Fintechs quase dobram concessão de crédito em um ano

O total movimentado gira em torno de R$ 12,7 bilhões

A maioria das fintechs opera com pagamentos ou em alguma infraestrutura de mercado e, assim, até pouco tempo atrás o segmento tinha participação ínfima na concessão de crédito. Entretanto, isso vem mudando. As fintechs concederam mais de R$ 12,774 bilhões em crédito em 2021, 96,2% a mais do que no ano anterior e 383,5% acima de 2019. No último ano, o crescimento foi liderado pelo crédito às famílias, com alta de 141%, a R$ 8,324 bilhões, que teve uma expansão bem maior do que para as empresas, com aumento de 46%, a R$ 4,449 bilhões.

Os números são da segunda edição da Pesquisa Fintechs de Crédito Digital, da PwC e Associação Brasileira de Crédito Digital (ABCD). Das fintechs ouvidas, 43% trabalham só com pessoa física, 38% com física e jurídica, e 19%, com jurídica. Nas fintechs que atendem os dois mercados, 74% dos clientes são famílias. Na PF, as principais modalidades de crédito oferecidas são: empréstimo sem garantia (62%), com garantia (41%), consignado (34%), crédito direto ao consumidor (28%) e financiamento de veículos (21%).

Já na PJ, as principais linhas são: financiamento de veículos (27%), capital de giro (23%), crédito geral sem garantias (14%), crédito com garantia (14%) e desconto de duplicatas (9%). As fintechs trabalham principalmente com empresas pequenas — faturamento anual entre R$ 360 mil e R$ 4,8 milhões — que representam 59% da carteira. Microempresas, com faturamento de menos de R$ 360 mil, são 18% do portfólio, e empresas médias (faturamento entre R$ 4,8 milhões e R$ 300 milhões), 14%. Há ainda 10% na categoria “outros”.

“Mesmo com a revolução que vimos nos últimos anos no segmento de serviços financeiros digitais, as fintechs, hoje, representam menos de 5% do setor de crédito sem garantia no Brasil. O mercado e as empresas amadureceram, mas ainda há muito espaço para crescer. A retração que vimos durante a pandemia, por exemplo, criou uma oportunidade para as fintechs, pois clientes com bom perfil puderam conhecer e experimentar alternativas aos bancos”, afirma Sandro Reiss, presidente da ABCD.

Para ele, as fintechs são agentes de transformação do mercado, especialmente em segmentos onde existem clientes mal atendidos. Ele explica que em nichos específicos é mais fácil equacionar a qualidade dos ativos com o custo dos passivos. “É mais fácil encontrar bons ativos no nicho do que no mainstream, onde precisa ter mais volume, experiência e tempo para construir um bom portfólio. Dito isso, hoje já temos algumas fintechs batendo de frente com grandes bancos.”

Questionadas sobre a inadimplência na PF, 57% das fintechs dizem que o índice de calotes na sua carteira é de zero a 10%. Outras 21% dizem que a inadimplência está entre 10% e 25%, e mais 21% dizem que o indicador está acima de 25%. Em PJ, 67% das fintechs dizem que a inadimplência está entre zero e 10%, e 33% que está entre 10% e 25%. Para Reiss, apesar de o crédito sem garantia ser mais arriscado, isso não significa que as fintechs vão necessariamente sofrer mais que os bancos no atual ciclo de aumento da inadimplência. “Como elas têm uma fração pequena do mercado, podem se adaptar melhor a mudanças de cenário. Quem tem um ‘market share’ muito grande, não consegue mudar o perfil dos clientes com tanta velocidade. O crédito sem garantia é mais desafiador, mas tem spreads mais altos, o que torna essas fintechs capazes de absorver os impactos”.

Atualmente, 38% das fintechs de crédito têm autorização do Banco Central para operar, mais que o triplo do percentual de 11% registrado em 2019. A enorme maioria tem licença de sociedade de crédito direto (SCD). Além disso, outras 11% estão aguardando a liberação de uma autorização já solicitada e 20% dizem que devem pedir a licença no prazo de até um ano.

A rapidez na resposta ao cliente, em um processo fácil e sem burocracia, segue como um dos grandes diferenciais das fintechs. Para 94% destas empresas, conseguir realizar a análise de crédito e a liberação do empréstimo em menos de 24 horas é o principal gargalo que a startup pretende solucionar. Inclusive, 86% destas empresas já estão se beneficiando do acesso ao cadastro positivo em suas análises de crédito para agilizar processos.

“Antes, o desafio era ter acesso ao dado do cliente para oferecer opções de crédito mais vantajosas e com mais agilidade. Agora que as empresas vão ter esse acesso, o desafio será criar algoritmos de qualidade, que consigam extrair inteligência dos dados”, diz Luís Ruivo, sócio da PwC Brasil.

A principal fonte de captação das fintechs em 2021 veio por meio de aporte de acionistas (46%), seguido por Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC, com 42%) e capital próprio (29%). Essas empresas também estão ficando mais maduras.

Dois anos atrás, 51% estavam em fase inicial ou de ganho de escala. Agora, apenas 25% estão nesses estágios, com 34% em expansão e 40% em consolidação. “A taxa de mortalidade entre essas empresas é baixíssima”, diz Ruivo. Como para receber o crédito o cliente precisa ter uma conta, essas fintechs não atuam exatamente com desbancarizados, mas ajudam a combater a sub-bancarização. Em 83% das empresas, mais da metade dos clientes tem acesso ao sistema bancário tradicional.

Para Reiss, o ambiente de juro e inadimplência altos torna mais difícil surgirem novas fintech, mas também impulsiona o amadurecimento de quem já tem mais um pouco de história. “Existem empresas que encontraram um bom nicho, mas que não conseguiam ter escala suficiente e um custo de capital adequado”, explica. Enquanto isso, as fintechs estão de olho no open banking. Para 17% delas, a participação é obrigatória, com outras 60% entrando voluntariamente e somente 23% dizendo que não pretendem participar.