Herdeiras de Aloysio Faria colocam Alfa e mais duas empresas à venda
Filhas de banqueiro contratam assessores financeiros para avaliar ativos
As herdeiras do banqueiro Aloysio Faria, que morreu em 2020, aos 99 anos, contrataram assessores financeiros para a venda dos três maiores negócios do empresário: Banco Alfa, C&C (rede de material de construção Casa e Construção) e Agropalma (óleo de palma). O Valor apurou que as conversas envolvendo o interesse de instituições financeiras no Alfa são as que estão mais avançadas.
O Alfa atraiu a atenção dos bancos BTG Pactual, Safra, Master, Daycoval, BR Partners e Inter, segundo fontes a par do assunto. No domingo, o colunista Lauro Jardim, de “O Globo”, antecipou que o BTG estava avaliando a compra do banco. O Rothschild assessora as herdeiras na operação.
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O maior interesse dessas instituições financeiras é na carteira corporativa e de private banking do Alfa. Fontes afirmam que BTG e Safra seriam os candidatos mais fortes. Os outros chegaram a olhar a operação, mas não seguiram adiante com as conversas porque não conseguiram encontrar sinergias suficientes e também por vislumbrarem eventuais problemas societários na venda.
Uma fonte ligada às herdeiras disse ao Valor que as filhas do banqueiro – Cláudia, Eliana, Flávia, Júnia e Lúcia – querem saber em quanto cada negócio do grupo é avaliado no mercado para depois estruturar uma venda. “São cinco herdeiras e cada uma pode querer uma coisa. Ou pode, entre elas, ter o interesse de comprar a participação da outra”, afirmou essa pessoa. Não há pressa em vender os negócios da família, acrescentou o interlocutor. Também não há acordo de exclusividade para a venda do banco.
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Cada uma das filhas herdou 20% dos negócios de Aloysio Faria. No banco Alfa, as filhas fazem parte do grupo de controle, com mais de 80% das ações ordinárias (com direito a voto). Ainda não está claro qual seria o valor do conglomerado financeiro. Listado em bolsa, o Banco Alfa de Investimento tem uma liquidez baixíssima. Na quinta-feira, fechou avaliado em R$ 824,6 milhões – o valor subiu 24,4% desde segunda-feira, com a notícia de que poderia ser vendido, segundo o Valor Data. “Embora o acionista controlador esteja sempre aberto a considerar operações estratégicas, não há nenhum entendimento ou documento obrigando a realização de qualquer operação”, disse o Alfa quando a Comissão de Valores Mobiliários o questionou sobre a oscilação dos papéis.
Fontes de mercado relatam que a carteira do Alfa é saudável, mas a operação ainda é basicamente analógica e não acompanhou o processo de digitalização vivido pelo setor nos últimos anos. O patrimônio líquido, que pode ser usado como um referencial no caso de venda, é de R$ 1,6 bilhão. “É uma instituição bem arrumada, não tem problemas, mas a rentabilidade está muito baixa. Muita gente olhou, mas poucos se interessaram de fato, por conta das eventuais sinergias e das questões societárias. Só faz sentido vender tudo em bloco. Se forem tentar desmembrar, não vão capturar valor”, diz um interlocutor.
Desde o ano passado, as filhas de Aloysio Faria se estruturaram em conselhos de acionistas para entender os negócios criados pelo banqueiro, uma orientação que foi dado pelo próprio pai. No mercado financeiro, Faria era conhecido pela gestão centralizadora – participava de todas as principais decisões de seus negócios e tinha poucos executivos – os “pratas da casa” – em sua relação de confiança.
Filho de banqueiro, Faria criou em mais de 70 anos de sua vida empresarial um conglomerado de negócios que atua em diversos setores, além do financeiro. Além do Alfa, da rede de materiais de construção C&C e da empresa de agronegócios Agropalma, fazem parte do grupo a rede de hotéis Transamérica, emissoras de rádio, teatro Alfa, a fabricante de água mineral Águas Prata e a sorveteria La Basque – essa última era um capricho de Faria, que adorava sorvetes.
Por enquanto, apenas três desses negócios estão com assessores financeiros para potencial venda. C&C e Agropalma iniciaram o processo recentemente. Com 35 lojas e faturamento de R$ 1,5 bilhão em 2020, a C&C passou por recente reestruturação financeira. Líder em óleo de palma no país, a Agropalma anunciou este ano um projeto para ampliar em 50% sua produção nos próximos cinco anos. Em 2021, a receita da empresa foi de R$ 2,3 bilhões – a companhia fabrica entre 160 mil e 170 mil toneladas por ano, destinadas à indústria de alimentos, ao food service e ao segmento de cosméticos.
A rede hoteleira, que inclui o hotel de Comandatuba, na Bahia, e o negócio de eventos Expo CenterTransamérica, não incluídos neste pacote de vendas, foi afetada pela pandemia da covid-19.
Desde a morte do banqueiro, bancos de investimentos começaram a abordar as herdeiras para entender se elas estavam dispostas a vender os negócios. Faria morreu em setembro de 2020 – sua fortuna era estimada em US$ 1,7 bilhão pela revista Forbes.
Quem era Aloysio Faria (1920-2020)
Aloysio Faria, o mais discreto e um dos mais inovadores banqueiros brasileiros, morreu em 15 de setembro de 2020, aos 99 anos. Com raríssimas aparições públicas e sempre cercado por uma aura de mistério, o mineiro de Belo Horizonte construiu um conglomerado que inclui o Banco Alfa, a rede de materiais de construção C&C, os hotéis Transamérica, a Águas da Prata, entre outras empresas dos mais diversos setores.
Mas foi no Banco Real que deixou sua marca mais conhecida e onde fez grande parte de sua fortuna. Em 1998, vendeu o negócio ao ABN Amro e recebeu à vista US$ 2,1 bilhões, em uma das maiores transações do setor financeiro no país até então. Na sequência, o Real foi adquirido pelo Santander Brasil, num dos passos mais relevante para o grupo espanhol no Brasil.
Nos 20 anos anteriores à sua morte, Faria já não estava mais na gestão diária dos negócios, mas nunca deixou de acompanhar de perto as empresas do grupo. Nas últimas décadas, se tornou figura constante na lista dos brasileiros mais ricos do mundo. Conforme levantamento da revista americana norte americana Forbes.
O grupo Alfa
A Alfa Holdings congrega os ativos financeiros do grupo, como banco de investimento, seguradora, financeira, administradora de consórcio, entre outros. O mais importante é o Banco Alfa de Investimento, com R$ 24,539 bilhões em ativos, carteira de R$ 9,224 bilhões e foco em grandes empresas dos setores de indústria e comércio, além de garantias prestadas.
O Alfa atua no segmento corporativo, atendendo grandes empresas, e nos segmentos de banco de investimentos e administração de fortunas. Já com a financeira, oferece crédito consignado e financiamento automotivo, entre outras linhas.
No Alfa Banco de Investimento, a família Faria detém 64,8% do capital total. Outros acionistas importantes são o fundo Alaska, com 12,6%, e Mário Slerca Junior, com 7,0%. Procurados, eles não quiseram se manifestar.
Dona de uma participação em torno de 2,5% do capital do Real na época em que o banco foi vendido para o ABN, a família Slerca travou uma briga de quase duas décadas na Justiça para ser ressarcida por supostos prejuízos causados na venda do controle do banco aos holandeses por Faria. No fim, acabou perdendo no STJ e decidiu que não valia a pena tentar seguir com o caso para o STF. Na época, não havia a obrigatoriedade do “tag along”, pela qual os acionistas minoritários têm hoje o direito de receber no mínimo 80% do valor pago por papel ordinário.
Procurado, o Alfa informou que não tem nada a declarar. BTG, Safra, Rothschild, Master, Inter, BR Partners e Daycoval também não se manifestaram sobre o assunto.