Megaleilão do Tesouro pressiona mercado

Emissão de R$ 16,7 bi em LTNs e NTN-Fs, concentrada em títulos mais longos, resultou em taxas mais altas no mercado de juros

Embalado pelo sinal de fim do ciclo de aperto monetário, que gerou queda forte dos juros futuros nas últimas semanas, o Tesouro Nacional realizou ontem o maior leilão de títulos prefixados deste ano. Com taxas mais baixas no mercado e uma demanda elevada pelos papéis da dívida brasileira, o Tesouro emitiu ontem R$ 16,7 bilhões em LTNs e NTN-Fs e e concentrou as colocações em títulos de prazo mais longo.

No mercado de juros, o megaleilão do Tesouro resultou em taxas mais altas. A quantidade elevada de risco, derivada da maior colocação de papéis de longo prazo, pressionou a curva de juros. Assim, no fechamento do pregão de ontem, a taxa do DI para janeiro de 2024 subiu de 12,88% para 13,04%; e a do DI para janeiro de 2026 saltou de 11,625% para 11,785%.

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O Tesouro tem aproveitado as últimas semanas para fazer leilões mais robustos, especialmente de títulos prefixados. Profissionais do mercado observam que a sinalização de encerramento do ciclo de elevação da Selic abriu uma janela para uma queda das taxas futuras e aumento da demanda por prefixados. O contexto, assim, tem favorecido emissões maiores de títulos pelo Tesouro, que tenta, ainda, alongar o perfil da dívida com a venda de papéis mais longos.

Ontem, foram vendidas 23 milhões de LTNs. Desse total, 1 milhão de papéis tem vencimento em outubro de 2023; 2 milhões vencem em outubro de 2024; e 20 milhões têm vencimento em janeiro de 2026. Além disso, o Tesouro vendeu 500 mil NTN-Fs para janeiro de 2029 e 150 mil papéis que vencem em janeiro de 2033.

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Na avaliação de Roberto Pilnik, responsável pelas mesas de juros e moedas da XP, o Tesouro tem feito um bom trabalho ao monitorar a demanda do mercado pela dívida brasileira. “Ele não viria de surpresa com uma oferta desse tamanho. Se fizesse isso, com certeza as taxas subiriam muito mais”, afirma.

Para Pilnik, o mercado absorveu com tranquilidade a oferta de ontem, dado que os juros de longo prazo encerraram o dia com alta de 0,12 ponto percentual. “Uma colocação mal feita com certeza teria potencial para provocar uma alta bem mais forte nas taxas”, diz.

Visão semelhante é defendida pelo estrategista-chefe macro da Tullett Prebon Brasil, Vinicius Alves. “O comportamento da curva de juros é um sinal de que está mais tranquilo emitir. Claro que existe um salto inicial nos DIs, mas estamos tendo demanda pelos papéis. O mercado está conseguindo absorver relativamente bem essas ofertas maiores de títulos.”

Alves nota que, desde a reunião de política monetária de julho do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e do Copom de agosto, há um ajuste relevante para baixo nos juros de mercado. “Isso abriu espaço para o Tesouro fazer essas ofertas maiores”, diz.

“A gestão da dívida até estava tranquila. Vamos ter vencimentos grandes em janeiro e em março de 2023, mas o colchão já estava cobrindo. O Tesouro está aproveitando essa curva de juros mais baixa para colocar mais prefixados e NTN-Bs [títulos atrelados à inflação], até porque as eleições já devem entrar no radar do mercado”, afirma Alves. O estrategista, assim, acredita que é positivo para o Tesouro aproveitar o momento de alívio nos juros, ainda mais em um ambiente no qual a demanda pelos papéis se mostra forte.

Na esteira da queda expressiva das taxas futuras de juros nas últimas semanas, Pilnik, da XP, avalia que o mercado parece, agora, ter preços mais justos. “E acredito que a avaliação do Tesouro seja a mesma. Se ele acreditasse que haveria um rali adicional de 1 ponto percentual nos juros, ele provavelmente esperaria mais algumas semanas para fazer uma oferta deste tamanho”, argumenta o executivo.

O gestor de renda fixa institucional da CM Capital Markets, Rinaldo Zampieri Filho, observa, adicionalmente, que o Tesouro aproveitou a demanda espontânea resultante do vencimento recente de NTN-Bs na última segunda-feira, 15, e do vencimento próximo de LFTs (cerca de R$ 180 bilhões em setembro) para ampliar o volume de títulos ofertados ao mercado.

“O Tesouro aproveitou essa conjuntura e, pela segunda vez nos últimos 15 dias, fez um leilão acima de R$ 20 bilhões. A estratégia tem sido correta. O mercado vem absorvendo a oferta com certa tranquilidade e o Tesouro teria agora cerca de nove meses de tranquilidade com o colchão”, diz o gestor.

Ele, porém, faz uma observação em relação à redução na oferta de NTN-Fs na comparação com o leilão de semana passada. Zampieri lembra que esse papel costuma ser mais demandado por investidores estrangeiros. Assim, para ele, a diminuição na quantidade de títulos ofertados pode ser um indicativo de redução no apetite estrangeiro, à medida que as taxas de longo prazo saíram de cerca de 14% para algo em torno de 12%. “O investidor local acaba preferindo uma LTN para janeiro de 2026, que está rendendo o mesmo percentual do CDI e com muito mais liquidez que a NTN-F”, enfatiza.

Enquanto o Tesouro tem aproveitado a janela de oportunidade após a queda forte das taxas de mercado, especialmente as mais longas, a proximidade das eleições presidenciais deve trazer volatilidade adicional ao mercado. O gestor de renda fixa da Garde Asset, Eduardo Magozo, acredita que, em linhas gerais, o cenário é construtivo no mercado de juros. “Vimos um movimento muito grande e estamos com posições menores. O ambiente daqui em diante vai ser muito mais volátil e o Tesouro adiciona volatilidade”, afirma.

Magozo nota que o mercado ficou de dois a três meses com emissões não muito relevantes do Tesouro. “Mas agora, como você vai ter um ‘tomador’ [que aposta na alta das taxas] final de pré, o ambiente fica um pouco mais bagunçado e passa a existir um equilíbrio de forças maior no mercado. Vamos ter uma volatilidade bem maior à frente. Por mais que o cenário seja construtivo, vamos ter solavancos”, alerta o gestor. “O Tesouro está certo em emitir mais títulos, mas esse movimento deve afetar o mercado.”

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