Análise: economia e empreendedorismo podem explicar a derrota da esquerda em São Paulo

Marçal captou melhor a questão e por pouco não foi ao segundo turno; votos do candidato não migraram para Boulos.

Os candidatos a prefeito de São Paulo nas eleições de 2024: Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL). Fotos: Edson Lopes Jr. / Prefeitura de SP e Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados. Montagem: Agência Brasil

Os últimos dias que antecederam o segundo turno foram intensos. Mas o de sempre ocorreu. Ricardo Nunes (MDB), candidato a reeleição adotou postura defensiva pois estava à frente das pesquisas de intenção de votos. Guilherme Boulos (PSOL) partiu para o ataque para alcançar o impossível: tirar mais de dez pontos porcentuais de diferença e se eleger prefeito. Não conseguiu e o resultado talvez mostre algo que pode ter passado ao largo de debate da esquerda: a economia – ou o empreendedorismo – podem estar no centro da decisão em São Paulo.

Apagão, não empreendedorismo

Não foi o assunto no começo do segundo turno, quando o apagão elétrico tomou conta do debate. A estratégia do psolista parecia clara: houve falha de gestão grave por parte de uma empresa privada que fornece a energia em SP. E o enorme problema que atingiu milhões de pessoas poderia ser vinculado com a má administração de Nunes à frente da prefeitura.

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O eleitor não se sensibilizou. Ou se sensibilizou pouco.

Empreendedorismo: um motorista chamado Paulo

Assim, no finzinho da segunda fase da campanha, um vídeo publicado no Instagram de Boulos mostrou que o caminho talvez fosse outro, o da questão do emprego. Ou da economia.

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Ou da falta de emprego convencional que leva muitos e muitos trabalhadores para o caminho do empreendedorismo.

No vídeo, uma pessoa fala da dureza que é dirigir como motorista de aplicativo. Conta da rotina de 15 horas, interrompida apenas para comer e ir ao banheiro, e diz que a cidade não lhe dá nada em troca. Ao contrário. Diz que por isso vai votar em Boulos, colocado por ele como o candidato da mudança.

Era o gatilho de que algo poderia estar errado na campanha de Boulos. E que a pesquisa feita pelo Instituto Locomotiva a pedido da Veja estava certa.

Dessa forma, um dado, mais do que todos outros, chamou a atenção e consolidou essa visão. 56% dos entrevistados – mais da metade, portanto – disse que o empreendedorismo é o melhor caminho para ascender na vida.

Empreendedorismo para conquistar seu sonho

Assim, dados da pesquisa Monitor Global de Empreendedorismo, realizada pelo Sebrae em parceria com a Associação Nacional de Estudos e Pesquisas em Empreendedorismo, diz que a principal motivação para empreender é fazer a diferença no mundo.

É um conceito muito amplo para analisar de forma precisa.

Mas o segundo e terceiro colocados na lista são bem práticos. Empreendedores querem viajar pelo país e comprar a casa própria. Não nos parece ser o sonho de um empreendedor em série ou o inovador por trás de uma startup. É o brasileiro comum que antes tinha emprego com carteira assinada e agora não o tem.

Ah, outro dado. Em 2020, metade das pessoas que começaram um negócio era por necessidade. Hoje, o número caiu, mais ainda é de 39% do total.

A campanha da esquerda não entendeu isso.

Quem capturou o ‘fator empreendedorismo’ foi Marçal

Falastrão e caricato, foi justamente Pablo Marçal quem talvez tenha captado esse anseio da população por condições melhores de trabalho e para empreender.

A despeito de tudo o que foi a sua campanha, reforçada justamente por uma estratégia muitas vezes condenável, Marçal conquistou 1.719.274 votos no primeiro turno.

Num vídeo postado em uma rede social antes do primeiro turno por um empreendedor de sucesso em São Paulo, Marçal faz um breve discurso. Disse que 80% das pequenas empresas fecham até o terceiro ano. Que iria dar foco a isso no seu eventual governo. E que para ele aumentar o empreendedorismo é aumentar também a geração de empregos.

E, por muito pouco, não foi ao segundo turno. Boulos registrou 1.776.127 votos. Foi, portanto, uma diferença de 56,8 mil votos. O que não seria capaz de lotar o estádio do São Paulo, o Morumbi, hoje com capacidade pouco superior a 65 mil pagantes.

E os dados indicam que os votos de Marçal migraram mais para Nunes do que para Boulos, que não conseguiu captar nem a integralidade dos votos de Tabata Amaral, que fez 605.552 votos. Veja a tabela abaixo.

CandidatoVotação 1º turnoVotação 2º turnoDiferença totalDiferença porcentual
Ricardo Nunes1.8011393.393110+ 1591.71+ 88,38%
Guilherme Boulos1.776.1272.323.901+ 547.774+ 30,84%
Pablo Marçal1.719.274Não participou N/D N/D
Tabata Amaral605.552Não participou N/D N/D
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral (TSE)

Assim, sempre que uma candidatura perde, a coligação toda deve (ou pelo menos deveria) refletir o que deu errado. E a questão do emprego e do empreendedorismo talvez seja um bom começo para a esquerda.

Afinal, 2026 está logo ali na esquina.

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