Os novos VIPs: como influencers e tiktokers tomaram o lugar de celebridades nos camarotes
Conhecidos da Geração Z e alvos de ações de marketing vêm recebendo atenção das empresas por se comunicarem com nichos específicos
Se já não era fácil acomodar tantos famosos em camarotes de grandes eventos, nos últimos tempos a equação para fazer caber todo mundo na lista VIP ficou ainda mais complexa. Enquanto a pandemia de Covid esvaziava calendários, a tela dos celulares bombava com o sucesso de plataformas como TikTok, em que surgiram mais “personalidades digitais”, especialmente íntimas da Geração Z. Em 2022, pela primeira vez, estes novos ídolos puderam saltar da frente do ringlight e foram conferir ao vivo a popularidade que seu conteúdo vem gerando.
“Hoje, saio na rua e sempre tem pessoas querendo tirar fotos. Nunca achei que ia ser uma celebridade, nem me intitulo assim”, diz Maria Clara Garcia, que tem 18 anos e 18,7 milhões de seguidores no TikTok.
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O último Rock in Rio foi um exemplo. Na área VIP do evento, jardim suspenso dos convidados da promoter Carol Sampaio, e nos 15 estandes de marcas espalhados pelo Parque Olímpico, influencers, streamers e, claro, tiktokers monopolizaram olhares e pedidos de fotos, desfrutando de todos os luxos que, antes, eram exclusividade de celebridades da música, da TV e do esporte.
Além de Maria Clara Garcia, nomes como Vanessa Lopes, Pequena Lo, Matheus Costa e outros tantos que despontaram na plataforma chinesa de vídeos curtos eram unanimidade entre crianças e adolescentes da área VIP. A todo momento, os influenciadores eram parados ou cutucados para tirarem fotos.
“Uma grande mudança de 2019 (última edição do Rock in Rio) para este ano foi uma maior inclusão dos influenciadores digitais. Eles chegaram bem forte. Então, precisamos administrar essa mudança de uma maneira que a lista mescle tanto esses influenciadores como artistas”, explica Carol Sampaio, que faz uma ponderação. “Para a pessoa ser chamada, precisa ser destaque, independentemente da área de atuação dela. E também precisa ter ligação com o evento.”
Ídolos de milhões
Na hora de montar a lista de convidados para um evento do porte do Rock in Rio ou do Lollapalooza, a ser realizado em março de 2023, engana-se quem pensa que o número de seguidores é o principal critério. Para os promoters Liège Monteiro e Luiz Fernando Coutinho, que atuam na área desde 1990, tudo depende do perfil do evento.
“A não ser que seja uma exigência do contratante, essa questão de números de seguidores é, muitas vezes, uma farsa. Hoje muita gente compra seguidores, likes nas postagens, participa de grupos de engajamento, usa robôs para alavancar os números, então tudo pode ser um grande engano”, explica Luiz Fernando.
O também influenciador Matheus Costa esteve presente no Rock in Rio todos os dias e compartilhou alguns registros de carinho do público com ele. Era sair do lounge do estande do TikTok e vinha logo um fã apertar mão, abraçar e pedir retrato.
“Que bom que a internet dá a oportunidade de cada um mostrar seu talento sem precisar passar por teste de ninguém ou por aprovação de terceiros. Hoje, cada um vai lá, mostra seu trabalho como e quando quer. Quem gostar, gostou”, comemora o carioca de 26 anos, que chegou à marca de cinco milhões de seguidores na plataforma de vídeos curtos.
Busca por engajamento
Segredo para o sucesso não existe, afirma Ronaldo Marques, head de parcerias de conteúdo do TikTok Brasil. Mas existem elementos que normalmente favorecem o compartilhamento do conteúdo dos aspirantes a tiktokers. Exemplos: pensar em um storytelling (uma narrativa que o público identifique facilmente), explorar as ferramentas do próprio aplicativo (“atenção para a tela cheia e em formato vertical”, ressalta Marques), ser rápido para aproveitar as tendências e, principalmente, “ser autêntico”, sublinha o executivo.
Do ponto de vista das empresas, os eleitos para marcarem presença em grandes eventos são escolhidos pela capacidade de “engajamento” — ou seja, entre os milhões de seguidores, quantos de fato interagem com o conteúdo e o compartilham.
E esta performance não fica no achômetro: tudo é medido em tempo real. Ana Paula Castello Branco, diretora de comunicação e branding da TIM Brasil, cujo estande no Rock in Rio recebeu celebridades como Gkay, Jade Picon e a dupla Diva Depressão, tem os números na ponta da língua:
“Fomos a segunda marca do festival mais comentada nas redes, com 85 mil menções. Também registramos um volume de publicações positivas 28 vezes maior do que a média dos meses anteriores. Encerramos o evento com quase 90% de favorabilidade nas redes, um aumento de 31% em relação à média anual.”
Entre a espontaneidade e a estratégia das marcas
Durante o Rock in Rio, a agenda da influenciadora digital Pequena Lo foi agitada. Com sua cadeira motorizada e simpatia, passou por pelo menos um camarote todos os dias do festival. Ela explica que a sua equipe combina com a empresa antes o que precisa ser entregue — ou seja, qual será sua atuação em cada área VIP.
“É tudo uma estratégia. Entra a parte da alimentação, se serei eu a captar as imagens ou o cinegrafista da marca, se é post, feed, stories, se são outras redes sociais. Tem tudo isso detalhado”, diz Pequena Lo. “Tem sempre um roteiro, mas, às vezes, eu improviso. Se um fã vem tirar foto, eu deixo. Tudo faz parte.”
A gerente de Branding da Americanas, Marcelli Valle, conta que antes os contratos com cantores e atores reinavam, mas que em 2022 foi meio a meio a divisão entre nomes da música e da TV e dos influencers. A mudança, diz ela, se deve à eficiência dos influencers ao se comunicar com nichos específicos.
“Há vários tipos de contratos, e cada um com um objetivo”, diz Valle. “Uns são para construção de imagem da marca, outros para mostrar o produto, e outros para ajudar a construir o conteúdo.”
Queridinhos do público
A terceira edição do estudo Media Reactions, da consultoria Kantar, mostra que não são apenas a Americanas que estão surfando na popularidade dos famosos fabricados pela internet. No Brasil e no mundo, a publicidade vinda de conteúdo deles é a preferida, seguida por anúncios em e-commerce e podcasts. Contudo, o levantamento aponta que o planejamento de campanhas tenta evitar a superexposição dos influencers.
Outro levantamento, “Creators e negócios”, da agência Brunch e da consultoria Youpix, observa que a criação de conteúdo já é a única fonte de renda de um a cada três criadores e que eles estão cobrando mais.
“O surgimento de celebridades é sempre igual: validação popular”, observa Bia Granja, cofundadora da Youpix, plataforma especializada em cultura digital brasileira. “Mas vale notar que, mesmo com tanta fama, as celebridades do TikTok não têm conseguido transformar isso em reconhecimento. É comum o fenômeno daquela ‘garota do TikTok’, que tem dois milhões de seguidores, mas de cujo nome ninguém se lembra.”
Por Mari Teixeira e Raphaela Ribas