Telo, do Credit Suisse: ‘O mercado já precifica alguns cortes de juros’
Diretor de investimentos do banco projeta dólar no fim do ano em R$ 5,40
Com a taxa de juros em um nível restritivo e indicações de que a Selic deve permanecer inalterada em 13,75% ao menos no próximo trimestre, o diretor de investimentos (CIO) do Credit Suisse na América Latina, Luciano Telo, diz preferir a exposição à renda fixa doméstica, em especial os títulos atrelados à inflação (NTN-Bs).
“O mercado já precifica alguns cortes de juros e há uma série de indicadores que pode sancionar ou não a vontade do mercado de ver juros mais baixos no fim do ano”, disse em entrevista ao Valor.
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“É possível que o BC vá, ao longo do tempo, reconhecendo que a inflação converge e que o risco é um pouco menor”, diz Telo, para quem um eventual corte de juros pode acontecer somente na segunda metade do ano. Ele nota que o forte desempenho do real deve ser visto no primeiro semestre, esperando uma depreciação da moeda brasileira até dezembro.
Para o Credit Suisse, o dólar termina o ano em R$ 5,40.
Veja os principais pontos da entrevista.
Arcabouço fiscal
Não vemos dificuldades para aprovação no Congresso. Imaginamos que esse projeto foi apresentado para as lideranças do Congresso, para mostrar o que estava sendo feito, e todas as sinalizações que a gente recebe apontam na direção de que deve ser uma tramitação relativamente fácil. É importante o fato de existir uma regra e de conhecermos as metas do governo, porque conseguimos saber se a execução está na direção certa. Todo mundo fez a conta e viu que quando coloca o crescimento esperado para o Brasil e a velocidade com que as despesas crescem, isso não daria tão facilmente o equilíbrio fiscal em dois anos. O que tem acontecido agora é a busca por ações pontuais de arrecadação, como o ministro Fernando Haddad [Fazenda] comentou. O mercado reagiu bem ao fato de que existe uma regra, e vimos uma retirada estrutural de prêmios de risco. Daqui em diante, é preciso entender como essa equação será fechada.
Atuação do Banco Central
O discurso do BC tem sido muito coerente e técnico, reconhecendo que a inflação está mais alta do que a meta que ele tem que entregar. Tenho certeza de que o BC vai dizer que está olhando para o balanço de riscos, mas a decisão de mudança de política é uma decisão mais à frente. A inflação corrente de 12 meses ficou abaixo de 5%, mas algumas deflações no ano passado ainda vão sair da conta. Aí o mercado vai entender que ainda existe um caminho a ser percorrido. O mercado já precifica cortes de juros e há uma série de indicadores para sancionar ou não essa vontade do mercado de ver juros mais baixos no fim do ano. É possível que o BC vá, ao longo do tempo, reconhecendo que a inflação converge e que o risco é um pouco menor, mas isso não é forte o suficiente agora.
Exposição à renda fixa
Temos uma posição pequena em prefixados, que têm tido um bom desempenho neste ano. Fizemos uma simulação, assumindo que não teremos cortes nos juros até agosto, que o ciclo começaria com uma redução de 0,25 ponto e, depois, aceleraria para cortes de 0,5 ponto e que terminaria em 11,25%. É mais ou menos o que está precificado hoje na curva. O mercado está relativamente realista e até um pouco otimista com esse cenário, mas entendendo que esse ciclo de cortes é possível. Então, eu tenho mantido a minha posição pequena em prefixados. Não acredito que haja muito espaço para aumentar a posição, assim como nos juros reais, apesar de ainda vermos a classe como atraente e termos uma posição até um pouco mais alta do que a média histórica. Taticamente, estamos mais expostos à renda fixa. Reconhecemos que o ciclo já chegou no auge e que o próximo movimento, provavelmente, é que o prêmio diminua tanto nos prefixados quanto nas NTN-Bs. Mas é algo mais para o segundo semestre. Além disso, os juros estão altos, então acredito que ainda é positivo ficar os próximos três meses com alocação desse tamanho, até porque não dá para abrir mão do carregamento com o juro a 13,75%, que diminui a volatilidade da carteira. Não pretendemos aumentar risco no momento.
Meta de inflação
O ideal para a meta de inflação é ter um norte muito claro. Quanto menos mexer em regras, menor os prêmios de incerteza no futuro. Trabalhamos com a possibilidade de a meta mudar, o que dificulta tomar riscos e alongar posições.
Câmbio
As moedas da América Latina lideram as valorizações no ano, com termos de troca melhores que os pares asiáticos e com os juros elevados e as inflações começando a convergir para as metas. Se o Fed parar [de elevar os juros] e os BCs utilizarem esse espaço para cortar juros, naturalmente deveria ter algum impacto no câmbio. Nossa projeção para o dólar no fim do ano é R$ 5,40, e não no nível próximo de R$ 5 que temos agora. Dependendo do quão bem-sucedidos forem os países em termos de crescimento e inflação, pode ser que não haja um impacto tão grande na moeda, mas, provavelmente, o real vai ter o seu melhor momento no ano neste primeiro semestre.
Renda variável
Não achamos que é um ano especial para a bolsa nem aqui e nem mesmo lá fora. Sempre tivemos de 30% a 40% da carteira em ações; hoje temos 10%. A bolsa brasileira fugiu do seu comportamento histórico e não acompanhou a valorização da bolsa americana neste ano, muito por conta do custo de oportunidade. Parte relevante do investimento na bolsa era local, com o movimento do varejo indo em direção ao ativo. Recentemente, vimos saída de recursos de fundos de ações, basicamente porque o brasileiro tem uma alternativa que é o juro real, que remunera a inflação com menos risco. Olhando para dentro da bolsa, temos ficado mais posicionados em exportadoras. E, como existem questões da governança que o mercado tem mostrado algumas dúvidas, talvez estejamos um pouco mais presentes nas empresas ligadas às commodities metálicas. Existem papéis muito descontados em vários setores, mas não temos visto gatilhos para que isso vire preço neste momento.
Reforma tributária
A reforma tributária tem potencial para ser um fator positivo. Só não sabemos qual será o efeito final, se haverá aumento da carga ou uma simplificação. A decisão de fazer no primeiro semestre uma discussão muito mais na linha de simplificação pode ser um elemento favorável pensando em termos de crescimento de longo prazo. Mas temos que olhar como a carga tributária final fica. Se houver aumento grande, podemos ter impacto no crescimento e se houver a busca por soluções setoriais, também vamos ter impacto, na medida em que a incerteza aumenta.
Por Matheus Prado e Victor Rezende