Telefônicas não repassam redução de ICMS para fatura e viram alvo de investigação da Anatel

Queda deveria ter vindo na conta de agosto, já que imposto foi reduzido em julho. Empresas alegam necessidade de adaptação e não garantem repasse retroativo. Senacon notifica operadoras

Operadoras de telefonia entram na mira de Anatel e Senacon por não repassarem redução do ICMS. Foto: Marcos Ramos/Agência O Globo
Operadoras de telefonia entram na mira de Anatel e Senacon por não repassarem redução do ICMS. Foto: Marcos Ramos/Agência O Globo

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) investiga operadoras de telefonia, que mesmo após a redução do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) em vários estados, não repassaram a queda de impostos aos seus clientes.

O Rio de Janeiro adotou a redução do ICMS sobre serviços essenciais — entre eles, as telecomunicações — no dia 1º de julho. A alíquota passou de 32% para 18%. São Paulo, Goiás e Espírito Santo fizeram o mesmo. Os estados seguiram uma lei federal que criou um teto para o imposto. A expectativa era que os consumidores passassem a gastar menos, mas as faturas de agosto não vieram com a redução.

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Indagadas, as empresas se comprometeram a fazer os repasses, mas não confirmaram que o repasse será integral, e para todos os tipos de planos. A maioria não dará o desconto retroativo.

A lei que reduziu a alíquota do ICMS de 25% para 17% ou 18% (Lei Complementar 194/22) entrou em vigor no último dia 23 de junho. São Paulo e Goiás anunciaram a mudança no dia 27 de junho. São Paulo passou o ICMS do setor para 18% e Goiás para 17%. O Espírito Santo anunciou sua redução no dia 28. A alíquota no estado passou para 17%.

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A lei determinou o corte da alíquota para telecomunicações, combustíveis, energia elétrica e transporte público. O objetivo era conter a alta da gasolina e do diesel e aumentar a popularidade de Jair Bolsonaro, que concorre à reeleição. Nem todos os estados reduziram o imposto, mas onde houve corte, tanto nos combustíveis como na conta de luz, a queda nos preços já foi percebida, o que fez com que o país tivesse deflação em julho.

No setor de telecomunicações, porém, a redução nos preços não ocorreu. Segundo a Anatel, já foram identificados diversos casos em que o repasse da redução do ICMS não foi feito. A agência diz que ainda está “apurando a dimensão total do volume da questão para então avaliar as medidas sancionatórias a serem tomadas”.

Já o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) notificou as operadoras Claro, TIM, Vivo, Oi e Sky a prestar esclarecimentos sobre o repasse da redução ICMS aos consumidores. A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) recebeu reclamações de consumidores do estado de SP sobre as operadoras Tim e Claro.

A Senacon questiona se as empresas têm um plano de ressarcimento aos clientes, caso tenham cobrado o valor sem a redução. Além disso, devem informar, até o dia 26 de agosto, os prazos e percentuais e se informaram os clientes sobre a redução de carga tributária incidente na prestação de serviços.

Consumidor sem aviso

O especialista em tecnologia da informação Thiago Santos Pereira, de 35 anos, é cliente da operadora TIM, no Rio de Janeiro. Ele soube da redução após comentários de amigos, e questionou a empresa porque o valor da fatura de agosto não constava a redução. No boleto, a base de cálculo do ICMS do mês de agosto veio com a cobrança de 32% na conta.

O atendimento ao cliente da operadora disse a ele que o repasse será feito somente em outubro, sem o valor retroativo. No caso de Thiago, a TIM informou que o valor da fatura cairá de R$ 79,99 para R$ 69,99.

“Achei o desconto bem interessante. Não esperava uma redução tão grande. Eu não sabia mesmo da queda do ICMS, e nem tinha percebido. Talvez só percebesse só em outubro.”

“Acho que seria interessante avisar que teria a redução em outubro e explicar o porquê de ser tão longe”, afirma o consumidor.

Para o advogado tributarista Janssen Murayama, sócio do escritório Murayama & Affonso Ferreira Advogados, a partir da entrada em vigor do decreto ou lei estadual, a base de cálculo do imposto deve ser reduzida.

“As operadoras de telefonia incluem o valor do tributo mensalmente, arrecadam e repassam. Entrando em vigor essa lei, a partir do primeiro dia, ou seja, o consumo efetuado a partir de 1º de julho de 2022, o ICMS incidente sobre esses valores deve ser de 18% no caso do Rio de Janeiro”, afirma Murayama.

A advogada e pesquisadora do Programa de Telecomunicações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Camila Leite Contri, com a Lei Complementar nº 194/2022, o setor de telecomunicações foi considerado um serviço essencial e teve uma redução significativa da alíquota de ICMS.

“Os serviços de telecomunicações e de acesso à internet são serviços essenciais para o exercício da cidadania. Em um período inflacionário como o atual, que as contas pesam no bolso dos consumidores, e se tratando de um serviço essencial, o Idec entende que eventuais benefícios devem ser repassados aos consumidores”, avalia Contri.

O Idec defende o repasse integral.

“As empresas já estão sendo beneficiadas com a redução da alíquota em alguns estados e afirmaram publicamente que iriam repassar a redução aos consumidores. Entretanto, não existe um compromisso vinculante por parte das empresas”, explica a pesquisadora do Idec.

Luiza Leite, advogada tributarista, diretora executiva Tax Vision, observa que, se as operadoras recolherem valores maiores de ICMS do que o percentual aplicado em cada estado, as pessoas terão direito à restituição desses valores. Mas ela diz que isso não significa que um desconto no valor final da conta.

“A Resolução 632 da Anatel traz as regras para tarifas e precificação. A ideia é que as empresas repassem (a redução) já que elas não podem indicar um valor diferente do que foi recolhido de tributos. Mas essa redução, quando falamos de empresas do regime privado, não gera a obrigação de redução do valor do pacote contratado. Tudo depende das condições, dos pacotes contratados, das promoções e da precificação realizada”

Ela complementa.

“Os preços para o consumidor final são livres, mas os órgãos reguladores, como a Anatel, podem monitorar os preços praticados e detectar eventuais abusos.”

O que dizem as operadoras

A TIM informou que o repasse aos consumidores da redução do ICMS está sendo feito em fases, contemplando novos e atuais usuários em momentos distintos. As mudanças serão feitas no componente de telefonia das ofertas e representam um percentual de reajuste igual ou maior à queda do tributo.

A partir de 7 de agosto, quem já contratou ou vai contratar um plano pós-pago ou controle já contará com a redução do valor. O TIM Controle Smart, por exemplo, passará a custar R$ 46,99 (o valor atual é R$ 49,99). Já o TIM Black 15GB terá seu valor reajustado de R$ 109,99 para R$ 99,99.

No pré-pago, as mudanças começaram em 14 de agosto, com até 1GB a mais nos pacotes de internet, mantendo os valores de recarga comercializados.

As mudanças serão estendidas aos clientes antigos, segundo a operadora, ao longo do processo de implantação dos repasses.

Claro diz que dará desconto retroativo

A Claro afirmou que tem o compromisso de repassar “integralmente aos seus clientes o benefício da redução do ICMS”. Segundo a empresa, “a complexidade das adaptações sistêmicas necessárias e os diferentes tempos de adesão dos estados exigiram um período de transição, que está próximo da conclusão”.

A operadora diz que os clientes já começaram a ter a redução do imposto repassada em fatura e, entre setembro e novembro, receberão desconto retroativo referente ao período de ajustes.

A Vivo informou que aplicará a redução da alíquota do ICMS nos preços dos seus serviços, seguindo a definição de cada estado sobre o tema. Nesse momento, a empresa diz que trabalha para realizar as adaptações em sistemas e mais informações serão comunicadas diretamente aos clientes.

A Oi informa que, até o momento, desconhece a notificação da Senacon e acrescenta que está repassando integralmente a redução do ICMS. A Oi diz que “o repasse se dá no mesmo período da aplicação do reajuste dos planos que é feita anualmente”.

A Oi informa ainda que “o reajuste anual dos serviços de telecom foi previamente comunicado aos clientes e que a alíquota do ICMS que incidirá sobre o serviço constará expressamente na fatura”.

A Sky foi procurada mas não respondeu.

Por Pollyanna Brêtas

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