Mudança de domicílio fiscal: como se planejar?

Cada vez mais pessoas considera mudar de domicílio fiscal por razões profissionais, acadêmicas ou familiares. Como se organizar e evitar ser surpreendido pela Receita Federal?

Braga, em Portugal: um dos destinos preferidos pelos brasileiros que mudam para o exterior - Fogo: Divulgação
Braga, em Portugal: um dos destinos preferidos pelos brasileiros que mudam para o exterior - Fogo: Divulgação

A globalização tem incentivado cada vez mais pessoas a considerarem a mudança de domicílio fiscal. Seja por razões profissionais, acadêmicas ou familiares, a mudança para um novo país requer um planejamento cuidadoso.

Não se trata apenas de uma questão de localização física. Envolve complexidades legais, tributárias e administrativas que precisam ser devidamente gerenciadas para evitar complicações futuras.

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Mudança de domicílio fiscal: aspectos imigratórios

O primeiro passo na mudança de domicílio fiscal é a análise dos aspectos imigratórios.

É fundamental realizar uma pesquisa detalhada sobre os tipos de visto e autorizações de residência disponíveis no país de destino. Do mesmo modo, a do país de destino pode ter implicações diretas na residência fiscal e domicílio do indivíduo. Contudo, alguns vistos não garantem a condição de residente fiscal. Enquanto outros podem proporcionar essa condição de imediato.

Mudança de domicílio fiscal: aspectos tributários

A mudança de residência fiscal também exige uma análise cuidadosa dos impactos tributários sobre os ativos mantidos tanto no Brasil quanto no exterior.

É fundamental compreender como o patrimônio será tributado na nova jurisdição, o que pode revelar a necessidade de encerrar estruturas patrimoniais antigas e adotar novas, mais eficientes e alinhadas com as leis tributárias do novo país de residência.

Além disso, alguns países possuem acordos para evitar a bitributação, que podem ser considerados na elaboração de uma estratégia de investimentos eficiente. Nesse sentido, consultar especialistas em planejamento patrimonial pode ajudar a identificar as melhores soluções.

Saída Definitiva do Brasil

Para que um indivíduo adquira a condição de não residente no Brasil, é necessário seguir procedimentos específicos estabelecidos pela Receita Federal.

Primeiramente, deve-se preencher a Comunicação de Saída Definitiva, disponível no site da Receita Federal. Esta comunicação deve ser elaborada até o final de fevereiro do ano subsequente à saída do país. Ela tem caráter declaratório.

Ou seja, informa à autoridade administrativa sobre a mudança de residência fiscal do indivíduo.

Rendimentos

Caso o indivíduo continue a receber rendimentos de fontes brasileiras, é necessário enviar um Comunicado da Condição de Não Residente às Fontes Pagadoras.

Este documento, gerado durante o preenchimento da Comunicação de Saída Definitiva, tem como objetivo informar às fontes pagadoras sobre a nova condição fiscal do indivíduo.

Nesse sentido, pode haver alteração das regras tributárias aplicáveis aos rendimentos recebidos, bem como dos responsáveis pelo recolhimento de eventuais tributos devidos.

O que acontece caso não apresente a Declaração de saída definitiva?

Além disso, é crucial apresentar a Declaração de Saída Definitiva utilizando o mesmo programa da DAA (Declaração de Ajuste Anual).

Esta declaração deve ser submetida até o final de abril do ano subsequente à saída do país. Ela tem o objetivo de tributar o indivíduo pelo período em que permaneceu como residente no Brasil durante o ano da saída.

Se houver imposto devido, o valor deverá ser pago em quota única até a data estipulada.

A não apresentação da Declaração de Saída Definitiva pode resultar em consequências sérias. Por exemplo, a continuidade da residência fiscal no Brasil. Em outras palavras, o indivíduo continua sujeito à tributação sobre sua renda global. Além disso, a falta de comunicação adequada pode levar a penalidades e multas impostas pela Receita Federal.

Mudança de domicílio fiscal: bancos

Ao informar a instituição financeira sobre a nova condição fiscal, será necessário fechar a conta de residente e abrir uma conta de não residente.

A conta de residente fiscal no Brasil é mais conhecida como 2025, enquanto as contas de não residente fiscal no Brasil possuem duas modalidades: a CDE (Conta de Domiciliado no Exterior) e a 4373.

Conta de Domiciliado no Exterior

A CDE é geralmente utilizada para a manutenção de despesas relativas a bens detidos no Brasil.

Ela possui alocação restrita no mercado de capitais brasileiro, sendo permitida, em geral, a aplicação em poupança, CDB (Certificado de Depósito Bancário) e planos de previdência VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre).

É importante, entretanto, checar com a respectiva instituição financeira quais produtos são ofertados no âmbito da CDE.

Conta 4373

A conta 4373, por outro lado, permite uma participação mais abrangente no mercado de capitais brasileiro, desde que, como regra, a operação ocorra em mercado organizado.

A transferência dos investimentos da conta 2025 para a conta 4373, entretanto, exige a avaliação dos ativos a valor de mercado e o recolhimento do Imposto de Renda sobre eventuais ganhos.

Essa transferência, ainda, permite que o não residente seja tributado com base em um regime especial, estando os ativos sujeitos, em geral, a alíquotas mais baixas de Imposto de Renda.

Para definir a exata carga tributária, é importante que seja realizada uma análise pormenorizada da carteira do investidor.

Abertura de contas bancárias no exterior

Além das mudanças nas contas bancárias no Brasil, é importante considerar a abertura de contas bancárias no país de destino.

Muitas vezes, essas contas serão necessárias para a gestão de despesas diárias, investimentos locais e para cumprir com as exigências fiscais locais.

Cada país possui suas próprias regulamentações e requisitos para a abertura e manutenção de contas bancárias, sendo aconselhável iniciar esse processo com antecedência.

Mudança de domicílio fiscal: centro de interesses vitais

Para que a mudança de domicílio fiscal seja efetiva, é essencial que o centro de interesses vitais do indivíduo esteja no país de destino.

O centro de interesses vitais é definido pelo local onde o indivíduo possui relações pessoais e econômicas mais estreitas. Caso contrário, a Receita Federal do Brasil poderá contestar a saída definitiva do indivíduo.

A determinação do centro de interesses vitais envolve uma análise abrangente de vários fatores. Entre os critérios considerados pela jurisprudência estão a localização do emprego principal. Além disso, a residência permanente da família. E ainda a proporção dos ativos mantidos no país, a existência de planos de saúde, associações a clubes e outras organizações locais. Até mesmo a presença de animais de estimação é considerada.

Residência em Portugal, mas interesses vitais no Brasil: multa do CARF

Esses elementos ajudam a estabelecer onde se encontram as relações pessoais e econômicas mais fortes do indivíduo.

Em um caso analisado pelo CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), o contribuinte residia em Portugal desde 1993, onde foi contratado por empresa local para exercer cargo de diretor.

O contribuinte foi autuado em relação ao ano-calendário de 2010 por omissão de informações, vez que apresentou a Declaração de Ajuste Anual (DAA) e declarou apenas os rendimentos auferidos no Brasil.

O voto vencedor entendeu que o contribuinte possuía residência fiscal no Brasil, pois, dentre outros aspectos, ficou constatado seu interesse em manter o vínculo fiscal com o país ao apresentar a DAA.

Além disso, o centro de interesses vitais ficou definido como sendo o Brasil pelo fato de o contribuinte possuir uma série de imóveis no país e auferir rendimentos a partir deles (16095.720100/2014-98).

Residência no Brasil, mas interesses vitais na Argentina: multa do CARF

Outro caso diz respeito a um contribuinte que residia na Argentina, porém possuía visto permanente no Brasil, obtido para viabilizar sua atuação como diretor em sociedade brasileira.

O contribuinte foi autuado em relação ao ano-calendário de 2010 por declaração errônea de informações, vez que apresentou a DAA e declarou os rendimentos auferidos no exterior como isentos e não tributáveis.

Alegou, ainda, que sua família, seu ânimo de residência, a maioria de seus bens e outras empresas das quais é sócio, acionista, administrador ou diretor se encontram na Argentina.

Nesse sentido, restou comprovado que o contribuinte possuía seu centro de interesses vitais na Argentina.

Residência na Itália, mas interesses vitais no Brasil: multa do CARF

Por fim, vale trazer um último caso no qual o contribuinte residia na Itália, porém possuía visto temporário no Brasil, onde passou 79 dias do ano-calendário de 2004, sendo que, apenas em 2005, adquiriu o visto permanente.

O contribuinte foi autuado em relação ao ano-calendário de 2004 por omissão de informações, vez que não declarou rendimentos recebidos em conta corrente.

Neste caso, restou comprovado que o contribuinte possuía seu centro de interesses vitais no Brasil, local onde possuía emprego assalariado, bem como outros bens e direitos, como ações, fundos de investimento, saldo em conta corrente e poupança, sendo a maioria adquirida após a mudança para o Brasil.

Paraísos Fiscais e Regimes Fiscais Privilegiados

Se a mudança de domicílio for para um país considerado paraíso fiscal ou com regime fiscal privilegiado, são necessários cuidados adicionais.

É exigida a residência de fato no respectivo país, o que pode ser comprovado por meio da permanência por mais de 183 dias, consecutivos ou não, no período de até 12 meses, ou pela residência habitual da família e maior parte do patrimônio no país.

Vale dizer que o período de 12 meses consiste em uma janela móvel e, portanto, os 183 dias no país podem ser contabilizados no mesmo ano ou em anos distintos.

Além disso, podem existir outras regulamentações específicas a serem consideradas no planejamento pré-imigratório.

Mudança de domicílio fiscal: aspectos sucessórios

O processo de redomicílio também enseja a consideração de aspectos sucessórios da jurisdição de destino. Isso porque, de acordo com a LINDB (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), as regras sucessórias aplicáveis são aquelas do último domicílio do falecido.

Sendo assim, em geral, estando o falecido domiciliado no exterior, não serão aplicáveis as regras sucessórias brasileiras. À exceção para o caso de bens localizados no Brasil, quando a lei estrangeira for menos favorável do que a lei brasileira em relação ao cônjuge e aos filhos brasileiros.

Também deve-se verificar se os instrumentos sucessórios elaborados no Brasil serão validos no país de destino. Por exemplo, é importante checar se o testamento e as respectivas disposições testamentárias poderão ser considerados.

Por fim, ainda na sucessão, eventuais impactos tributários na nova jurisdição devem ser analisados, sempre com auxílio de assessores legais.

Conclusões

Como vimos, o planejamento pré-imigratório envolve várias etapas:

  • a análise das questões imigratórias e tributárias;
  • a revisão das estruturas patrimoniais;
  • e a preparação da documentação necessária, devendo ser iniciado com antecedência suficiente.

Ainda, dada a complexidade e as múltiplas facetas do processo de redomicílio, é altamente recomendável contar com a assessoria de profissionais especializados em planejamento patrimonial.

Isso porque um planejamento pré-imigratório bem estruturado pode garantir uma transição tranquila e eficiente para um processo que já é complexo por si só.

A Inteligência Financeira é um canal jornalístico e este conteúdo não deve ser interpretado como uma recomendação de compra ou venda de investimentos. Antes de investir, verifique seu perfil de investidor, seus objetivos e mantenha-se sempre bem informado.

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