Como ida de Galípolo para o BC altera relação do governo com Campos Neto?
Com indicação do secretário executivo da Fazenda, governo busca ter ‘maioria’ adiante na definição da taxa de juros
O secretário executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, foi anunciado na segunda-feira como o nome indicado pelo governo para a diretoria de Política Monetária do Banco Central (BC). Segundo o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, essa nomeação ajudará a integrar as políticas fiscal e monetária. Galípolo é considerado o braço-direito do ministro.
Também seria uma estratégia para o governo ter mais voz nas decisões sobre a taxa básica de juros, a Selic.
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“A primeira vez que ouvi o nome do Galípolo para o Banco Central partiu do Roberto Campos Neto. Eu estava na reunião do G20 na Índia e fomos almoçar juntos. Foi a primeira pessoa que mencionou a possibilidade, no sentido de entrosar as equipes do Ministério da Fazenda e do BC”, disse Haddad.
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Perguntado sobre uma eventual ação para pressionar o BC a reduzir a Taxa Selic, hoje em 13,75% e alvo de críticas no governo, Haddad afirmou que Galípolo terá autonomia.
“Tem ali (no BC) nove diretores, e o presidente Lula vai indicar os nomes. Gabriel não é filiado ao PT, foi convidado a participar do governo por mim, foi um convite pessoal. Ele nunca teve militância partidária e é conhecido do mercado. Ele está indo para o BC com autonomia e para cumprir a lei, e buscar crescer com baixa inflação e justiça social.”
‘Mudar balanço de forças’
Galípolo seria visto pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva como um contraponto ao atual presidente do BC, Roberto Campos Neto. Faz parte de uma estratégia para garantir “maioria” no Comitê de Política Monetária (Copom) do BC ainda este ano.
A taxa Selic é definida pela maioria do Copom, formado pelos oito diretores do BC e seu presidente. Ontem o governo indicou dois nomes. Outros dois nomes serão indicados em dezembro. Todos terão de passar por sabatina no Senado.
Para alcançar a “maioria”, a equipe de Haddad terá de atrair mais um diretor, segundo integrantes do governo.
“O mercado viu como uma sinalização de que o governo está buscando mudar o balanço de forças dentro do Copom para iniciar um ciclo de cortes de juros prematuro”, diz o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno.
Galípolo sempre foi o preferido de Haddad para substituir Campos Neto, cujo mandato se encerra no fim de 2024.
Em relatório, o diretor do Departamento de Pesquisa Econômica para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, afirma que “a percepção de que Galípolo eventualmente substituirá Campos Neto tem o potencial de gerar alguns atritos e mal-estar no Copom”.
Segundo fontes ouvidas pela colunista do GLOBO Vera Magalhães, nos corredores do BC a indicação de Galípolo foi vista como um gesto em direção ao diálogo. Ela diz ainda que, no entendimento do mercado, a escolha indicaria a opção de Haddad de construir um caminho gradativo para a queda da Selic.
Campos Neto ficará mais de um ano e meio à frente do BC e, nesse período, terá o seu provável sucessor na cadeira mais importante da diretoria. Para o governo, esse cenário levará a mais discussões internas sobre o patamar dos juros. E isso será puxado por alguém respeitado pelo mercado e pelo governo, na visão da Fazenda.
O diretor de Política Monetária tem um papel fundamental na definição da Selic: sob a sua gestão ficam as mesas de câmbio e de juros — ou seja, a operações dos leilões de títulos e swaps cambiais que regulam a oferta de dinheiro e de dólares em circulação.
Mas, até que se tenha maior clareza sobre a postura que Galípolo adotará no Copom, haverá volatilidade no mercado, diz o ex-diretor do BC Tony Volpon.
“Ele é o candidato óbvio a ficar no lugar do Roberto Campos Neto, e teremos um ano e meio para ver seu comportamento. A ideia foi essa: colocá-lo no Copom agora para ele ir entendendo o processo do Banco Central e criando uma credibilidade ao longo do tempo. Ele tem uma visão diferente das pessoas que estão no Copom hoje. O desafio dele é conseguir comunicar uma visão diferente de mundo, mas ainda com credibilidade.”
Por Ivan Martínez-Vargas, Manoel Ventura, Vera Magalhães e Victor da Costa