China fornece alternativa financeira à Rússia mas não pode substituir Swift

No total, o Cips abrange pouco mais de 100 países de todas as partes do mundo

Foto: Pexels

O contra-ataque dos Estados Unidos e aliados para tentar conter a ofensiva russa na Ucrânia através de sanções econômicas e financeiras despertou o debate entre especialistas quanto à capacidade de proteção de Moscou vinda da China. Nesse embate, o sistema de pagamentos internacionais chinês chamado Cips pode até fazer frente ao poderio do Ocidente, mas não tem forças para substituir o Swift, dominante no mundo.

“Embora a infraestrutura financeira da China possa oferecer alguma trégua às instituições financeiras russas atingidas pelas sanções ocidentais, é de fato apenas uma trégua e não uma solução clara”, resumiu a economista-chefe para Ásia do Natixis, Alica Garcia Herrero. Em relatório, ela afirma que o principal obstáculo é que o Cips chinês ainda não tem liquidez suficiente e é dependente do Swift.

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Segundo dados oficiais, atualizados até novembro de 2021, o Cips possui cerca de 1.250 participantes, sendo 75 diretos e 1.178 indiretos – desses, 914 participantes estão localizados na Ásia, sendo 535 em território chinês. Há também outros 156 participantes indiretos europeus, 41 africanos, 45 das Américas e 22 da Ásia-Pacífico. No total, o Cips abrange pouco mais de 100 países de todas as partes do mundo.

Sigla em inglês para Sistema de Pagamento Interbancário Transfronteiriço, o Cips foi anunciado pela primeira vez em 2015 e surgiu como um sistema para facilitar a transferência e liquidação de pagamentos internacionais em yuan. Já o Swift foi criado nos anos 1970 e permite contatos diretos entre mais de 11 mil instituições financeiras, em mais de 200 países.

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O economista sênior de mercados emergentes da Capital Economics, Jason Tuvey, observa que, em teoria, “qualquer forma de mensagem” – como e-mail ou telefone – poderia ser usado como alternativa ao Swift. “Mas seria claramente muito menos eficiente e confiável”, ressalta, acrescentando que os bancos ocidentais tradicionais provavelmente não concordariam em usar tais alternativas.

Tuvey lembra que nos últimos anos o próprio Banco Central da Rússia estabeleceu o SFPS (Sistema para Transferência de Mensagens Financeiras) como uma alternativa ao Swift. “Mas é um sistema amplamente centrado na Rússia, no qual pouco mais de 20 instituições financeiras estrangeiras (muitas em antigos estados soviéticos) se inscreveram”, ressalta.

Ainda assim, o economista da Capital Economics avalia que muitos bancos estrangeiros, principalmente da China, devem elevar a participação no sistema russo. “Mas isso levará tempo”, emenda Tuvey.

Bifurcação

De um modo geral, os bancos da Rússia têm poucas alternativas viáveis ao Swift quando se trata de transações internacionais. Para o estrategista global do Rabobank, Michael Every, a remoção da Rússia do sistema financeiro dominante pode provocar uma “bifurcação” da economia mundial em blocos de cumpridores e não cumpridores das sanções ocidentais.

“A bifurcação das sanções dos EUA e da União Europeia (UE) causaria mais confusão e volatilidade aos mercados devido a interrupções nos fluxos globais de capital”, afirma. Segundo o estrategista, a China estaria provavelmente em melhor posição para continuar a receber produção russa devido ao seu relacionamento com Moscou.

A boa notícia é que as transações entre os bancos centrais chinês (PBoC) e russo (CBR) não exigem sistema de mensagens Swift. Para a economista do Natixis, citada acima, o PBoC poderia fazer mais para estimular o Cips, ainda que com um risco de crédito relevante. “O PBoC poderia estabelecer uma linha de swap em dólares para fornecer liquidez em moeda forte para a Rússia, por exemplo”, exemplifica.

Alicia, do banco canadense, acrescenta que o desenvolvimento da moeda digital (E-CNY) também é um catalisador para o CIPS e ambas as ferramentas financeiras tendem a desempenhar papéis importantes na internalização da moeda chinesa, inclusive. A China começou a explorar uma moeda digital soberana em 2014 e os testes do chamado “yuan digital” começaram em maio de 2020. A moeda foi usada como teste durante os recentes Jogos Olímpicos de Inverno, em Pequim e outras cidades-testes. No total, mais de 260 milhões de usuários individuais na China possuem a carteira digital de yuans.

“Mas o E-CNY ainda não está pronto para ser usado amplamente na China e a Rússia provavelmente não está muito interessada em aceitá-lo com um rublo em queda livre”, pondera a economista do banco canadense. “A Rússia está com problemas, mas não desesperada o suficiente para mudar sua moeda para uma moeda digital não conversível que o CBR não pode emitir”, conclui.

Com Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor Econômico

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