que os recém-chegados entendessem o que exatamente deviam procurar. Mergulharam nisso nos dias que vieram, encerrando a primeira semana de trabalho com a clareza de ter um problema bilionário em mãos.

A segunda semana foi de discussão com o conselho: apresentar o que levantaram, discutir o que fazer, tentar providências. Se aquilo chegou tão rapidamente a Rial, não haveria garantias que os agora dispostos denunciantes não levassem a outro interlocutor. Além disso, o novo CEO e o CFO não queriam rifar suas carreiras no breu.

Se os dois executivos denunciantes sabiam como era feito, também sabem quem mais tinha conhecimento e, possivelmente, quem coordenava — questões que o trabalho do comitê independente deve ajudar a responder. “Se o caminho foi esse mesmo, não há dúvida de fraude”, diz um credor.

O Valor apontou em reportagem no dia 12 de janeiro que havia rumor sobre uma denúncia na varejista, ainda não se sabia se anônima. A revista Exame revelou ontem que o tema foi levado a Rial diretamente por dois funcionários. A informação foi confirmada por fontes ao Pipeline, que ressaltaram tratar-se de executivos em posição relevante.

Nomes não foram revelados e os executivos ainda não compõem a investigação, uma vez que o comitê independente está em fase de definição do plano de trabalho — que não é tão simples quanto fazer perguntas.

Por Maria Luíza Filgueiras, do Pipeline

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