Piso da enfermagem: governo e Congresso travam queda de braço para viabilizar novo valor
Desoneração da folha, atualização da tabela do SUS e compensação financeira a estados e municípios pelo aumento de gastos são as propostas sobre a mesa
A cúpula do Congresso Nacional e o governo de Jair Bolsonaro discutem uma alternativa para viabilizar o piso salarial de R$ 4.750 para os profissionais de enfermagem e compensar o aumento de gastos que estados, municípios e o setor privado terão com os novos salários.
Mas enquanto busca uma solução para pagar a conta da remuneração mínima da categoria, o governo trava uma queda de braço com parlamentares para evitar que toda a fatura recaia sobre a União.
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A lei que cria o piso da categoria foi suspensa, no início do mês, pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal. A liminar (decisão provisória) está sendo votada no plenário virtual do STF até sexta-feira. Por enquanto, são 5 votos a 3 para que continue suspenso o pagamento do piso salarial até que sejam feitos cálculos sobre as maneiras de financiar a nova lei.
Barroso pediu análise de dados detalhados dos estados, municípios, órgãos do governo federal, conselhos e entidades da área da saúde sobre o impacto financeiro para os atendimentos e os riscos de demissões diante da implementação do piso. O prazo para que essas informações sejam enviadas ao STF é de 60 dias. Os municípios afirmam que o piso pode levar à redução de equipes de saúde da família.
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Efeito de 32,5 mil demissões
Há várias opções sendo avaliadas entre o governo e o Congresso, mas as principais são a desoneração da folha de pagamentos dos empregadores, a correção da tabela do Sistema Único de Saúde (SUS) e a compensação direta a estados e municípios. O ministro da Economia, Paulo Guedes, tem se reunido com membros do Congresso para discutir o assunto.
Na sexta-feira, ele esteve com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que tem encabeçado as discussões.
O governo federal tenta evitar que a conta seja muito alta para a União e que o Tesouro Nacional tenha que pagar toda a diferença entre o salário atual dos profissionais e o piso. Por outro lado, o governo sabe que terá que ceder e, neste momento, admite compensar hospitais filantrópicos (como Santas Casas) e municípios pequenos.
Uma das saídas que Pacheco defende é a atualização da tabela SUS, que traz os valores de ressarcimento do governo federal por procedimentos realizados pela rede conveniada. Isso poderia beneficiar tanto hospitais privados que têm contratos com o SUS como estados e municípios.
A tabela de procedimentos do SUS não tem uma atualização integral há mais de 15 anos. De acordo com entidades do setor, a defasagem da tabela SUS chega a 60%, em termos históricos. Por isso, uma atualização nesse montante na tabela geraria uma conta de mais de R$ 20 bilhões para a União.
A equipe econômica também está se manifestando contra uma ampla desoneração da folha para este setor especificamente, porque considera uma medida cara e que vai beneficiar grandes hospitais — inclusive redes privadas que não atendem pelo SUS.
Guedes, historicamente, defende a desoneração da folha para todos os setores da economia com o objetivo de gerar empregos, mas compensado com outro tributo.
O impacto direto para a União é de aproximadamente R$ 10 milhões por ano, muito menor do que o estimado para o setor privado (R$ 6,3 bilhões), municípios (R$ 4,4 bilhões) e estados (R$ 1,3 bilhão), de acordo com as contas do governo.
Ontem, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) divulgou um estudo no qual sustenta que a implementação do piso deve levar à perda de 11.849 equipes de Estratégia em Saúde da Família (ESF), o que corresponde a 23% do total no Brasil. A entidade afirma que 32,5 mil profissionais de enfermagem precisariam ser demitidos para bancar o piso, que foi aprovado sem uma forma de financiamento.
A lei prevê ainda um piso de R$ 3.325 para técnicos de enfermagem (70% do total dos enfermeiros) e R$ 2.375 para auxiliares de enfermagem e parteiras (50%). Para a CNM, se não houver uma compensação, 34,9 milhões de pessoas em todo o Brasil podem ficar desassistidas. Os municípios calculam despesas de R$ 9,4 bilhões ao ano no orçamento com o piso, número maior que o previsto pelo governo federal.
“Nenhum cidadão é contra o piso dos enfermeiros, só que não há como suportar esse pagamento. Não há como criar uma despesa a mais se não tem como pagar”, afirmou o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski.
O projeto que cria o piso foi aprovado em maio pela Câmara. O texto ficou parado até julho à espera da aprovação de uma emenda à Constituição para evitar que o piso fosse contestado na Justiça. Mesmo assim, Barroso suspendeu a lei. Ele é relator de uma ação apresentada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos de Serviços (CNSaúde), que defende que o piso é insustentável.
Julgamento virtual no STF
Diante dos dados já apresentados na ação, o ministro avaliou que há risco concreto de piora na prestação do serviço de saúde, principalmente nos hospitais públicos, Santas Casas e hospitais ligados ao SUS.
O relator levou o caso ao plenário virtual e os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia seguiram a sua posição. Já André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin divergiram de Barroso, votando pela manutenção do salário inicial.
O relator levou o caso ao plenário virtual e os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia seguiram a sua posição. Já André Mendonça, Nunes Marques e Edson Fachin divergiram de Barroso, votando pela manutenção do salário inicial.
Por Melissa Duarte e Manoel Ventura