Análise: Ataque de Bolsonaro ao TSE aumenta instabilidade na “terceira via” e favorece Lula

Ingresso do ex-presidente Michel Temer nas negociações abre precedente para mudanças na reta final das convenções, diz Fábio Zambeli, do JOTA

A insistência do presidente Jair Bolsonaro (PL) em questionar o sistema eletrônico de votação e a exposição feita a embaixadores na segunda-feira (18/7), colocando o tema no centro do debate internacional sobre os rumos do país, levaram atores relevantes de partidos centristas a rever estratégias para a campanha.

O primeiro movimento, detectado entre integrantes de MDB e PSDB, é o de atrasar as tratativas para consolidação da candidatura da senadora Simone Tebet (MS), deixando a definição formal sobre seu registro e sua chapa para a reta final do prazo estipulado pelo TSE. O ato protocolar está previsto para o dia 27, mas as gestões para adiá-lo ganharam corpo nos últimos dias, a despeito da confirmação feita pelo presidente da sigla, Baleia Rossi.

À frente das tratativas para estender o ‘deadline’ está o ex-presidente Michel Temer, com respaldo de diretórios de 9 estados, que preferem antecipar a aliança com Lula, líder nas pesquisas, para a primeira fase do pleito.

Temer, que vinha se mantendo equidistante da polarização Lula-Bolsonaro, entrou definitivamente nas negociações na última semana. Ele tem recebido apoiadores, ex-ministros de seu governo e parlamentares para discutir o agravamento da crise institucional.

O ex-presidente, que tentou no passado selar um armistício entre Bolsonaro e o STF, tendo o amigo Alexandre de Moraes como intermediário, vem sendo advertido por interlocutores do Planalto de que virou “persona non grata” nos gabinetes do Executivo após ganhar visibilidade como protagonista de um recuo temporário do presidente ao Judiciário no calor dos atos de 7 de setembro de 2021.

Embora mantenha laços com bolsonaristas de vários estados, inclusive no seu reduto eleitoral, em São Paulo, Temer passou a fazer cálculos sobre seu futuro e do MDB, legenda sobre a qual ainda mantém alguma ascendência.

Aconselhado por entusiastas da chamada “Frente Ampla”, ele passou a advogar em conversas reservadas que é “prudente” postergar a homologação da candidatura de Tebet, dada a sua inviabilidade política. Para Temer, a senadora não tem chance eleitoral e seria uma aposta para o futuro, mirando 2026.

No entendimento do ex-presidente, contudo, a radicalização da campanha e o risco de uma ruptura institucional induzirão a classe política a tomar posições mais claras logo no início da corrida presidencial.

Em privado, Temer trabalha com duas possibilidades, ainda em gestação: a primeira seria a sua própria candidatura, desde que acompanhada de uma série de apoios partidários que dessem sustentação a um projeto que ele chama de “pacificação nacional”. A segunda seria o imediato alinhamento à candidatura de Lula, propondo um pacto de governabilidade pluripartidário como foco no enfrentamento da crise econômica e social, que tende a se agravar em 2023.

Os obstáculos para essa segunda hipótese vêm sendo paulatinamente removidos por operadores que transitam no entorno de Temer e do PT. A cúpula do partido de Lula ainda se ressente da investida do ex-presidente contra Dilma Rousseff, que resultou no impeachment da petista em 2016.

Aliados de Lula, entretanto, têm falado com Temer na tentativa de atraí-lo. A avaliação desses auxiliares do ex-presidente é a de que o quadro nacional exige pragmatismo e que um eventual crescimento de Bolsonaro nas pesquisas, a reboque de medidas econômicas de curto prazo, pode colocar em risco o projeto lulista.

Muita calma nessa hora

Líderes de partidos do centro que até agora vinham procurando manter a neutralidade na disputa presidencial, como o PSD, continuam céticos em relação à viabilidade de um novo candidato da “terceira via” e entendem que os movimentos de Temer podem servir para desmobilizar a chapa de Tebet, com vistas ao amadurecimento das conversas com o PT até o dia 2 de outubro.

Esses políticos acreditam que impedir a candidatura de Tebet seria improvável e criaria até animosidade entre siglas que tendem a aderir à coligação, como os tucanos e o Cidadania. Além disso, o União Brasil planeja ao menos lançar oficialmente Luciano Bivar para solucionar o impasse no financiamento de palanques regionais e se livrar do assédio de lulistas e bolsonaristas.

“O que pode acontecer é uma depuração no transcorrer da campanha, já que as candidaturas de Bivar e Simone dificilmente decolarão. Neste momento, com a largada das convenções, é natural que exista uma tentativa de colocar de pé uma alternativa. Caso persista o esvaziamento, com a propaganda de TV e o corpo a corpo, esses partidos vão acabar tomando uma posição mais pragmática na reta final. Ainda é cedo para fechar totalmente as portas”, afirma ao JOTA um dirigente de partido centrista.

(Por Fábio Zambeli, analista-chefe do JOTA em São Paulo)