Manifestações com leitura de carta pela democracia marcam o 11 de agosto

Bolsonaro ironiza leitura de cartas: "redução do diesel foi ato ‘importante’ do dia"

A carta em defesa da democracia organizada por juristas foi lida no começo da tarde de hoje (11 de agosto) em evento organizado pela Faculdade de Direito da USP, conhecida como São Francisco, na região central de São Paulo. O manifesto tem como base os 45 anos da Carta aos Brasileiros, de iniciativa do professor Goffredo da Silva Teles Junior, feito em protesto contra a ditadura militar.

O texto da carta pela democracia de 2022 diz que o país passa por “um momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições”. E conclui com uma convocação: “Clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições. No Brasil atual não há espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao ao resultado das eleições”.

Após a leitura do documento, que reúne mais de 950 mil assinaturas, a plateia que acompanhava o ato dentro do prédio reagiu com gritos de “Fora, Bolsonaro”.

Mais cedo, no mesmo prédio da faculdade, foi lido o documento feito pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) também em defesa pela democracia.

Bolsonaro: “redução do diesel foi ato ‘importante’ do dia”

O presidente Jair Bolsonaro usou a redução do preço do diesel, anunciada nesta quinta-feira pela Petrobras, para ironizar atos pela democracia realizados na Faculdade de Direito da USP, em São Paulo.

“Hoje, aconteceu um ato muito importante em prol do Brasil e de grande relevância para o povo brasileiro: a Petrobras reduziu, mais uma vez, o preço do diesel”, , em suas redes sociais.

Pela segunda vez este mês, a Petrobras anunciou hoje a redução no preço do diesel nas refinarias, de 4,07%. O preço médio do diesel passará de R$ 5,41 para R$ 5,19. Na semana passada, a estatal já havia reduzido o preço deste produto em R$ 0,20, em média.

Líder bolsonarista no Senado: “Carta à democracia é a Constituição”

Em uma resposta combinada à “Carta em defesa do Estado Democrático de Direito”, integrantes do governo do presidente Bolsonaro passaram a se manifestar com o argumento de que a única carta que seria uma garantidora da democracia é a Constituição Federal.

Depois do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, foi a vez do líder do governo no Senado, Carlos Portinho (PL-RJ), se manifestar a respeito por meio de suas redes sociais, praticamente nos mesmos termos.

“Carta à Democracia é a nossa Constituição Federal. Carta Magna. Lei maior. A ‘Constituição Democrática’. A Constituição Cidadã. Meu norte como advogado. E, como senador, jurei cumpri-la! A essa se submetem todos os brasileiros. Todos os poderes da República. Não há outra”, afirmou o senador.

Confira a carta em defesa da democracia de 2022:

“Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito!

Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos cursos jurídicos no país, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.

A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.

Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.

Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para país sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.

A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição “Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.

Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em país de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.

Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.

Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.

Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito, aqui também não terão.

Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar ao lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.

Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.

No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.

Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:

Estado Democrático de Direito Sempre!!!!”