Acionistas aprovam privatização da Eletrobras

Companhia supera etapa para viabilizar processo de capitalização no segundo trimestre do ano

Marca da Eletrobras. Foto: Brendan McDermid/Reuters
Marca da Eletrobras. Foto: Brendan McDermid/Reuters

Os acionistas da Eletrobras aprovaram na noite de terça-feira (22), em Assembleia Geral Extraordinária (AGE), os termos da privatização da companhia. Com o aval, a empresa supera mais uma etapa dentro da corrida de obstáculos para que consiga viabilizar seu processo de capitalização no segundo trimestre, como desejado pela empresa e pelo governo federal.

A AGE durou pouco mais de cinco horas. O Valor apurou que houve questionamentos por parte dos minoritários, na figura do ex-conselheiro da estatal, João Antônio Lian, e da Associação dos Empregados da Eletrobras (AEEL), por meio de representante jurídico. A votação, digital, chegou a ser interrompida algumas vezes, para que a administração da companhia preparasse os esclarecimentos para cada contestação. Ao fim, os itens foram todos votados com ampla margem de aceitação. A União se absteve.

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No último ponto da pauta, os acionistas deram o aval para a desestatização da Eletrobras, em si. O item foi aprovado por detentores de 202,617 milhões de ações ordinárias da companhia, enquanto acionistas representantes de 9.749 papéis foram contrários e as abstenções somaram 884,482 milhões de votos. Ao todo, os acionistas deliberaram sobre 12 itens contidos na pauta. Todos eles precisaram ser aprovados, sem exceção, para que os demais tivessem eficácia.

A capitalização da Eletrobras ocorrerá via aumento de capital. A estatal emitirá novas ações por meio de uma oferta primária e a União renunciará ao direito que tem de subscrição. O objetivo é que a participação (direta e indireta) da União seja diluída dos atuais 72,33% do capital votante para 45% ou menos. Caso a oferta primária não seja suficiente para atingir o limite pretendido, será feita uma oferta secundária das ações ordinárias detidas pela União.

A última grande pendência a ser superada antes do lançamento da oferta das ações da Eletrobras será o aval final do Tribunal de Contas da União (TCU) – cujos ministros aprovaram, na semana passada, os estudos técnicos para a desestatização da empresa, mas que ainda vão se debruçar sobre os últimos detalhes da operação, como o preço das ações. A expectativa no governo é que esse processo seja concluído até o início de abril.

Antes da AGE, a Associação dos Empregados de Furnas (Asef) tentou obter uma liminar na Justiça para suspender a assembleia. O pedido foi apresentado às 7h40 e antes do início da reunião, por volta das 14h, circulava nos bastidores a decisão judicial que inviabilizou o pedido. Na decisão, a juíza Flávia de Macedo Nolasco, da 9ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, reconheceu a incompetência para processar e julgar a ação e determinou a remessa dos autos à 11ª Vara Cível da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, onde correm outros processos. Ao menos outras quatro frentes, encabeçadas por, dentre outros atores, deputados do PT e pela AEEL, tentaram suspender o encontro, por meio de contestações na Justiça e na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas nenhuma prosperou.

A seguir, leia cada um dos itens aprovados pelos acionistas:

1) Reestruturação societária

Os acionistas deram o aval aos termos da transferência do controle da Eletronuclear e da participação da Eletrobras em Itaipu para a Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional S.A. (ENBPar). A nova estatal foi criada para manter o controle da União sobre esses dois ativos, que não poderão mais ser controlados pela Eletrobras depois que a empresa for privatizada. Pela Constituição, a União tem monopólio sobre a operação de usinas nucleares no país. O Tratado de Itaipu, celebrado entre Brasil e Paraguai para a construção da usina binacional, também prevê a participação estatal na hidrelétrica.

Pelas condições estabelecidas e aprovadas pelos acionistas da Eletrobras, a companhia receberá da ENBPar R$ 1,2 bilhão pela transferência dos 50% que detém em Itaipu. Já dentro da reestruturação societária na Eletronuclear, haverá uma emissão de novas ações pela Eletronuclear. A ENBPar terá que fazer um aporte de R$ 3,5 bilhões na empresa de energia nuclear, para assumir o controle do ativo. O item foi aprovado por detentores de 202,6 milhões de ações e rejeitado por donos de 34,1 papéis. A abstenção totalizou 884,458 milhões de votos.

2) “Descotização”

Ficam aprovados os termos da “descotização” das usinas da Eletrobras e do uso dos recursos levantados com a operação para o pagamento de R$ 25 bilhões em outorga à União e mais R$ 32,1 bilhões à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). A “descotização” prevê a assinatura de novos contratos de concessão para as usinas da empresa, com o objetivo de que as hidrelétricas da companhia deixem de vender energia sob o regime de cotas, com preços regulados e mais baixos, e tenham a possibilidade de operar no mercado livre, a preços mais competitivos. A expectativa é que o aporte na CDE ajude a amortizar custos nas tarifas de energia para os consumidores.

O item foi aprovado por detentores de 202,638 milhões de ações e rejeitado por donos de 34,8 papéis. A abstenção totalizou 884,437 milhões de votos.

3) Contribuições à pesquisa

Os acionistas aprovaram a manutenção do pagamento das contribuições associativas da Eletrobras ao Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), pelo prazo de seis anos após a privatização, como previsto na Lei 14.182/2021 – que autoriza a desestatização da Eletrobras. O item foi aprovado por detentores de 202,609 milhões de ações e rejeitado por donos de 62,9 papéis. A abstenção totalizou 884,437 milhões de votos

4) Revitalização de bacias

Outro item aprovado foi a destinação de parte dos recursos levantados na capitalização para programas de revitalização dos recursos hídricos nas bacias dos rios São Francisco e Parnaíba, assim como na área de influência dos reservatórios das hidrelétricas da subsidiária Furnas. Uma parcela dos recursos também será destinada a projetos para reduzir estruturalmente custos com geração de energia na Amazônia, além de melhorias na navegabilidade dos rios Madeira e Tocantins.

O item foi aprovado por detentores de 202,637 milhões de ações e rejeitado por donos de 14 mil papéis. A abstenção totalizou 884,437 milhões de votos

5) Oferta em Nova York

A AGE autorizou a realização da oferta, no âmbito da capitalização da Eletrobras, não só das ações ordinárias da companhia, mas também dos American Depositary Receipts (“ADRs”), negociados na Bolsa de Valores de Nova York (EUA). O item foi aprovado por detentores de 184,159 milhões de ações e rejeitado por donos de 18,492 milhões de papéis. A abstenção totalizou 884,457 milhões de votos

6) Preparativos da capitalização

Os acionistas também autorizaram o conselho de administração da Eletrobras a definir os detalhes da privatização. Com isso, o conselho passa a ter poderes para estabelecer o cronograma, estrutura e preços da emissão de novas ações para o aumento de capital da empresa. Além disso, o CA será responsável pela aprovação dos prospectos, formulários e demais documentos necessários à oferta dos papéis no Brasil e no exterior. Aprovaram esse item detentores de 202,64 milhões de ações, enquanto detentores de 11.511 papeis foram contrários. As abstenções totalizaram 884,457 milhões de votos.

7) Reforma do estatuto I

Os acionistas aprovaram a reforma do estatuto social da Eletrobras, de forma a permitir que o Conselho de Administração aumente o capital social da companhia até o limite de R$ 80 bilhões, mediante a emissão de novas ações ordinárias. A proposta também prevê a exclusão do direito de preferência dos acionistas na subscrição de ações emitidas por meio de ofertas públicas, nos termos do art. 172, caput e inciso I, da Lei das S.A. Aprovaram esse item detentores de 202,49 milhões de ações, enquanto detentores de 132.294 papeis foram contrários. As abstenções totalizaram 884,480 milhões de votos.

8) Reforma do estatuto II

Com a aprovação da reforma do estatuto da empresa, consequentemente, os acionistas também homologaram a inclusão de novos trechos no estatuto, como a autorização para que o conselho de administração aprove a emissão de ações da companhia e a possibilidade de não haver direito de preferência dos acionistas na subscrição de ações emitidas na nova oferta pública. O item contou com a aprovação de detentores de 202,641 milhões de ações. Rejeitaram a proposta donos de 8.906 ações. As abstenções totalizaram 884,459 milhões de votos.

9) Golden share

Os acionistas deram aval à criação da “golden share” (ação especial que dá poder de veto à União em algumas decisões). A ação de classe especial será subscrita pela União para sua propriedade exclusiva e visa, na prática, manter a Eletrobras como corporation, sem controle definido, após a privatização. Ou seja, dará o poder de veto nas deliberações sociais que visarem modificar ou remover os novos dispositivos do estatuto que vetarão qualquer acionista ou grupo de acionistas de exercer votos em número superior a 10% do capital votante; e que vedarão a celebração de acordo de acionistas para o exercício de direito de voto, exceto para a formação de blocos com número de votos inferior a 10% do capital votante. Aprovaram esse item detentores de 195,593 milhões de ações, enquanto detentores de 7,036 milhões de papéis foram contrários. As abstenções totalizaram 884,479 milhões de votos.

10) Reforma do estatuto III

Também foram aprovadas diversas outras alterações no estatuto social para adequar o texto à atuação da Eletrobras como empresa privada e para a inclusão da “golden share”. O item contou com a aprovação de detentores de 195,604 milhões de ações. Rejeitaram a proposta donos de 7,046 milhões de ações. As abstenções totalizaram 884,458 milhões de votos.

11) Assinatura de contratos

Os acionistas autorizaram que a Eletrobras e suas subsidiárias celebrem e assinem, antes da efetiva desestatização, os instrumentos jurídicos previstos nos processos de transferência de Itaipu e Eletronuclear para a ENBPar e na “descotização” das usinas da companhia. Os acordos deverão conter cláusulas de condição suspensiva, por meio da qual seus efeitos estão condicionados à efetiva privatização da empresa. Aprovaram esse item detentores de 202,608 milhões de ações, enquanto detentores de 43.056 papeis foram contrários. As abstenções totalizaram 884,458 milhões de votos.

12) Desestatização

Por fim, no último ponto da pauta, a AGE aprovou a desestatização da Eletrobras, em si. O item foi o último a ser apreciado, porque a aprovação da privatização estava condicionada à homologação de todos os demais assuntos deliberados na AGE. A capitalização ainda depende da validação do processo pelo TCU. O item foi aprovado por detentores de 202,617 milhões de ações ordinárias da companhia, enquanto acionistas representantes de 9.749 papéis foram contrários.

Houve questionamentos a respeito da aprovação do tema sem a publicação dos resultados da companhia referentes ao ano de 2021, que serão usados como base para a capitalização. A publicação do balanço anual estava prevista para este mês, mas foi adiada para março.

Com Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor Econômico

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